Religioso era diretor espiritual de uma associação umbandista (Ricardo Lima)
O caso do líder espiritual Domingos Forchezatto, suspeito de assédio e violência sexual praticados contra mulheres em um inquérito que está sob investigação da Polícia Civil, envolve também situações de extorsão, falsidade ideológica e exercício ilegal da profissão, segundo revelam depoimentos de vítimas.
O religioso, que é diretor espiritual da Associação Espiritual de Umbanda Pai Tajubim (AEUPT), está afastado das funções há cerca de 15 dias, quando vieram à tona as denúncias sobre os supostos crimes realizadas por quatro mulheres que frequentavam a instituição e relataram situações de forte constrangimento, assédio sexual, com relação e pressão psicológica.
De acordo o marido de uma delas, além dos crimes de assédio e violência sexual, o acusado praticava extorsão e mantinha o exercício da profissão de forma fraudulenta. Segundo a vítima, Domingos apresentava um diploma de psicoterapeuta falso, quando, na realidade, era formado em Fisioterapia. “As pessoas que ele atendia se tornavam escravizadas na mão dele. Já conseguimos informações de que ele nunca foi psicoterapeuta e o diploma apresentado por ele foi comprado. Na verdade, a sua formação é de fisioterapeuta”, disse o homem, que preferiu ter o nome mantido em sigilo.
Segundo ele, que frequentava a instituição a mais de 20 anos e era muito próximo de Domingos, chamava a atenção os recursos financeiros recebidos, muitas vezes oriundos de supostas curas recebidas e que jamais entravam para o caixa da instituição. “Eu e todos ali tínhamos o Domingos como um pai. Mas tinha muita coisa que chamava atenção, mas as pessoas, por medo, não comentavam. A pressão psicológica era muito grande. O dinheiro que entrava na instituição por meio dos ‘trabalhos’ não caía na receita, entre outras coisas terríveis, como a que aconteceu com a minha esposa, o que acabou com a nossa família”, lamentou.
O marido dessa vítima foi o responsável pelas denúncias. Ele disse que desconfiou nos últimos meses por causa da saída da instituição de muitas pessoas que eram próximas a Domingos e ligadas a muito tempo à casa de orações. Ao conversar sobre o assunto com a esposa, acabou ouvindo dela o desabafo surpreendente. “Ela me contou tudo, o assédio, a violência e pressão psicológica que ela sentia. Estamos arrasados. Minha mulher está sob forte efeito de medicamentos. Ela tentou suicídio duas vezes nas últimas semanas. Deixamos até a cidade. Só queremos justiça”, disse.
Conforme informações das comunidades religiosas de matrizes africanas da cidade, as vítimas do assédio relataram que os episódios envolvendo Domingos incluíam situações em que o líder religioso exigia que as mulheres tirassem as roupas para dar sequência aos “atos religiosos” e até casos de relações sexuais, com a justificativa de um “transmissão de energia”.
A investigação sobre as denúncias correm sob sigilo e estão a cargo da 1ª Delegacia de Defesa da Mulher de Campinas. O Ministério Público também acompanha o caso. Entretanto, o líder religioso ainda segue foragido. Segundo pessoas ligadas à instituição, informações dão conta de que ele deixou o país.
O marido de uma das vítimas conta ainda que, como esposo, não pôde fazer as denúncias, que acabaram sendo conduzidas por duas advogadas que representam um coletivo de mulheres na realização do boletim de ocorrência que se transformou em inquérito policial. A reportagem procurou as advogadas, mas não obteve retorno.
Justiça
O caso deixou transtornada a tradicional comunidade de religiosos de matrizes africanas da cidade. A própria Associação Espiritual de Umbanda Pai Tajubim (AEUPT), da qual fazia parte o autor dos supostos crimes, emitiu em nota o desejo de que a Justiça seja feita.
O texto diz ainda que o líder espiritual permanecerá afastado até a devida apuração dos fatos pelas autoridades competentes e que os trabalhos já estão sendo conduzidos por outra religiosa da entidade, Maria Elidia dos Santos, a Mãe Pequena. Semanalmente, cerca de 500 pessoas são atendidas espiritualmente no terreiro, que possui perto de 300 médiuns e recebe as pessoas em uma sede na Vila Nogueira, na região do bairro Taquaral.
Também em nota divulgada nas redes sociais, a Associação dos Religiosos de Matriz Africana de Campinas e Região (Armac) informa que o Conselho de Religiosos da instituição manifesta indignação e repudia a cultura do machismo presente na sociedade brasileira, bem como qualquer atitude da prática de crime de assédio sexual e moral, racismo, homofobia, intolerância/racismo religioso.
Na nota, a entidade ressalta que “a instituição deve enfrentar a apuração dos fatos com transparência de ações, sem se descuidar das garantias do devido processo legal e de legalidade, preservando as garantias constitucionais e que, para tanto, deve possibilitar imediato acolhimento, preservação e apoio para as vítimas, principalmente dos seus direitos e garantias individuais.”