Agora vamos trocar duas palavras sobre os pronomes "contigo" e "consigo"
Na semana passada, trocamos dois dedos de prosa sobre o emprego dos pronomes possessivos “teu” e “seu”. Vimos que, no padrão formal da língua e nos textos literários clássicos (e também em vários textos literários modernos), o possessivo “teu” se usa com “tu”, enquanto “seu” se usa com “você”, “senhor” ou “senhora”. Assim, são do padrão formal da língua frases como “Tu viajarás com os teus primos?” ou “A senhora levará os seus filhos?”, ou ainda “Você fez a sua parte?”. É bom que se diga que em algumas regiões do Brasil se nota o emprego de “tu” e “teu” à moda lusitana, o que ocorre, por exemplo, em Belém, a bela capital do Pará. Lá é muito comum ouvir algo como “Tu queres água?”, “Fizeste o que te pedi?” ou “Tu podes levar os teus livros agora”. Na última coluna, vimos ainda que é comum, na língua do dia a dia de muitas regiões do Brasil e também em textos literários modernos, o emprego de “você” com “teu”, “tua” etc., em frases como “Por que você age assim com os teus amigos?”. No padrão formal da língua ou nos textos clássicos, teríamos algo como “Por que você/o senhor/a senhora age assim com os seus amigos?” ou “Por que (tu) ages assim com os teus amigos?”. Agora vamos trocar duas palavras sobre os pronomes “contigo” e “consigo”. Comecemos por “contigo”, que, no padrão formal da língua, vem associado ao pronome “tu”, em frases como “Tu me levas contigo ao teatro?” ou “Vou contigo ao cinema, se (tu) aceitares a minha companhia”. Embora absolutamente comuns no dia a dia, frases como “Você me leva contigo?” não têm registro no padrão formal da língua e ainda são recusadas pelas bancas que organizam provas de concursos públicos dos mais diversos matizes, a começar pelos vestibulares de importantes escolas superiores estaduais e federais. E “consigo”? Como se usa esse pronome pessoal? Ai, ai, ai... Aqui a coisa fica meio complicada. Em Portugal, esse pronome é muito usado para substituir “com você”, “com o senhor” ou “com a senhora”, em frases como “Quero viajar consigo” ou “Falo consigo amanhã”. Isso ocorre tanto na língua oral quanto nos textos literários, clássicos e modernos. No Brasil, isso é considerado errado, a começar por algumas bancas que... Não preciso repetir. Muitas dessas bancas são as mesmas que abordam em suas provas textos de autores portugueses, que empregam o pronome “consigo” à sua maneira. Os nossos dicionários (mesmo em suas edições mais recentes) dizem que, no português formal do Brasil, esse pronome só é usado como reflexivo, já que costuma fazer referência ao sujeito da oração: “Você pode levar os discos consigo”; “Ela levou os filhos consigo”. Em “Você pode limitar os discos consigo”, o sujeito é “você”, e a frase significa “Você pode levar os discos com você”; em “Ela levou os filhos consigo”, o sujeito é “ela”, e a frase significa “Ela levou os filhos com ela mesma”. O ideal seria fazer questões em que se abordasse a diferença no emprego desse pronome no Brasil e em Portugal. Isso me parece melhor do que limitar a coisa ao “certo” e “errado”. Vamos repetir, então: no padrão formal do português do Brasil, o pronome “consigo” costuma fazer referência ao sujeito da oração, por isso não ocorre em frases como “Eu quero ir consigo”, em que o pronome “consigo” não se refere ao sujeito (“eu”). No português formal do Brasil, essa frase se transforma em “Eu quero ir com você” (ou “com o senhor”, “com a senhora”).