Há muito tempo que o debate do futebol deixou de ser restrito a esquemas táticos, escalação e desempenho dos atletas. O esporte ganhou dimensões de espetáculo e ultrapassou as barreiras territoriais com o inevitável processo de globalização, a força da audiência na TV e outras mídias e, principalmente, com a profissionalização do marketing nos clubes, iniciativa que transformou a paixão clubística em rendimentos milionários. Grandes talentos voltaram a atuar em gramados brasileiros, fortalecendo os campeonatos e mexendo com a gestão de um esporte popular.
Apesar do inegável avanço obtido com o Estatuto do Torcedor, um conjunto de regras cujo objetivo era “catequizar” um reduto marcado muitas vezes pelo amadorismo e pensamento arcaico, o futebol segue produzindo tragédias aqui e acolá, contrariando a lógica saudável das competições esportivas.
O episódio da morte do jovem Kevin Espada, na última quarta-feira, na Bolívia, no jogo entre San José e Corinthians, é um destes incidentes emblemáticos, que deveriam ter a força de uma mudança de paradigma, tal qual a solução inglesa para os selvagens hooligans. Aliás, que diferença há entre eles e “nossos” bandidos que frequentam os estádios?
A questão que se coloca é: qual punição mais adequada? Além dos agentes (ou agente) causadores da morte, quem mais terá de ser punido? Especialistas divergem e lembram que, fosse no Brasil, com base no Estatuto do Torcedor, as autoridades que falharam na vistoria e o clube mandante do jogo também deveriam ser punidos, pelo princípio da responsabilidade objetiva e solidária.
O que se espera, agora, é que haja uma punição exemplar, ou seja, o assassino e seus cúmplices deverão responder criminalmente pelo homicídio. Além disso, qualquer tentativa de eufemizar a tragédia (hipótese aventada após um adolescente de Guarulhos ter avocado o ato de lançar o sinalizador) deve ser rejeitada.
Ao clube, uma punição é bem-vinda, ainda que muita gente considere injusta “punir” uma multidão em detrimento de um grupo. A verdade é que nenhuma transformação se faz no bojo da impunidade. Nenhuma mudança de atitude ocorre sem que o agressor, seus comparsas e potenciais bandidos sintam na pele o efeito pedagógico de uma restrição.
Jogar de portões fechados e proibir a entrada das torcidas organizadas são o mínimo que se espera no futuro próximo do Corinthians na Libertadores. Não cabe tergiversação de nenhum tipo para o sagrado valor de uma vida.