Baú de Histórias

Uma professora muito especial

Vilma Gasques - Especial para Metrópole (interina)
20/07/2015 às 17:45.
Atualizado em 28/04/2022 às 17:07
Judith Silveira Bello Stucchi  ( Carlos Sousa Ramos / AAN)

Judith Silveira Bello Stucchi ( Carlos Sousa Ramos / AAN)

Foto: Carlos Sousa Ramos / AAN Judith Silveira Bello Stucchi entre as ex-alunas Cleide Aparecida Albrecht Ribeiro e Maria Eugênia Castanho O escritor John Steinbeck escreveu que professores verdadeiros, com a melhor das sortes, encontram-se no máximo uns três durante a vida. Por muitos anos, cerca de 2,5 mil estudantes do Instituto de Educação Carlos Gomes de Campinas, a Escola Normal, tiveram a sorte de conviver e receber os ensinamentos preciosos de Judith Silveira Bello Stucchi. Durante mais de 25 anos, até 1973, a campineira lecionou metodologia e prática de ensino na instituição que formava professores. Ainda hoje, aos 91 anos, completados em abril, recebe homenagens de ex-alunos agradecidos por tê-la como mestre, pois, muito além das matérias, permitia que cada um escolhesse o caminho que acreditava ser o melhor na carreira. Foto: Reprodução Instituto de Educação Carlos Gomes... Dona Judith lembra com clareza das aulas, dos ensinamentos que transmitia, dos estudantes. Conta que, depois de se formar em pedagogia, começou exercendo a profissão em Capivari, no curso normal. Diz que não sabia dar aulas e por isso comprou livros para aprender, já que na época não teve a oportunidade de cursar o que atualmente se chama de educação continuada. “Eu tinha a informação geral que a faculdade dá, mas era aula que eu tinha de dar para o curso normal, para formação de professores. Como eu ia ensinar psicologia infantil?”, questiona. Foto: Reprodução ...e equipe de funcionários na década de 1950 A professora nunca trabalhou com crianças. Atuou algumas vezes como substituta e estudou para ser docente de metodologia. Foi em Capivari, onde morou por cinco anos, que conheceu o marido, Mário Stucchi. Quando retornou a Campinas, iniciou sua trajetória na Escola Normal como professora de psicologia e, mais tarde, de metodologia do ensino primário. “Eu acompanhava as normalistas nos estágios. Antes de elas começarem o trabalho, eu visitava os professores das salas para onde iriam e pedia o conteúdo das próximas aulas. Assim, as normalistas já iam preparadas para auxiliá-los e levavam materiais de apoio muito bons”, lembra. Como morava na Rua Luzitana, perto de onde trabalhava, ia para o Instituto Carlos Gomes a pé. Dava aulas no período da tarde e dedicava as manhãs e as noites para estar com o marido e os quatro filhos (Regina, Renato, Raquel e Rosana), preparar aulas e corrigir trabalhos e provas. “Sempre trouxe muito serviço para casa. Muitas vezes, passava o final de semana trabalhando. Na escola, ia de segunda a sábado. E somente pouco antes de me aposentar foi que deixei de dar aulas aos sábados. Mas também passei a dar aulas à noite”. Judith afirma que era incapaz de dar uma aula sem ter um rigoroso planejamento, que lhe desse firmeza e segurança sobre o que seria desenvolvido. “Talvez sentisse um pouco de vergonha se não soubesse aquilo que ia ensinar. Ficar na sala de aula conversando com o aluno por não ter preparado a aula, jamais. Não sei se é questão de responsabilidade ou de orgulho”. Por amor à profissão, ela procurou um caminho metodológico para cada disciplina e foi construindo a própria metodologia de ensino. Havia métodos para ciências, estudos sociais, história, geografia e matemática. “Só no terceiro ano do normal é que eu ensinava a metodologia da alfabetização”, cita.Apesar de sentir que professores e alunos de hoje sofrem os efeitos da futilidade no processo educativo e estão perplexos, sem saber o que fazer, Judith diz que é preciso acreditar na educação, porque nada se consegue sem ela. “Vejo alunos fazendo de conta que estudam, professores fazendo de conta que ensinam e cada qual perdido, sem se sentir motivado”, lamenta.Carinho de ex-alunos A lembrança à citação de John Steinbeck sobre a sorte de se encontrar bons professores, destacada no início deste texto, foi da mestre e doutora em educação pela Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) Maria Eugênia Castanho. “Foi a melhor professora que conheci. Ela sabia, mais do que ninguém, tratar os alunos com respeito, ser competente, fazer os estudantes se sentirem valorizados. Transmitia uma segurança impressionante no exercício profissional”, comenta. Ela e a professora de educação física Cleide Aparecida Albrecht Ribeiro foram alunas de Judith na turma de 1963. Mantêm contato com ela ainda hoje e a visitam sempre que podem. Para Maria Eugênia, um grande professor é como um grande artista, e o meio em que se exerce o ensino é a mente e o espírito do ser humano. “Professores marcantes amam o que fazem, catalisam um desejo ardente de conhecer, fazendo com que os horizontes se abram, o medo vá embora e o desconhecido se torne conhecível”, observa. “Com 15 anos de idade, tive o privilégio de ser aluna de uma professora excepcional, que se preocupava em formar e em informar a cada passo de seu trabalho”, diz. Cleide recorda que Judith levava as normalistas para dar aulas no curso primário, no andar superior da mesma instituição, e acompanhava todos os momentos. “O curso primário servia, justamente, para estágios. Mas era difícil, porque as professoras das turmas não gostavam muito de ter as aulas tumultuadas por estagiários. A exceção era com as alunas da professora Judith. Todas as professoras do primário gostavam de ter essas estagiárias em suas salas”, garante.  

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