BALANÇO

Trabalho infantil: Piracicaba enfrenta uma triste realidade

Dados do IBGE mostram que em Piracicaba, 1.245 crianças entre 10 e 15 anos trabalham

Juliana Franco
16/06/2013 às 05:00.
Atualizado em 25/04/2022 às 12:19

Há quase dois anos em uma cama, Ramon Gonçalves Ambrosio, 19 anos, sofreu um acidente enquanto trabalhava. O jovem teve a medula prensada e duas vértebras quebradas porque duas portas – de 40 quilos cada – caíram sobre ele. Ramon é apenas mais uma das vítimas de acidente de trabalho envolvendo menores de idade – 112 casos foram registrados em Piracicaba no ano passado, segundo informações do Cerest (Centro de Referência em Saúde do Trabalhador). Apesar de considerado ilegal, o trabalho infantil no Brasil ainda é um grande problema social.

Dados do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) mostram que 1.245 crianças e adolescentes entre 10 e 15 anos - 3,6% da população nesta faixa etária - trabalham na cidade. Muitas vezes, deixam de ir à escola e ter seus direitos preservados. Trabalham em regime de exploração, quase de escravidão, já que muitos deles não chegam a receber remuneração alguma, explica o coordenador do curso de pós-graduação em Direito do Trabalho e Processo do Trabalho da Unimep (Universidade Metodista de Piracicaba), João Carmelo Alonso.

Na semana em que foi comemorado o Dia Mundial de Erradicação do Trabalho Infantil, em 12 de maio, os números ainda assustam. Dos 154.634 meninos entre 10 e 17 anos de Piracicaba, 103.247 trabalham. Entre 10 e 13 anos, são 154 crianças, na faixa etária de 14 a 15 anos são 526. Já entre as 163.587 meninas, 76.648 atuam de forma irregular. Entre os 10 e 13 anos, são 228 e, entre 14 e 15 anos, são 337.

No Brasil, de 2003 a 2010, cinco mil crianças e jovens morreram por acidente de trabalho e 14 mil ficaram mutiladas. Dados do IBGE, apontam que 86.353.839 crianças e adolescentes, entre 10 e 17 anos, trabalham no País - a população nesta faixa etária é de 161.981.299 pessoas. No Estado são 20.001.270 crianças e adolescentes que atuam de forma irregular.

O trabalho infantil é considerado ilegal na faixa etária entre 5 e 13 anos no Brasil. Para adolescentes entre 14 e 16 anos, o trabalho é legal desde que na condição de aprendiz. “O problema existe não por ausência dos dispositivos legais, mas sim por descumprimento e falta de capacidade de fiscalização do poder público”, explica o docente Alonso.

Ainda de acordo com o professor, é preciso mudar a consciência social. A situação obedece a necessidade econômica das famílias. “Na área rural, onde a fiscalização é menor, a situação é ainda pior”.

O artigo 7, capítulo 33, da Constituição Federal de 1988, estabelece a “proibição do trabalho noturno, perigoso ou insalubre a menores de 18 e de qualquer trabalho a menores de 16 anos, salvo a condição de aprendiz, a partir de 14 anos”. (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 20, de 1998).

O técnico de segurança do trabalho do Cerest, Marcos Hister, revela que em Piracicaba é comum encontrar crianças trabalhando de forma irregular na Rua do Porto, no Terminal Central de Integração, em padarias e olarias. “Elas vendem trufas, trabalham em péssimas condições. Inclusive, já encontramos crianças vendendo bebidas alcoólicas em ambientes de prostituição”, revela. “Só é considerado trabalho infantil quando há relação de trabalho com algum espaço. Crianças que vendem balas em semáforos a pedido dos pais, por exemplo, são encaixados em situação de mendicância”, acrescenta Hister.

Na tentativa de coibir o trabalho infantil e também dar uma diretriz aos profissionais que abordam crianças e adolescentes que atuam de forma irregular, para que saibam para onde encaminhá-los, foi criado na cidade o CMDCA (Conselho Municipal dos Direitos da Criança e do Adolescente). “Os fiscais encontram o menor no trabalho e não sabe o que fazer. Por isso, por meio de uma ação entre instituições de saúde, educação e Conselho Tutelar, vamos tentar erradicar o trabalho infantil e criar um projeto de lei municipal. Além disso, queremos criar um fluxo neste trabalho. É preciso saber o que fazer com as crianças”, revela o técnico.

PUNIÇÃO

O advogado João Carmelo Alonso conta que cabe ao Ministério do Trabalho e a Delegacia Regional do Trabalho a fiscalização e a intervenção nas empresas que utilizam o trabalho do menor. “É difícil punir os pais, justamente pelas condições sociais em que se encontram estas famílias. Quando há fiscalização, geralmente encontramos crianças e adolescentes em ambientes penosos, salubres, tenebrosos. Atuam de forma irresponsável por parte do empregador”, afirma Alonso, que complementa: “a sociedade e o poder público precisam atuar de forma mais rígida. É necessário fiscalizar e punir. Só assim não corrermos o risco de nos depararmos com estas situações”.

MENOR APRENDIZ

Alonso explica que as empresas que contratam menor aprendiz são beneficiados pela lei. “Além de suprir a mão de obra da empresa, o Governo incentiva. Inclusive tive uma experiência positiva em sala de aula, com um aluno que foi menor aprendiz”, revela.

O estudante que hoje está na graduação foi contratado pela empresa – uma multinacional de Piracicaba - após exercer bom trabalho com menor aprendiz.

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