TORQUATO

Tia Zulmira está de volta

29/03/2013 às 05:00.
Atualizado em 25/04/2022 às 22:43
Gaudêncio Torquato (Colunista)

Gaudêncio Torquato (Colunista)

O que diria Tia Zulmira, a engraçada personagem criada por Stanislaw Ponte Preta, ao enxergar, numa dissertação sobre movimentos imigratórios para o Brasil no século XXI, uma receita de Miojo e um trecho do hino do Palmeiras? Acharia razoável as notas 560 e 500 obtidas? E que nota daria ao Instituto Nacional de Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira, que orienta os corretores da prova a “aproveitarem o que for possível? A velha senhora da família Ponte Preta enquadraria seguramente os personagens em questão no Festival de Besteiras que Assolam o País, sempre muito farto por ocasião do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem).Em todos os anos, o Enem produz extensa crônica de besteiras previsíveis. O Brasil continua a ocupar um vergonhoso 88 lugar entre 127 países no ranking de educação da Unesco. Seis anos atrás, tinha melhor posição (72º). Há 6 milhões de alunos no ensino superior, mas 38% não dominam habilidades básicas de leitura e escrita.A considerar o denso programa de avaliações em todos os níveis de ensino e as campanhas que fazem loas à nossa educação, deveríamos ser um território livre de todas as categorias do analfabetismo. Se o número de analfabetos diminuiu nos últimos três anos, o percentual de analfabetos funcionais tem permanecido o mesmo.Os dados continuam desanimadores. Cerca de 75% das pessoas entre 15 e 64 anos não conseguem ler, escrever e calcular plenamente; dessas, 68% são analfabetas funcionais e 7%, consideradas analfabetas absolutas.O que mais impacta, porém, é o contraste entre o avanço de uns setores e o atraso de outros. Veja-se a situação de renda das margens, que tem aumentado a ponto de se trombetear, a todo o tempo, a inserção de 30 milhões de brasileiros na classe C e a “salvação” de outros tantos que saíram da miséria absoluta. Se a desigualdade diminuiu, não seria lógico imaginar, em sua cola, a melhoria de padrões educacionais?Há muitos pontos obscuros no discurso que trata da educação. Não é um paradoxo constatar que quase 50% dos brasileiros são usuários da internet e quase 70% possuem celular, mas o Brasil, com 401 pontos, está numa das últimas posições do Programa Internacional de Avaliação de Alunos (Pisa)?O que trava o sistema? Na educação básica, há a Prova Brasil e o Enem. No Ensino Superior, o Enade, aliado ao Censo Escolar, a par de avaliações feitas por comissões de avaliadores. Na pós-graduação, nada funciona sem o endosso da Capes. Faltam mais recursos? Os programas de formação de professores são precários e insuficientes?As respostas não são fáceis. Enquanto os ciclos governamentais cultuam a si mesmos, o fato é que o edifício educacional apresenta rachaduras em todos os andares. Da competição desvairada por vagas em escolas de baixa qualidade, não é de surpreender o besteirol que sai desses polêmicos exames de avaliação.Tia Zulmira garante que a receita de Miojo no mais recente Enem trouxe, sim, elevada contribuição ao verbo destes tempos tresloucados.

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