A pianista campineira Sônia Rubinsky despertou para o teclado muito cedo e hoje mora na capital francesa, de onde percorre os quatro cantos do mundo
Escondida, a caçula de quatro irmãos vai até o piano para tentar tirar sons. Antes mesmo de aprender a ler ou escrever, o fascínio pelo instrumento já toma conta de seu coração. A mente pura, ainda em formação, acredita que aquilo é proibido e, talvez por isso, faz sem que ninguém saiba. O desejo, entretanto, cresce a cada dia que passa, tornando insustentável manter o segredo. Não há outra saída: é preciso contar para a família e pedir por aulas. Tanto tempo depois, o passado incerto se torna um presente maravilhoso e traz Sônia Rubinsky, uma das mais renomadas pianistas internacionais. Agora não é mais preciso tocar secretamente, seu talento é conhecido e aplaudido nos quatro cantos do planeta. “Comecei com 5 anos, minhas irmãs tocavam e estudavam com afinco no Conservatório Musical Campinas. Passei a implorar para aprender e logo fui levada à dona Glafira Rosas de Farias, que me alfabetizou na música. Depois fui estudar com a dona Olga Rizzardo Normanha. Me lembro do meu primeiro recital, minha avó fez um lindo vestido, e eu adorava meu programa. Principalmente a Guerra das Borboletas. Ainda tenho o programa impresso”, conta Sônia, hoje aos 61 anos.Natural de Campinas, a musicista rodou e conquistou o mundo com sua capacidade. Mais do que apresentações em diversos lugares, como Roma, Paris, Amsterdam e Estados Unidos, recebeu honrarias de grande valor, como o Prêmio Carlos Gomes de pianista do ano, em 2006, e de instrumentista do ano em 2009, além de melhor gravação do ano no Latin Grammy Awards 2009. Este, aliás, é tratado como o mais especial de todos. “O Latin Grammy é a versão internacional, ao contrário do Grammy, que é só dos Estados Unidos. Este prêmio chegou de uma maneira completamente surpreendente: de repente fiquei sabendo pela Naxos, companhia que lançou meus oito CD’s Villa-Lobos, que eu fora indicada”, destacou Sônia, antes de lamentar. “Infelizmente não pude ir à cerimônia porque tinha uma data para tocar muito próxima à data de entrega do prêmio.”Percalços do caminho Apesar de toda a fama e consagração, a campineira precisou batalhar - e muito - para chegar onde está. Por não ter nascido numa família de músicos, teve que trilhar seu próprio caminho e compreender profundamente o que era ser uma artista musical. Os preconceitos também sempre se fizeram presentes. “Viajei muito, mudei várias vezes de país para estudar. Sofri julgamentos de todo tipo, como por exemplo: ‘não ter força suficiente como homem para tocar’, ‘mulher acaba se casando e tendo filhos, sendo impossível ter carreira’. Mesmo nos meus relacionamentos a carreira sempre foi causa de atrito. Não tenho filhos e moro sozinha, meu interesse pelo piano e pela música continua intacto e profundo. Fundamental para mim é me desenvolver, compreender, me aprofundar e poder passar meus conhecimentos adiante”, diz a pianista, que ainda tem sonhos a serem realizados. “Existem obras que gostaria de tocar, auditórios e lugares que gostaria de ser convidada para me apresentar, músicos a conhecer e compartilhar o ‘fazer música’ juntos, e gravações que gostaria de realizar. Não me sinto consagrada, mas sinto um sentimento de enorme responsabilidade quando toco em público ou quando dou aulas.”Relação com Campinas Sônia Rubinsky estará no próximo final de semana (dias 25 e 26) em Campinas, se apresentando no Teatro Castro Mendes. Por lá acompanhará a Orquestra Sinfônica de Campinas, sob a regência do norte-americano Lee Mills. Para ela, tocar na cidade sempre tem um sabor diferente e a expectativa é grande. “O Programa é muito especial, pois tocarei o Concerto Fribourgeois de Almeida Prado. Esta obra é muito pouco tocada. Almeida Prado era um gênio, e eu tive a honra de conhecê-lo durante toda a minha vida praticamente. Éramos muito amigos”, comenta.Fã de MPB e Elis Regina, Sônia vive em Paris, mas guarda com carinho as lembranças de Campinas, como quando era criança e passeava no Bosque, as idas ao City Bar e também na feirinha de fim de semana. Já sobre o Brasil em geral, o sentimento de saudade não é diferente. “Sinto muita falta. Felizmente mantive o conhecimento da língua portuguesa, pois continuei lendo muito em português. Falo vários idiomas, mas a Sônia que fala português é diferente... Cada língua que falo favorece uma parte diferente de mim. O português me inspira a ser mais afetiva, paciente e amorosa.”