Projetos colaborativos são oportunidade para tirar ideias do papel
Projetos Colaborativos (Istock)
Muitas vezes, a transformação de um projeto em realidade depende mais de fatores externos do que, de fato, do esforço pessoal de seus idealizadores. Exemplo disso é a constatação de que, até pouco tempo, várias dessas iniciativas eram inviabilizadas por falta de recursos ou de apoio governamental. Hoje, porém, a conscientização e a abertura de plataformas de divulgação e compartilhamento de ideias abriram espaço para o surgimento de uma tendência que promete mudar o cenário social em diferentes aspectos. Trata-se da prática da colaboração de maneira planejada, organizada e transparente. Foto: Istock E não importa se é a criação de um site de serviços com participação ativa de cidadãos comuns ou um financiamento colaborativo para publicação de livros e lançamento de álbuns. Mais do que resgatar a importância do coletivo, esses projetos vêm agindo em favor da cidadania, promovendo engajamento e proporcionando oportunidades a quem antes tinha apenas um sonho. Como o fotógrafo e jornalista Roniel Felipe, que já tinha um livro publicado, mas decidiu apostar nessa modalidade de financiamento para um novo projeto, o Contos Primários de um Mundo Ordinário, lançado em fevereiro e financiado coletivamente por meio do site Catarse. Foto: Giancarlo Giannelli/Especial para AAN Roniel Felipe e o seu Contos Primários de um Mundo Ordinário: livro financiado coletivamente por meio do site Catarse “Tinha uma base bacana de contatos, até por conta do meu primeiro trabalho. Aí entrei no site e fiz todo o planejamento para atrair o apoio das pessoas. Produzi um vídeo explicando um pouco sobre o livro e contei com o suporte de colegas que ajudaram no processo. Quando você faz algo independente, tem que estar preparado para ser o gestor de tudo ali”, explica. Por meio de divulgação nas redes sociais, especialmente no Facebook, Felipe foi reunindo financiadores e os R$ 10 mil estimados para a viabilização da obra foram alcançados em apenas duas semanas. “Na primeira semana, criava peças publicitárias para divulgar o livro e postava nas redes. Boas ideias são essenciais, mas foco e planejamento ajudam muito”, orienta.ViabilizaçãoA iniciativa de Felipe em muito se assemelha à do jornalista e educador físico Rafael De Marco, autor da biografia de Joaquim Cruz, um dos maiores atletas nacionais. “A idealização do livro surgiu do empresário Sergio Coutinho Nogueira, que foi presidente da Federação Paulista de Atletismo. Fui convidado e abracei o projeto”, conta. Segundo De Marco, o financiamento coletivo (crowdfunding) foi a melhor alternativa para seu projeto porque permitia envolver as pessoas em torno da ideia ao mesmo tempo em que se viabilizava o trabalho. “Meu conhecimento sobre o colaborativo se baseava em informações vindas do noticiário, mas ficou claro que esse é um procedimento que, infelizmente, ainda está engatinhando no Brasil”, comenta. De Marco utilizou a plataforma Catarse também para angariar recursos junto aos colaboradores. O processo de financiamento durou 60 dias, mas a meta não foi alcançada. “Conversando com o pessoal do site, que tem um bom suporte, aprendi sobre a necessidade de investir pesado em divulgação. Foquei em redes sociais e matérias na imprensa e tive ótimos resultados. Até tenho planos de novos livros e, certamente, voltarei ao crowdfunding”, revela ele, que contou com o apoio da Editora Multiesportes para finalizar a obra. De Marco aposta que, à medida em que as pessoas tomarem conhecimento da seriedade de um financiamento coletivo bem feito, o prazer em ajudar vai superar possíveis desconfianças. Foto: Giancarlo Giannelli/Especial para AAN Rafael de Marco recorreu ao crowdfunding para viabilizar a produção da biografia do atleta Joaquim Cruz Matador de Dragões – A História e a Filosofia de Vida do Campeão Olímpico Joaquim Cruz será lançado no dia 18 de março, na Livraria Cultura do Shopping Iguatemi Campinas. No dia seguinte, acontece o lançamento em São Paulo. Joaquim Cruz confirmou presença em ambos os eventos. O livro já está sendo vendido na internet. Arte ao alcance de todosA cultura do compartilhamento proporciona muito mais do que um empurrãozinho para viabilizar financeiramente um projeto. Ela abre espaço à participação e à inserção de diferentes olhares e contribuições, o que enriquece narrativas e conteúdos. É assim com o Arte Fora do Museu. A iniciativa, lançada em 2011 e selecionada pela Bolsa Funarte de Reflexão Crítica e Produção Cultural para Internet em 2010, foi pensada a partir do mapeamento das obras de arte que estão no espaço público da cidade de São Paulo. Em 2012, a marca alcançou um público de mais de dez milhões de pessoas, segundo o site. Na opinião de Felipe Lavignatti, idealizador do projeto com André Deak, a grande vantagem da proposta é tornar o conteúdo mais democrático. “Não somos nós quem selecionamos as artes, os grafites e afins que aparecem no site. São todos. Apuramos o que entra ou não, mas nada impede que vários cidadãos submetam suas contribuições”, explica. “Já perdemos a conta de quantas obras temos catalogadas no site porque, por ser colaborativo, é muita coisa. A pessoa pode colaborar tirando fotos, por exemplo, e usando as hashtags. E isso pode acontecer de qualquer lugar do mundo”, comenta. Foto: Giancarlo Giannelli/Especial para AAN Felipe Lavignatti e André Deak, do Arte Fora do Museu: conteúdo democrático Colaborar para evoluirAlém de beneficiar projetos relacionados à produção cultural e artística, os financiamentos coletivos também podem agir em favor de causas sociais. Essa é a proposta da Fundação Jari, que busca a adesão de colaboradores e financiadores pelo site Kickante. O foco da organização não-governamental é estimular ações de desenvolvimento sustentável das comunidades por meio da conservação do meio ambiente, promovendo uma educação empreendedora e fortalecendo as relações produtivas com projetos de geração de renda em suas unidades. Foto: Divulgação Francisco Viana da Silva, membro do Programa de Negócios Agroflorestais, atendido pela Fundação Jari: em favor das causas sociais Foi por conta das dificuldades em concorrer ao dinheiro público e privado que a ONG decidiu apostar no crowdfunding como ferramenta para divulgar sua causa. O primeiro projeto, iniciado em fevereiro e com duração de 60 dias no Kickante, busca ampliar o atendimento a famílias de agricultores do Vale do Jari. “Cada atendimento técnico a essas famílias custa R$ 150 por mês. Ainda oferecemos mudas variadas para que os moradores cultivem em sua terra. Cada muda custa, em média, R$ 2,50”, conta a mobilizadora de recursos da fundação, Silvana Santos.Ela avalia que a cultura colaborativa no País é nova e ainda tem muito para crescer e se consolidar. “Embora a internet tenha nascido há mais de 20 anos, só viemos pensar nisso há pouco mais de três. As redes sociais trouxeram a cultura do compartilhamento, essencial para o mundo colaborativo. O futuro por aqui deve ser brilhante nesse aspecto, porque somos um País conectado”, opina Silvana.Micro-revoluções diáriasPara Felipe Caruso, coordenador de comunicação do site Catarse, uma das principais plataformas de produção criativa e financiamento coletivo do País, o “coletivo, colaborativo e compartilhado” é o futuro. “Há um longo caminho de construção de uma cultura colaborativa pela frente. O que é certo é que é um caminho sem volta, de mais independência, contato, proximidade, honestidade, transparência e agilidade em diversas cadeias produtivas”, opina. De acordo com ele, o objetivo é transformar a plataforma em uma “praça de encontro” de pessoas que queiram tirar do papel projetos que reúnam interesses comuns. “É difícil vislumbrar um limite para uma ferramenta tão poderosa quanto o financiamento coletivo. É uma ponte de aproximação da sociedade civil com ela própria para a resolução de problemas”, define. Foto: Divulgação Equipe do Catarse: site é uma das principais plataformas de produção criativa e financiamento coletivo do País O que pode ser financiado?Para ser eletivo a financiamento, um projeto deve seguir algumas diretrizes, como informa Felipe Caruso, do Catarse_É preciso apresentar vídeo de campanha, recompensas para apoiadores, descrição transparente e meta financeira realista._O financiamento contínuo das atividades corriqueiras de um grupo está fora do campo de atuação do site._Não são aceitos projetos com caráter “financie minha vida”, como levantar dinheiro para uma viagem de férias, pagar contas atrasadas ou comprar um celular . Mais informaçôes: www.kickante.com.brwww.catarse.me/pt/projects