Colunista Zeza Amaral (Cedoc/RAC)
Estou cá a procurar um lugar para acalmar a minha pobre alma, ou o pouco que restou dela após tantas decepções políticas e existenciais. Mensalão, petrolão, furtos generalizados dos cofres públicos, Fernando Collor surge, mais uma vez, e outra vez, protagonizando uma bufa comédia de ladroagem política.Quando Fernando Collor surgiu no cenário político como candidato a Presidente da República, perguntei então quais seriam suas credenciais para tanto. E o mesmo disse de Lula da Silva. Collor caiu da presidência pela campanha petista do Fora Collor, tudo por conta de um Fiat Elba – que hoje, em valores atualizados, não passaria de 45 mil reais. E eis que a Polícia Federal e o Ministério Público Federal, a cumprir mandato de busca e apreensão expedido pelo Supremo Tribunal Federal, apreenderam na garagem da famosa Casa da Dinda carros de marcas famosas, as quais o povo brasileiro só vê em filmes ou em fotos de revistas especializadas em carros. Leio que só um desses carros vale cerca de um milhão de reais. É claro que tudo isso tem um interesse político, de um livrar a cara de Lulla da Sillva e Dillma Rousseff, visto que Collor hoje é um importante aliado deles no Senado.Bem, essa gente toda gosta de viver do bom e do melhor e, sinceramente, também gosto das boas coisas da vida. Mas furtar não me pertence. E Fernando Collor me parece fissurado em curtir carros e uma vida política e idiota.E eu quero apenas uma rua de terra, toda ela guardada por pequenas árvores plantadas nas frentes das casas. Quero uma casa de muro baixo, com portão de trinco.Quero uma rua inteira repleta de cadeiras na calçada, a mulherada toda conversando, tricotando linhas e receitas.Quero a minha mãe me chamando para o banho, chamando os filhos mais velhos para a janta.Quero sentir o perfume de talco da minha mãe, quando ela recebia o meu pai no portão da casa; quero a minha mãe de novo sentada na cadeira da calçada, trocando conversas, tricotando paixões com as sua amigas vizinhas.Quero o meu pai conversando com o pai da minha mãe.Quero o meu avô me pedindo pra pegar lenha para o forno de barro, ao gosto do amendoim ou do coco; quero o cheiro da lenha queimando pelo fim da tarde, estalando a sua felicidade...Quero pegar um bonde na Rua Paula Bueno e chegar ao Centro da cidade, bonde quatro, e que nele esteja a moça morena que morava numa elegante casa da rua Major Solon. Nem tanto pela paixão, mas pelos seus olhos de jabuticaba, pomar tão belo de se ver e lambuzar a testa.Quero de novo voltar a conversar com o meu amigo Tuca, morto ainda menino, sobre o jeito melhor da gente ir para São Paulo, de carona numa Maria Fumaça. Perdemos grandes horas discutindo se fosse melhor ir de manhã ou de noite. Mas viajamos em nossos pequenos sonhos...Quero de volta a minha bola de capotão, as pedras que demarcavam os gols do campinho, os espinhos de joá, aquele desesperado berro de mães chamando pelos seus filhos, pedindo pra voltar pra casa, tomar banho, jantar e dormir para sonhar com o novo dia...Quero ver a moça bonita que trabalhava na Rádio Brasil, subindo a ladeira da Rua Vilagellin Neto, impecavelmente linda, ostentando meias com costuras corretamente dispostas, do calcanhar ao início da coxa.Quero ouvir o programa do Cícero Lanaro, Show do Meio Dia, Rádio Brasil, patrocinado pelas Casas Boris.Quero e queria tantas coisas, me ajeitar, bêbado, no colo de Hilda Hilst; sentir as mãos quentes da minha avó Lucinda; ralar um bom queijo parmesão, ou sentir o gelado da garrafa da maçã Vanucci, trazida pelo meu pai, naqueles domingos fantásticos do Taquaral.Hoje, quero muito mais. Quero os olhos castanhos da moça-que-manda-em-mim iluminados por serena alegria, sua boca sempre em sorriso contido e seus amplos abraços de sereia, repletos de tantas águas de rios e lagoas. Só queria um jeito de ela entender que não tenho mais como achar um jeito para amá-la um pouco mais. Era só isso que eu queria. E ainda quero. E dane-se a politicalha e tudo o que a cerca. Afinal, tenho muito mais o que fazer na vida.Bom dia.