As notificações incluem casos de agressão física, ameaça, bullying, discriminação e ação violenta de grupos/gangues (PxHere)
A violência em escolas públicas no período pós-pandemia vem registrando uma escalada, com aumento de 45,7% dos casos, apenas no primeiro trimestre deste ano, em comparação ao mesmo período de 2019. Os dados são da Secretaria da Educação do Estado de São Paulo (Seduc-SP), que apontaram 5.737 mil ocorrências contra 3.937 notificações antes da pandemia. A pesquisadora, Danila Di Pietro, que estuda o tema, acredita que a violência é usada como um meio de expressão e que é preciso acolhimento para romper ciclo violento.
As notificações incluem casos de agressão física, ameaça, bullying, discriminação e ação violenta de grupos/gangues.
Na região de Campinas, no último dia 30 de março, uma adolescente de 15 anos foi internada na Unidade de Pronto Atendimento (UPA) da Vila Sônia, em Piracicaba, depois de ser agredida por cinco pessoas na Escola Estadual Hélio Penteado de Castro.
No dia 20 do mês passado, no mesmo município, a mãe de um adolescente de 13 anos procurou a Polícia para registrar a agressão sofrida pelo filho dentro da Escola Estadual Prof.ª Catharina Casale Padovani.
Em Campinas, no dia 26 de maio, a direção da Escola Estadual Francisco Glicério acionou a Polícia Militar para atender a uma denúncia de assédio, o que culminou numa confusão generalizada, que deixou um adolescente desacordado.
Em maio deste ano, pelo menos quatro escolas, todas em Campinas, foram alvo de pichações que anunciavam que chacinas ocorreriam nas unidades escolares, o que foi respondido com reforço policial.
Violência como linguagem
Segundo a especialista em Convivência Escolar e doutoranda em Educação pela Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), Danila Di Pietro, que pesquisa o tema, essa escalada de violência tem relação com a “concepção construtivista do sujeito”, na qual se observa a reação de estudantes que viviam em “suas bolhas”, reencontrando uma sociedade com regras.
“Nessa concepção construtivista, a pessoa vai aprender pela ação. Por meio dela é que a pessoa vai se desenvolver, aprimorar e ter uma reflexão profunda daquilo que está fazendo. E precisamos considerar que passamos quase dois anos de pandemia sem convivência presencial e isso não foi trabalhado. Então é agora, no retorno às aulas, que eles [estudantes]precisam lidar com os limites”, defende.
É nesse contexto que, segundo a pesquisadora, a violência passa a ser usada como uma forma de expressão. Ela é o resultado, de acordo com Danila, de questões anteriores e expõem, na verdade, a dificuldade do aluno em lidar com a sua nova situação.
A orientadora pedagógica Flávia Martins Guimarães, que responde pela Assessoria de Educação e Cidadania da Secretaria Municipal de Educação de Campinas, endossa essa leitura.
“Todos nós vivemos um período, nesse isolamento, de uma autonomia em lidar com nosso tempo, com as nossas escolhas. A vida era muito privada e fomos ficando mais intimistas do que coletivos. E a escola é um espaço coletivo que cerceia a autonomia individual. A frustração da perda de liberdade das escolhas, o encontro com o diferente, com as regras, mobilizou a violência como uma linguagem que expressa esse desconforto”, frisa.
Ambas as especialistas defendem que os casos precisam ser trabalhados no âmbito do acolhimento, a fim de não evoluírem para situações mais graves e que podem impactar negativamente aos estudantes e o ambiente escolar.
“A escola não é apenas um lugar de aprendizagem acadêmica, mas de construção de vínculos sociais. Escolher a escola para demonstrar esse uso tão explícito de poder por meio da violência é, sem dúvida alguma, uma mensagem de que aquele lugar, interiormente, ainda não contempla o seu devido valor. Ou seja, não criei vínculos o suficiente para respeitar as pessoas que fazem parte dele, então, posso considerar essas pessoas descartáveis”, exemplifica Diana.
Ela ainda faz questão de reforçar que: “Por mais que seja sido difícil, a resposta não é voltar para casa, não é levar essas crianças para a delegacia, porque são respostas inadequadas e extremas. Precisamos de um plano de atuação, considerando-se médio e longo prazos também (…) Essa agenda precisa ser frequente e flexível, ela não pode ser pontual, caso contrário, infelizmente, o que acabará sendo frequente será o uso da violência para se comunicar.”
Medidas nas redes
Em nota, a Seduc informou que repudia qualquer forma de agressão dentro ou fora das escolas e que todos os casos registrados foram reportados ao Programa de Melhoria da Convivência e Proteção Escolar (Conviva SP). E ainda que, quando necessário, o atendimento psicológico é disponibilizado tanto para os servidores quanto aos estudantes.
Já na rede municipal, Flávia destaca a implementação do programa Reconhecer, Acolher e Cuidar, que inicia neste mês de junho, com foco na formação coletiva dos gestores. O programa, além de trabalhar os casos de violência nas escolas, visa identificar situação anteriores que os estudantes tenham passado, que podem estar sendo reproduzidas no ambiente escolar.