SEGURANÇA PÚBLICA

Reajuste salarial com índices distintos gera insatisfação entre polícias

Proposta do governo para aumento das categorias desigualou as corporações, “desvalorizando a Civil”

Alenita Ramirez/ [email protected]
21/05/2023 às 11:03.
Atualizado em 21/05/2023 às 11:03
De acordo com a proposta do governo, o subtenente e o soldado de segunda classe da PM receberão aumento, respectivamente, de 30,8% e de 31,6% (Rodrigo Zanotto)

De acordo com a proposta do governo, o subtenente e o soldado de segunda classe da PM receberão aumento, respectivamente, de 30,8% e de 31,6% (Rodrigo Zanotto)

O tão aguardado reajuste salarial das policiais civis e militares do estado virou um pesadelo para as corporações. A proposta, enviada no começo deste mês pelo governador Tarcísio de Freitas (Republicanos) à Assembleia Legislativa de São Paulo (Alesp), não só sugere um percentual diferenciado para todas as categorias, mas aparentemente desigualou as corporações, desvalorizando a Polícia Civil e “privilegiando” a Polícia Militar. O aumento é almejado pelos agentes de segurança pública por, pelo menos, quase três décadas e era um dos carros-chefes de campanha do atual governo.

O projeto que institui o aumento nos vencimentos dos agentes de segurança pública não sugere um percentual linear, único de reajuste, para todas as categorias das corporações. Ele oscila entre 13% a 34%, de acordo com o cargo ocupado. O índice de maior aumento foi concedido para os novos agentes que estão ingressando nas policias. Os que ocupam cargos especiais, ou seja, final de carreira, foram os que menos tiveram aumento, pela proposta.

“Sempre houve um certo atrito entre a Polícia Militar e a Civil. Com a ‘valorização’ da PM neste projeto, criouse mais animosidade. O governo fez uma promessa na campanha e não está cumprindo”, comentou um policial, cujo nome e a corporação foram preservados.

Pela proposta, mais de 150 mil agentes serão beneficiados, entre polícias Civil, Militar, Técnico-Científica e Corpo de Bombeiros, aposentados e pensionistas.

De acordo com a tabela de reajuste, os 2º tenentes da Polícia Militar terão o menor reajuste, de 13,71% em seus salários - que passarão de R$ 7.577,12 para R$ 8.615,94. Já os alunos de praça da PM terão o maior aumento, de 34,24%: salários passam de R$ 3.029,36 para R$ 4.066,54. Para a Polícia Civil, o percentual oscila entre 14% e 23%. Policiais penais não foram incluídos neste projeto, já que integram a Secretaria de Administração Penitenciária (SAP), segundo justificativa da Secretaria de Segurança Pública (SSP).

A proposta deve ir a votação na sessão da Alesp na próxima terça-feira. Se aprovado, o impacto vai ser R$ 2,5 bilhões no orçamento estadual em 2023 e de R$ 5 bilhões nos demais anos.

“O projeto é um avanço enorme, pois cumpre com a promessa do governo logo no primeiro ano de mandato. E para não comprometer as contas estaduais, o governo considerou um percentual médio de 20%. É óbvio que a gente queria dar mais aumento e isso vai acontecer, mas em um próximo momento. Precisamos aprovar urgentemente esse projeto, que era para ter sido aprovado em regime de urgência. A segurança é primordial e nossos agentes precisam desse reconhecimento”, disse o deputado estadual Paulo Mansur (PL).

Para o Sindicato dos Delegados de Polícia do Estado de São Paulo (Sindpesp), o projeto de lei é bem-vindo, uma vez que a categoria “foi preterida nos últimos anos pelos governos anteriores”. Entretanto, mesmo sendo um aceno de valorização importante, os números que estão em discussão não atenderam as reivindicações das instituições policiais.

De acordo com o sindicato, os delegados e demais profissionais da Polícia Civil não terão o mesmo reajuste proposto aos militares. Segundo a presidente do Sindpesp, a delegada Jacqueline Valadares, enquanto o delegado terá correção entre 14% (classe especial) e 20,7% (terceira classe), e o investigador entre 16% (classe especial) e 24,6% (terceira classe), o subtenente e o soldado de segunda classe da PM receberão aumento, respectivamente, de 30,8% e de 31,6%. A distinção ocasionou descontentamento.

“Como representante legítimo dos delegados paulistas e com base em seu histórico de atuação em defesa da Polícia Civil, o Sindpesp entende que o texto que tramita na Alesp deve ser aprimorado. Não é cabível a diferenciação de correção entre as Polícias Civil e Militar. Ambas instituições merecem tratamento igualitário”, criticou.

O Sindicato dos Delegados, segundo a presidente, em nenhum momento foi consultado pelo Estado durante a elaboração da proposta. Em reuniões realizadas entre o Sindpesp e secretário de Segurança Pública, Guilherme Derrite, teria apenas compartilhado possibilidades de conversas, mas sem margens para a negociação.

“Esse projeto de lei, aguardado como promessa de recomposição salarial e de valorização das forças de segurança, saiu da Secretaria de Segurança Pública (SSP) para as mãos do governador Tarcísio sem a oitiva prévia das entidades de classe. É um texto que necessitava ser apurado. Além da diferenciação, o que foi proposto não tira São Paulo do ranking dos estados que pior paga o delegado de Polícia. Mesmo com o projeto de lei aprovado, São Paulo ficaria na 22ª colocação, entre 27 estados da federação, mesmo São Paulo sendo o mais rico do Brasil”, disse Jacqueline.

O presidente do Sindicato dos Policiais Civis da Região de Campinas, Aparecido Lima de Carvalho, o Kiko, defende que percentual sugerido para a instituição desestimulou os agentes, uma vez que ele deveria ser nivelado para as duas corporações. “Recebemos muitas reclamações e conversamos com o governo, que prometeu fazer reparo com outro realinhamento. Apesar das falhas ha de se ponderar que o percentual de aumento é o maior no primeiro ano de governo e nos últimos 30 anos”, disse Kiko.

Para o presidente da Defenda PM, coronel Elias Miler da Silva, a diferenciação de reajuste para os agentes de segurança, iniciantes, é para estimular a contratação de novos agentes, já que o salário inicial é muito baixo, o que leva muitos a desistirem da carreira e buscar por outras. Miler, admite que na própria corporação também há descontentamento, em especial para os cargos de terceiro sargento e segundo tenente, que tiveram o menor aumento, inclusive, abaixo do que a Polícia Civil, porém ele acredita que até ao final do governo essa diferença será equiparada, para todas as classes e corporações.

“A medida feita pelo governador é altamente histórica e positiva, pois ele está tentando fazer um reequilíbrio para nos três anos seguintes corrigir distorções. Então a proposta é meritória e honrada. O Tarcísio está cumprindo o compromisso de campanha no primeiro semestre e no primeiro ano e eu espero que o Tarcísio consiga até o final dos quatro anos, cumprir a promessa de campanha de colocar o salário da PM, da Polícia Civil, da Penal e da Técnica Científica entre os 10 melhores salários do País”, disse.

Segundo ele, o rompimento da isonomia na carreira das corporações aconteceu por volta de 2009 quando o governador Geraldo Alckmin (na época filiado ao PSDB), concedeu aumento de 10,5% e 15% para a Polícia Civil e 7% para a PM. “A partir desse aumento essa isonomia foi rompida. Portanto já houve uma discriminação violenta com a polícia militar e a PM não fez escândalo e nem reclamou”, enfatizou.

OUTRO LADO

Em nota, a SSP informou que não há disparidade no projeto de lei que prevê o reajuste salarial. A proposta, segundo a pasta, foi construída com a cúpula das polícias, que incluíram os ajustes que determinaram necessários. O impacto orçamentário foi aprovado pela Comissão de Política Salarial e será custeado pelos recursos financeiros do Tesouro.

“A proposta tem a missão de resgatar as carreiras policiais de uma situação de ampla defasagem salarial, com base em três pilares. O primeiro deles é fomentar o ingresso na polícia, o segundo é fomentar a manutenção na carreira e o terceiro é motivar a progressão na carreira”, destacou em nota.

Ainda conforme a SSP, o projeto é um fato inédito para um primeiro ano de governo e está muito acima do índice de inflação dos últimos 12 meses, quando houve o último reajuste, que foi de 4,65%, segundo o Índice Nacional de Preços ao Consumidor (IPCA). “A iniciativa proporcionou um aumento real aos policiais já no início da gestão”, frisou.

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