Crime ocorreu em 2018, quando quadrilha levou um malote de US$ 5 milhões que iria para a Suíça
Viaturas dos agentes na região do bairro Botafogo, onde seria cumprido mandado de busca e apreensão (Divulgação)
A Polícia Federal (PF) acredita que o rastreamento do dinheiro aplicado na aquisição de imóveis, carros e abertura de empresas é a melhor alternativa para encontrar os responsáveis pelo roubo dos US$ 5 milhões no Aeroporto Internacional de Viracopos, em março de 2018. A nova estratégia de investigação foi divulgada na terça-feira (29) pelo delegado Edson Geraldo de Souza, durante a deflagração da “Operação Occulta Pecunia” contra a lavagem de dinheiro dos criminosos envolvidos no assalto. Na ação, que contou com a parceria do 1º Batalhão de Ações Especiais da Polícia Militar (Baep), foram cumpridos três mandados de busca e apreensão em Campinas, Sumaré e em Belém (PA).
Para Souza a técnica chamada de "follow the money" (que significa "siga o dinheiro") é o que existe de mais moderno atualmente em investigação judiciária de crimes contra o patrimônio. Por meio do rastreio do destino dado ao montante roubado é possível se chegar aos envolvidos no crime de maneira mais fácil do que em uma investigação direta, utilizando-se de depoimentos, imagens de circuito de segurança e exames papiloscópico.
"Acreditamos que é a investigação mais eficiente, porque ela prescreve em 16 anos, ou seja, temos tranquilidade, pessoal dedicado e equipamentos pelos próximos 12 anos. No entanto, a técnica mais evoluída que existe é a follow the money”, explicou o delegado. "Por exemplo, no roubo de Viracopos de 2019, não levaram nem um real, então, não há como rastrear digitalmente e fica mais difícil chegar aos criminosos. Nesse caso, levaram US$ 5 milhões, o que nos possibilita o rastreio”, acrescentou.
Ninguém foi preso na operação de terça-feira (29). Segundo o delegado, um dos investigados desta fase da operação é um parente direto de um dos suspeitos de participar do roubo e ele morreu em maio de 2021. Ele é apontado como um dos líderes da quadrilha, que tinha pelo menos cinco integrantes, incluindo ele.
Os endereços alvos não foram informados pela corporação devido ao sigilo das investigações, mas Souza adiantou que os investigados usaram seus nomes para a formação de empresas, compra de imóveis, tais como apartamento, casa e terrenos em Campinas e em Furnas, e também de seis veículos. A compra dos bens foi realizada por parentes que administram os bens mediante contratos de gaveta. Uma das empresas constituídas pelos “laranjas” seria de fachada no ramo de transporte,usada para administrar os bens.
“Acreditamos que toda essa movimentação esteja diretamente relacionada ao uso do dinheiro oriundo do roubo em Viracopos. Apostamos que, com a apreensão dos documentos (inclusive contratos), celulares e dispositivos eletrônicos, conseguiremos identificar a origem desses recursos”, frisou o delegado.
Para chegar aos suspeitos envolvidos nessa operação, a PF cruzou informações das 20 operações realizadas entre 2021 e 2022 contra o sistema financeiro na região de Campinas e ainda das ações contra os crimes praticados no Aeroporto de Viracopos.
“As operações nos deram uma ampla visão da região sobre crimes financeiros, doleiros e lavagem de dinheiro. Elas nos mostraram uma movimentação incomum relacionada a esse suspeito ligado a um dos investigados que foi morto - como a aquisição de empresa, veículos e imóveis não registrados no nome dele, mas movimentados em nome de pessoas próximas a ele”, comentou Souza.
Um dos investigados, exemplificou o delegado, declarou uma renda mensal de R$ 2 mil, mas tem uma empresa que fatura R$ 24 milhões. O roubo em Viracopos é investigado pela Polícia Civil, mas, durante o inquérito policial, foi verificada a existência de um grupo, que, de maneira "estruturada e ordenada", praticou atos de lavagem de dinheiro para esconder o montante levado do aeroporto, por meio de compra e venda de imóveis, aquisição de veículos e criação de empresas, além de outros métodos. "Muitas pessoas podem, inclusive, ter emprestado o nome para a aquisição desses imóveis. Contudo, é importante frisar que isso é crime. Ela se envolve no crime de lavagem de dinheiro quando empresta o seu nome para aquisição de bens com dinheiro ilícito. E nesse caso, ela que vai precisar provar que não sabia sobre a origem ilegal do dinheiro", advertiu o delegado.
Segundo Souza, os dois suspeitos de participação no roubo identificados estão mortos, um deles em maio do ano passado. O outro, foi morto recentemente. Ambos executados em Campinas. Com a identificação dos investigados e a apreensão dos documentos, a PF vai pedir a quebra de sigilo bancário e telemática dos investigados.
“Para o roubo 2018, a prescrição se dá entre 16 e 20 anos. Para a lavagem de dinheiro, são 16 anos. A PF não vai desistir. E o recado que queremos deixar é: não haverá impunidade nem tranquilidade para usufruir desses recursos enquanto houver tempo prescricional e a nossa disposição de investigar”, frisou Souza. Pelo menos cerca de 20 PMs participaram da ação. O nome da operação, em latim, traduz-se por “dinheiro oculto”. Os envolvidos nesse inquérito, que tem 30 dias para ser concluído, responderão, na medida de suas participações, pelos crimes de lavagem de dinheiro e associação criminosa.
O ROUBO
O roubo dos US$ 5 milhões aconteceu na noite do dia 4 de março de 2018. Em uma ação ousada, cinco bandidos armados com fuzis se passaram por vigilantes e invadiram a pista de pouso do Aeroporto Internacional de Viracopos, fugindo com o dinheiro que estava em 13 malotes que eram transferidos para um avião cargueiro da empresa Lufthansa, os quais seriam levados a Zurique, na Suíça. No dia do crime, que levou seis minutos, ninguém foi preso. A aeronave onde estava o dinheiro havia saído do Aeroporto Internacional de Guarulhos (aeronave de registro D-ALCF) e parou em Campinas para recolher mais carga. Na sequência, o cargueiro seguiria para Dacar, no Senegal, antes de rumar para a Europa.
Os bandidos usaram uma caminhonete Hillux, caracterizada com as cores e logomarca da empresa que faz a segurança da pista do aeroporto - a GPS.
Os criminosos arrombaram o alambrado, na lateral do sítio aeroportuário - no Jardim Paraíso de Viracopos, próximo a um barracão da empresa Azul -, e acessaram o Portão 18. Eles seguiram por uma estrada interna, contornando a pista em direção ao terminal de cargas. No trajeto, os ladrões depararam com uma viatura da segurança e renderam dois vigilantes. Ainda no percurso, eles teriam encontrado outra viatura, mas, como a caminhonete estava logada, ela não foi parada.
Então, os bandidos seguiram até a pista e renderam ao menos três funcionários da empresa alemã, colocando-os em uma van.
Apesar de o carregamento ter Zurique como destino, ele estava em um palete fora da aeronave. Após roubarem o carregamento, os criminosos fugiram em direção à Rodovia Santos Dumont. Fora do aeroporto, eles queimaram a caminhonete e fugiram com um outro veículo.
O dinheiro pertencia à empresa de valores Brink’s. Na fuga, os bandidos arrombaram dois portões para sair do aeroporto. A Polícia Federal foi acionada e mobilizou também a Polícia Militar na tentativa de cercar a quadrilha, mas ninguém foi detido no dia do assalto.
As buscas e a apuração envolveram também policiais do Departamento Estadual de Investigações Criminais (Deic) de São Paulo.