NO JARDIM SATÉLITE ÍRIS

Professor denuncia à Polícia ataques homofóbicos em escola de Campinas

Agressões verbais são praticadas, segundo Lucas, por quatro alunos; vítima pede expulsão dos ofensores

Alenita Ramirez/ [email protected]
12/10/2022 às 10:19.
Atualizado em 12/10/2022 às 10:22
O professor de sociologia, Lucas Camargo da Silva , mostra o Boletim de Ocorrência que abriu na Polícia Civil denunciando as agressões (Rodrigo Zanotto)

O professor de sociologia, Lucas Camargo da Silva , mostra o Boletim de Ocorrência que abriu na Polícia Civil denunciando as agressões (Rodrigo Zanotto)

Um professor de sociologia, de 23 anos, da rede estadual de educação, em Campinas, denunciou à Polícia Civil que há oito meses vem sofrendo ataques homofóbicos praticados por quatro alunos da escola onde ele leciona, no Jardim Satélite Íris. Além dos xingamentos, o docente contou que também é ameaçado de agressão física. Lucas Camargo da Silva quer que os estudantes, três deles maiores de idade, sejam expulsos. 

“Estou muito cansado. Tenho que lecionar e não estou aguentando nem pegar a caneta. Às vezes, tenho que passar alguns pontos da matéria na lousa, porém fico transtornado, constrangido, com a sensação contínua de medo. A situação me deixa muito desconfortável. Não tem mais como eu permanecer dando aula para essas salas sendo tratado dessa forma (maltratado), inclusive com ameaça de agressão física”, relatou a vítima.

Silva leciona há cinco anos na rede estadual e desde março deste ano dá aulas no período noturno para duas turmas do 3ª ano do ensino médio, duas vezes por semana, na escola Glória Aparecida Rosa Viana. 

Em uma das salas, um aluno de 19 anos, avaliado por ele como faltoso e indisciplinado, costuma fazer ataques homofóbicos, desde o início do ano letivo, na frente dos colegas de sala. “Ele reiteradamente fazia esses ataques, mas eu relevava por conta do histórico familiar dele, que é complicado, pois foi criado pela avó e vem de outro estado brasileiro, com outra cultura. Mas no dia 26 de setembro foi o ápice. Não posso mais tolerar a situação. Cheguei a responder para ele”, contou Silva.

O assédio teria acontecido durante uma atividade de aula. Como uma parte da sala não havia respondido a um questionário distribuído na aula anterior, o exercício foi repassado para os estudantes que ainda não o tinham feito. 

Paralelamente à atividade, o professor decidiu seguir com a exibição de um filme, a pedido de uma aluna. “Essa estudante me perguntou sobre como ele (agressor) estava indo e respondi que se tratava de um caso perdido. Iniciei o filme. Como estava demorando e percebi que muitos não estavam fazendo a atividade, chamei a atenção deles de forma geral: ‘Vamos!’. Esse aluno então começou a me atacar, dizendo:‘Seu veado! Você se acha o diretor da escola?’ e me xingou de outras coisas. Fui em sua direção para conversar, mas ele disse para não o tocá-lo. Pela primeira vez retruquei, dizendo que não tocava em ‘lixo’ e voltei para minha mesa. Ele disse que se pudesse bateria em mim ali mesmo”, contou o professor.

Ainda conforme Silva, o aluno tem três amigos em outra sala, na qual a vítima também leciona, e o estudante faz questão de ir lá para continuar com as provocações junto com os amigos. “Registrei um boletim de ocorrência contra eles e vou representar criminalmente. Já pedi medidas para a direção, mas ninguém faz nada. Será que vão esperar que me matem? Estou cansado dessa tortura...”, queixou-se.

Entidades de educação repudiam atos e manifestações discriminatórias

Em nota, a Secretaria da Educação do Estado de São Paulo informou que repudia atos de discriminação, dentro e fora do ambiente escolar e, assim que soube da situação, a direção chamou os responsáveis pelos estudantes para uma conversa de orientação e mediação. “O caso permanece sob análise para averiguação de eventuais responsabilizações, sempre considerando as providências que preservem o direito dos alunos à Educação.” Informou ainda que o caso foi inserido na Plataforma Conviva SP – Placon e que o Conviva Regional realizará ações específicas sobre o tema na escola. Além disso, mencionou que os gestores das unidades escolares da Diretoria de Ensino participaram de formação sobre círculos restaurativos, diálogos e outras várias ações que incentivam a boa convivência e colaboração dentro do ambiente escolar.

A presidente da Comissão de Diversidade Sexual e Combate à homofobia da Ordem dos Advogados (OAB) de Campinas, Ana Carolina Hinojosa, informou que não tinha conhecimento deste caso, mas disse que faria a denúncia junto à Secretaria de Justiça de São Paulo, mediante a coordenadoria de Políticas Públicas para as pessoas GLBT, a qual deverá abrir procedimento administrativo de apuração. “Ele (professor) agiu certo ao registrar o BO, visto que se extrapolou os limites da punibilidade. Ele também deve fazer a denúncia junto à Diretoria de Ensino. É um caso grave”, acredita Ana Carolina. “Nem sempre esses casos chegam para nós. No entanto, procuramos realizar ações de capacitação em escolas e de conscientização de alunos, pais e professores sobre as questões de preconceito”. O diretor estadual da Apeoesp, Pedro Oliveira, também alegou que não tinha conhecimento dessa situação e que a “Apeoesp repudia qualquer tipo de violência contra a população GLBT. Seja ela praticada contra professores, estudantes ou qualquer outro membro da comunidade escolar”. “Achamos um absurdo a situação vivenciada pelo professor Lucas. É urgente que a Secretaria de Educação e a Diretoria de Ensino ajam no sentido de impedir o prosseguimento da violência sofrida pelo docente. Isso passa pela conscientização da comunidade escolar acerca dos direitos humanos e pelo apontamento de práticas de tolerância e respeito independente de cor, raça, religião, gênero e orientação sexual ”, frisou.

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