MISTÉRIO

Pai de santo ‘some’ durante ritual religioso na beira de rio em Campinas

Domingos Forchezatto é acusado de abuso sexual contra ao menos 7 mulheres

Rodrigo Piomonte
02/08/2022 às 08:37.
Atualizado em 02/08/2022 às 08:37
Fachada do terreiro Pai Tajubim, que funcionava nos últimos 30 anos na região do bairro Taquaral, em Campinas: templo permanece fechado após denúncias de abuso sexual (Ricardo Lima)

Fachada do terreiro Pai Tajubim, que funcionava nos últimos 30 anos na região do bairro Taquaral, em Campinas: templo permanece fechado após denúncias de abuso sexual (Ricardo Lima)

O caso do líder espiritual Domingos Forchezatto, 68 anos, investigado após denúncias de assédio e violência sexual contra ao menos sete mulheres ganha contornos de mistério. As vítimas frequentavam o terreiro Pai Tajubim, que funcionava nos últimos 30 anos na região do bairro Taquaral, em Campinas. Desde a madrugada da última sexta-feira, dia 29, Domingos está desaparecido. O sumiço do pai de santo teria ocorrido quando ele realizava um trabalho religioso na beira de um rio no meio de uma mata fechada numa chácara que era usada pela comunidade do terreiro para trabalhos espirituais. A chácara é localizada na rua Amélia Rodrigues de Figueiredo, no Loteamento Chácaras Vale das Garças, no distrito de Barão Geraldo, próximo ao Rio Atibaia.

Momentos antes de ter sido visto pela última vez, testemunhas que acompanhavam o pai de santo durante a cerimônia religiosa relatam que ele teria pedido para ficar sozinho na beira do rio. Eram por volta da meia noite e meia quando o trabalho espiritual teria sido iniciado. A pessoa que acompanhava o líder espiritual atendeu ao pedido e se afastou, ficando esperando em outro local. Às 2h30 da madrugada, o caseiro da casa da família, que também estava na chácara, foi até o local onde Domingos realizava o trabalho espiritual e também ouviu do líder espiritual um pedido para ficar a sós. O caseiro respeitou a privacidade solicitada pelo pai de santo e se retirou do local de mata. Essa teria sido a última vez que o pai de santo foi visto.

Quando foi por volta das 4h da madrugada, o caseiro e a outra pessoa que também participava dos trabalhos religiosos na chácara sentindo a ausência prolongada de Domingos foram até a beira do rio para encontrar o pai de santo, e não mais localizaram o líder espiritual. No local onde estava sendo realizado o trabalho foi encontrado apenas os pertences pessoais do pai de santo, segundo informações das testemunhas.

Após clarear o dia, por volta das sete horas da manhã, outras pessoas se juntaram nas buscas pela mata à procura de algum sinal de Domingos. A família entrou então em contato com a Polícia Civil ao anoitecer e um boletim de ocorrência comunicando o desaparecimento misterioso do pai de santo foi elaborado por volta das 21h30.

O caso foi registrado no plantão do 4º Distrito Policial no bairro Taquaral na noite de sexta-feira. Mas até segunda-feira (1º) o líder espiritual continuava desaparecido. Por se tratar de desaparecimento, o caso foi direcionado para o Departamento Especializado por Investigações Criminais (Deic) da Polícia Civil.

O delegado divisionário Oswaldo Diez Jr., responsável pelas investigações, informou na segunda-feira (1º) que um procedimento policial já foi instaurado para apurar o sumiço. Ele designou as equipes do Departamento Estadual de Homicídios e de Proteção à Pessoa (DHPP) do Deic de Campinas para conduzir as investigações. "Foi instaurado um procedimento e as equipes já iniciaram as investigações. O caso está sob segredo e mais detalhes não podem ser dados para não atrapalhar as apurações", disse Diez.

Os fatos envolvendo o nome do pai de santo Domingos Forchezatto chocaram a comunidade espiritual da Associação Espiritual de Umbanda Pai Tajubim (AEUPT) da qual Domingos era o mais conceituado líder religioso. Todas os demais religiosos de matrizes africanas da cidade ligados à Associação dos Religiosos de Matriz Africana de Campinas e Região (Armac) também ficaram transtornados com as denúncias que vieram à tona no início do mês passado.

Uma investigação sobre as suspeitas de assédio sexual contra Domingos está sendo conduzida há cerca de um mês pela 1ª Delegcia da Mulher (DDM). Ao menos sete denúncias de mulheres supostamente assediadas pelo líder religioso durante trabalhos espirituais chegaram ao conhecimento das autoridades policiais. A apuração segue em segredo de justiça e Domingos acompanhava as apurações em liberdade.

As denúncias até então confirmadas pelas mulheres que frequentavam a instituição relataram situações de forte constrangimento, assédio sexual, com relação e pressão psicológica. As violências sofridas pelas mulheres só vieram à tona após uma advogada que representa um coletivo de mulheres ter tido acesso ao depoimento de uma das vítimas. Após as primeiras denúncias, outras vítimas se manifestaram.

O advogado José Pedro Said, que defende Domingos no caso das denúncias de supostos assédios sexuais, chegou a afirmar à reportagem do Correio Popular há algumas semanas que seu cliente se apresentaria espontaneamente. Questionado na segunda-feira (1º) sobre o desaparecimento do pai de santo, o advogado disse não ter informações sobre o que poderia ter acontecido. "No caso das denúncias de assédio eu posso dizer que a investigação prossegue com testemunhas sendo ouvidas e documentos sendo anexados ao inquérito. Quanto ao sumiço compete a Polícia Civil apurar o que ocorreu", disse.

O líder religioso já estava afastado de suas funções na Associação Espiritual de Umbanda Pai Tajubim (AEUPT), há cerca de 30 dias, ocasião em que surgiram as primeiras informações sobre os supostos crimes de assédio.

A casa de orações chegou a continuar funcionando por alguns dias após as denúncias, mas acabou fechando as portas. A reportagem do Correio Popular apurou também que além dos relatos de crimes de assédio e violência sexual, Domingos era suspeito de pratica de extorsão e mantinha forte influência psicológica sobre suas vítimas.

Segundo o marido de uma das mulheres que foram violentadas, e que pediu para não ter a identidade revelada, o líder religioso tinha muito 'poder' sobre as pessoas. "As pessoas que Domingos atendia se tornavam escravizadas na mão dele", disse.

O marido afirma ainda que Domingos apresentava um diploma de psicoterapeuta falso, quando na realidade tinha formação em Fisioterapia. Ele disse que sua esposa já tentou suicídio por duas ocasiões desde de que o caso de assédio sexual contra ela se tornou público.

A relação do marido e da esposa com a instituição e com o religioso era de mais de 20 anos, e de muita proximidade. "Eu e todos na Casa tínhamos o Domingos como um pai", chegou a revelar o marido em depoimento ao Correio Popular.

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