Criminosos apostam no envolvimento emocional para conseguir se passar pelos filhos
A diretora do Procon Valinhos, Vilma Albuquerque, mostra uma das mensagens do golpista para uma mãe (Divulgação)
A falta de exigências das operadoras de telefonia para cadastrar os chips aliada à ausência de cuidados das próprias vítimas contribuem para que criminosos continuem se reinventando e aplicando cada vez mais golpes pelo celular, segundo a análise do delegado do 4º Distrito Policial (DP) de Campinas, José Carlos Fernandes. Nos últimos meses, foram constatados diversos tipos de golpes, com modalidades diferenciadas, mas todas elas envolvem o aplicativo WhatsApp.
Em Valinhos, por exemplo, entre maio e junho deste ano, o Procon local registrou oito reclamações sobre o golpe da “mãe”, como foi batizado pelo órgão de defesa do consumidor. Apesar de o Procon não ser um órgão de polícia judiciária, as vítimas procuraram a entidade para registrar a denúncia e tentar reaver o prejuízo. “As vítimas não se dão ao trabalho de ligar para aquele suposto parente que está passando a mensagem ou pedir para que ele envie um áudio, para confirmar que se trata mesmo daquela pessoa”, comentou o delegado.
Em linhas gerais, o golpe é semelhante ao do PIX, no qual o criminoso se passa por alguém da família ou um amigo e envia mensagem pedindo dinheiro, seja para consertar carro, arrumar o celular ou para pagar alguma conta emergencialmente.
Para aplicar o golpe, de acordo com Fernandes, os estelionatários adquirem um chip em nome de terceiros e até de falecidos, instalam ele no celular e no perfil do aplicativo WhatsApp, com a foto de uma determinada pessoa “alvo”, que o criminoso geralmente obtêm nas redes sociais. A partir daí, o golpista envia mensagens para os contatos que ele conseguiu e faz o apelo.
Na mensagem, ele enfatiza que o dinheiro deve ser emprestado mediante a transferência por PIX ou depósitos em conta-corrente. “Não é clonagem de celular, mas um mecanismo simples. Só que muita gente acaba caindo na cilada por envolver sentimentos. Na maior parte dos casos, a mensagem é dirigida aos pais, com os criminosos tentando se passar pelos filhos. Isso porque, normalmente, eles têm uma renda maior e costumam ajudar os filhos financeiramente. E, é claro, amam do filhos”, explicou Fernandes.
“Por isso, é importante a divulgação do golpe. Porque melhor do que a investigação é a prevenção, de modo a evitar que as pessoas sejam lesadas pelos criminosos. Infelizmente, existe uma facilidade em se adquirir chip das operadoras de telefonia, sem muita burocracia ou o cuidado para identificar o usuário do chip”, observou o delegado.
Muitas histórias
A diretora do Procon Valinhos, Vilma Albuquerque, disse que as histórias registradas foram idênticas e a conversa começava com a palavra “mãe” e terminava com “à tarde te pago”. Das oito mulheres que procuraram o órgão, quatro caíram no golpe.
De acordo com a diretora do órgão, o perfil das vítimas em 80% dos registros são mulheres acima de 50 anos, com filhos entre 25 e 35 anos. A nova modalidade usada pelos criminosos, de acordo com ela, virou febre na cidade. Nela, o golpista envia uma mensagem escrita para uma mulher, fingindo ser do filho dela, pedindo dinheiro para consertar o celular. O bandido alega que o aparelho quebrou e acabou emprestando um para poder se comunicar, por isso o fato do número ser diferente.
Se a vítima dá atenção ao apelo, o larápio estende a conversa e pede para a “mãe” não depositar o dinheiro na conta dele, mas sim em outra conta, que ele vai fornecer, já que está com a conta negativada e o banco vai reter o montante. Confiante de que se trata realmente do filho, a vítima faz transferência e só descobre que caiu em um golpe quando o verdadeiro filho liga.
“É muito importante que a vítima comunique o banco imediatamente, para que, assim, seja feito o bloqueio da transferência e a devolução do dinheiro. Em seguida, deve registrar formalmente a queixa na polícia, para que seja investigado o autor do crime”, orientou a diretora.
Segundo Vilma, em um dos casos, o bandido mencionou até o banco no qual o filho da vítima é correntista. Os valores exigidos oscilam entre R$ 1,5 a R$ 3 mil. “Os bandidos aproveitam a fragilidade da mulher para criar golpes que a envolvam emocionalmente. A palavra ‘mãe’ desestrutura uma mulher, que se torna presa fácil dos bandidos”, comentou.
Outro lado
Em nota, a Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) informou que tem atuado junto às prestadoras de telefonia móvel para otimizar os procedimentos de cadastro para ativação de linhas pré-pagas, com o intuito de garantir maior segurança aos usuários do serviço móvel.
Também citou que desde novembro de 2021, a ativação do chip pré-pago conta com um processo mais criterioso de validação cadastral, no qual o consumidor precisa, além de informar seus dados pessoais, enviar uma foto sua e do seu documento de identificação.
Ainda conforme a agência, além desses incrementos, as prestadoras Algar, Claro, Oi, Sercomtel, TIM e Vivo também disponibilizaram para a sociedade o Portal de Consultas - cadastropre.com.br -, por meio do qual é possível verificar a existência de linhas pré-pagas ativas por CPF e prestadora .
Quanto à limitação do número de linhas habilitadas por CPF, a agência informou que, “foi definido o limite de dez ativações de chips em canais remotos (lojas on-line ou aplicativos da prestadora, por exemplo)” e que já estuda a possibilidade de reduzir esse limite de ativações.