O delegado Elton Costa: "Identificamos que os medicamentos eram enviados ao Espírito Santo, destinados ao senhor Gleidson Lopes Soares” (Alessandro Torres)
A Polícia Civil confirmou que o esquema de furto de medicamentos de alto custo na farmácia judicial do Departamento Regional de Saúde (DRS) ultrapassa as fronteiras estaduais, envolvendo um bispo evangélico e uma assessora parlamentar como intermediários. Esta suspeita, inicialmente divulgada pelo Correio Popular no início do mês, foi corroborada durante as investigações, nas quais os policiais conseguiram identificar cada participante do esquema, bem como o papel desempenhado por cada um.
O responsável principal por essa prática criminosa é o bispo evangélico Michael Carvalho, genro do servidor público José Carlos dos Santos, que se encarregava de subtrair os medicamentos da farmácia pública. Nas redes sociais, Michael e sua companheira, Gabriela Carvalho - filha de José Carlos e também missionária evangélica - exibiam um estilo de vida confortável, marcado por viagens e passeios financiados com os recursos provenientes do esquema. A polícia destaca que o padrão de vida da família sofreu alterações durante o período em que os medicamentos começaram a desaparecer.
Além disso, Michael compartilhava "pregações" realizadas em uma igreja evangélica, onde exercia o papel de bispo. Atualmente, as autoridades estão em busca do líder religioso, que permanece foragido. Por outro lado, Gabriela, José Carlos e a esposa, Maria do Socorro, encontram-se detidos no Centro de Detenção Provisória (CDP) de Campinas.
O ESQUEMA
Os medicamentos desviados eram adquiridos a pedido de Michael, que intermediava as transações com um receptador localizado no Espírito Santo. Os interessados indicavam os medicamentos desejados, e uma lista era encaminhada a Maria do Socorro. A esposa do servidor público, por sua vez, repassava as solicitações ao marido, responsável por subtrair os medicamentos do almoxarifado da farmácia e transportá-los em uma mochila.
Em análises nos registros telefônicos de Maria, os policiais encontraram conversas entre ela e o genro, revelando os pedidos feitos. Em uma mensagem de áudio, Michael instrui: "Manda mensagem para ele. Liga para ele, manda carta, manda aqueles carros que fazem som. Zé Carlos, enche o 'mochilão', para ele poder encher essa mochila". Outro trecho exibe uma lista com os medicamentos requisitados por ele: 15 Palbociclibe, 5 Venclexta, 5 Keytruda, 10 Entyvio, 5 Ocrevus e Ibrutinib.
Com a lista em mãos, José Carlos obtinha os medicamentos e os entregava à filha, Gabriela, que despachava o conteúdo pelo Aeroporto Internacional de Viracopos. A revelação dos furtos ocorreu devido ao volume subtraído, quando funcionários identificaram a ausência do medicamento Pembrolizumabe - avaliado em R$ 21,7 mil cada unidade - quando um paciente em tratamento de câncer buscou retirá-lo na farmácia. Embora o sistema indicasse um estoque de 28 caixas, um boletim de ocorrência foi registrado uma semana depois. Apenas desse medicamento, foram furtadas 79 caixas, causando um prejuízo de R$ 1,1 milhão aos cofres públicos. Pelo menos oito pessoas em Campinas obtiveram judicialmente o acesso ao medicamento e o retiravam na farmácia judicial.
Na segunda-feira (22), o delegado Elton Costa, da 1ª Delegacia de Investigações Gerais (DIG), forneceu informações adicionais sobre os receptadores, que residem em Vitória (ES). "Identificamos que os medicamentos eram enviados para o Espírito Santo, destinados ao senhor Gleidson Lopes Soares. Coincidentemente, os pagamentos a Michael eram efetuados pela esposa desse indivíduo, a senhora Juliana Ritter. Ela desempenha o cargo de assessora parlamentar do deputado estadual 'delegado Danilo Bahiense' e possui um cargo na Assembleia capixaba. Além disso, está envolvida em uma ONG que presta apoio a deficientes físicos", esclareceu o delegado.
A Polícia Civil do Espírito Santo integrará as investigações para determinar quem eram os compradores dos medicamentos provenientes de Campinas. Um veículo registrado em nome de Juliana, avaliado em R$ 300 mil, foi encontrado em posse de Michael, em uma residência em Hortolândia. Segundo o delegado Elton, Michael contava com mais de 70 mil seguidores nas redes sociais. Ele optou por apagar os perfis no último domingo, após a reportagem do Fantástico (TV Globo) destacar novos detalhes sobre o caso.
"Ele realmente estava tratando como brincadeira a investigação, mas parece que agora sentiu o choque. Todos eles excluíram os perfis nas redes sociais e saíram de cena. A família do Michael está notificada sobre as diligências, mas ele segue foragido", explica o delegado. A Polícia Civil está buscando um mandado de prisão preventiva contra o rapaz.
À imprensa, a defesa do casal capixaba alega que Gleidson realmente comprava os medicamentos, mas não tinha conhecimento de que se tratavam de produtos provenientes de furto. Por outro lado, a advogada Giovana Casemiro Garcia, representando pai, mãe e filha envolvidos no esquema criminoso, negou que tenham subtraído uma carga de R$ 1,1 milhão, admitindo apenas o desvio de alguns remédios da farmácia. O estado confirmou que suspendeu o pagamento do salário de José Carlos, que ainda não foi exonerado do cargo.
Siga o perfil do Correio Popular no Instagram.