NAS DUAS SECCIONAIS

Déficit de policiais civis em Campinas é de 27%

Levantamento feito pelo Sindpesp indicou que há 190 cargos que não estão ocupados na cidade; segundo a entidade, déficit no Estado de São Paulo é de 40%

Paulo Medina/ [email protected]
22/01/2024 às 08:36.
Atualizado em 22/01/2024 às 08:39
Em Campinas, a 2ª Seccional é a delegacia com maior déficit em Campinas, 42%; na 1ª Seccional, são 71 cargos vagos, o equivalente a 17% do que é previsto em lei (Alessandro Torres)

Em Campinas, a 2ª Seccional é a delegacia com maior déficit em Campinas, 42%; na 1ª Seccional, são 71 cargos vagos, o equivalente a 17% do que é previsto em lei (Alessandro Torres)

Levantamento do Sindicato dos Delegados de Polícia do Estado de São Paulo (Sindpesp) feito a pedido do Correio Popular lança luz sobre a realidade da quantidade de pessoas trabalhando nas duas Delegacias Seccionais de Campinas. Os números mostram um déficit de 27% na Polícia Civil, indicando que a efetividade policial pode ser ampliada. São 190 policiais civis a menos que o previsto em lei somadas as duas Seccionais. Na Região Metropolitana de Campinas (RMC), a situação é semelhante. A defasagem de policiais em Campinas e região ainda é inferior à média estadual, que é de 40%, de acordo com a entidade. Por trás desses números, policiais civis se veem sobrecarregados. O órgão que representa a categoria cobra a recomposição urgente dos quadros.

Segundo os dados, a delegacia mais prejudicada em Campinas é a 2ª Seccional, cujo déficit bate os 42%, faltando 119 servidores de segurança. Na 1ª Seccional a defasagem é de 17%, com 71 cargos vagos. Além de Campinas, a 1ª Seccional é responsável por atender Valinhos, Vinhedo e Paulínia.

As principais ausências na 2ª Seccional são de delegados, investigadores, escrivães, agentes policiais, papiloscopistas e auxiliares de papiloscopistas. São 17 delegados, sendo que a lei prevê 24, 46 escrivães, tendo autorização para 70 profissionais, 55 investigadores, quando poderia haver 102, 30 agentes policiais em um quadro cujo teto é de 56. Ainda há apenas papiloscopista, sendo cinco o número coeso, e são dois auxiliares, mas com autorização para ter até oito. A 2ª Seccional, além da metrópole, atua em Indaiatuba.

A presidente do Sindpesp, Jacqueline Valadares, que também é delegada, explica o cenário da força de trabalho da Polícia Civil. “Esse cenário acaba se agravando em algumas regiões. É impossível que a equipe que esteja trabalhando nesse local, por mais que se empenhe, consiga entregar a mesma produtividade que ela entregaria se tivesse com seus quadros completos e devidamente compostos. Um déficit grande, como o que nós temos hoje, sem dúvida impacta diretamente a prestação de serviço de segurança pública. A Polícia Civil é a responsável pela realização das investigações, pelo esclarecimento dos crimes, pelo policiamento repressivo. Esse tipo de situação, que vem sendo verificado no Estado nos últimos anos, é um déficit que se acumula pela falta de autorização de concurso por parte dos últimos governadores. Isso, sem dúvida, culminou no quadro drástico atual”, avalia. “Não se pode falar em segurança pública sem a Polícia Civil. É extremamente importante que a reposição dos quadros seja feita de forma urgente. Nossos profissionais estão sobrecarregados, acumulam três, quatro cidades, trabalham em turnos de 24 horas. Por vezes, eles ficam o mês inteiro aos finais de semana de sobreaviso respondendo por outras cidades. Eles precisam de condições mais adequadas.”

RMC

Outro déficit que chama atenção na Região Metropolitana de Campinas (RMC) é o constatado na Delegacia Seccional de Americana, que está com uma defasagem de 61%. O posto de Polícia Civil atende Americana, Santa Bárbara d’Oeste, Nova Odessa, Sumaré, Hortolândia, Monte Mor, Artur Nogueira, Cosmópolis e Engenheiro Coelho.

Na Seccional de Americana, que teria de ter 548 profissionais, são 212 policiais civis em atividade. A defasagem atinge seu ápice em cargos como o de delegado, com apenas 26 profissionais ocupando cargos previstos para 58, e escrivão, onde 55 estão em serviço, mas a demanda prevê 136 profissionais nos plantões. Os dados são de novembro de 2023, informou o sindicato.

17,1 MIL AUSÊNCIAS

A Polícia Civil de São Paulo iniciou 2024 com déficit de 17.131 profissionais. Dos 41.912 cargos previstos, e que deveriam estar preenchidos, 24.781 estão ocupados – um “buraco” de 40%. Somente no último ano, a instituição sofreu 964 baixas, entre exonerações, aposentadorias e óbitos, segundo o sindicato.

No último dia 8 de janeiro, a Delegacia Geral de Polícia Civil publicou no Diário Oficial a convocação para apresentação de documentos e de exame médico de 368 candidatos aprovados no concurso para delegado de Polícia de 2022. A presidente do Sindpesp defende a nomeação imediata de todos os aprovados.

“Esperamos que todos sejam nomeados, inclusive os candidatos excedentes, e numa única chamada, tendo em vista o alto déficit que temos, hoje, na Polícia Civil. Não faz sentido deixar de efetivar todos esses profissionais ou postergar a nomeação. Estamos com 17 mil policiais a menos e que deveriam estar em serviço. É um absurdo”, diz a delegada.

Em dezembro de 2023, do total de 3.463 cargos para delegados de Polícia no Estado de São Paulo, 2.452 estavam ocupados e outros 1.011 vagos. Além disso, são 4.049 escrivães a menos de um total de 8.912 cargos previstos. Faltam, também, 4.288 investigadores, quando deveriam ser 11.957 na ativa, assim como acontece com outros cargos. Os números constam no Defasômetro, instrumento com o qual o sindicato monitora a movimentação de recursos humanos na instituição, seja por aposentadoria, por morte, ou por exoneração.

Jacqueline lembra que a defasagem é prejudicial, sobretudo porque sem a Polícia Civil bem aparelhada, não há investigação, e sem investigação não há sanção para o crime cometido.

“O quadro reduzido afeta a força de trabalho, compromete o rendimento e sobrecarrega as equipes que estão na ativa, que, por sua vez, sofrem com o estresse e têm a saúde mental abalada. Contratações, portanto, são urgentes e necessárias para aliviar o peso sobre quem está em serviço e, consequentemente, melhorar a segurança”, afirma.

Salário baixo em relação a outros estados afugenta profissionais

Abaixa remuneração, como também destaca a delegada Jacqueline Valadares, é um dos fatores que agrava o atual déficit na Polícia Civil. “Melhores salários atraem novos profissionais e incentivam os já concursados a se manterem na carreira, trabalhando com mais dedicação para o esclarecimento e o combate efetivo à criminalidade - e sem que a pessoa precise buscar outras fontes de renda, bicos e extras, arriscando, muitas vezes, a vida, e prejudicando os horários de descanso”, alerta a delegada. Apesar do acréscimo médio de 18% no holerite da Polícia Civil, autorizado pelo Estado no segundo semestre de 2023, os delegados de São Paulo começaram 2024 tendo um dos piores salários do país, de acordo com o sindicato.

Em São Paulo, o vencimento para quem está em início de carreira é R$ 15.037 (bruto); no Paraná, R$ 21.087; em Brasília, um delegado ganha R$ 19.745. São Paulo ocupa o 22º lugar entre 26 estados e o Distrito Federal no ranking salarial dos delegados do país.

Estado admite déficit e diz que concursos estão em andamento

ASSP-SP (Secretaria de Segurança Pública de São Paulo) informou que a recomposição e valorização do efetivo policial são prioridades da Pasta, que reconhece o atual déficit da Polícia Civil, que se encontra em 34,6% - divergindo do sindicato - e está “empenhada em implementar uma série de ações para reverter essa situação”. “Neste momento, estão em andamento concursos para preenchimento de mais de 14,7 mil vagas em diversas carreiras, incluindo policiais civis, delegados de polícia, escrivães e investigadores. Essa iniciativa visa fortalecer e revitalizar os quadros, promovendo uma atuação mais eficaz e eficiente no combate à criminalidade. A solução desse desafio ocorrerá de forma gradual, mas a pasta está comprometida com o processo de revitalização do efetivo policial. A SSP permanece atenta às necessidades das polícias, buscando constantemente estratégias e ações que contribuam para a segurança e bem-estar da sociedade.”

Investigador fala da dificuldade em solucionar crimes graves

Um investigador da região que pediu anonimato comentou os reflexos da sobrecarga de trabalho: crimes graves sem a devida investigação e frustração por não conseguir atender a população a contento. “O problema que nós investigadores temos é não conseguir atender a população com dignidade. A a vontade que tenho é pegar dois investigadores e falar: ‘você vai trabalhar neste homicídio até resolver’, mas a gente não consegue. Hoje você está num caso de homicídio, amanhã sai outro caso, e a pessoa deixa o antigo para atender o outro e assim vai. Quem tem compromisso com a Polícia Civil e com a população pensa igual. A gente quer fazer nosso serviço e atender bem a população”, disse. “A pessoa é vítima duas vezes: uma porque é vítima de um delito, um furto, e a segunda porque o Estado não consegue atender ela”, completou o investigador ativo no quadro regional da Polícia Civil.

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