Sexta Turma libertou um traficante por considerar ilegal a revista realizada por GMs
Viatura da GM no Terminal Central: “decisão não diminui o poder da corporação”, afirma Carlos Alexandre Braga (Dominique Torquato)
Uma decisão do Superior Tribunal de Justiça (STJ), no último dia 18, sobre um caso isolado que envolve a atuação da Guarda Municipal (GM) de Itaquaquecetuba, reacendeu o discurso sobre a função das guardas municipais e colocou em xeque a aplicação das leis que asseguram a formação do Sistema Único de Segurança Pública (Susp).
Na ocasião, a Sexta Turma da corte julgou o recurso impetrado por um homem condenado por tráfico de drogas, que foi revistado por guardas municipais, e considerou ilícitas as provas colhidas, anulando a condenação do suspeito, que acabou sendo solto.
Pela decisão, os ministros demonstraram que os agentes não podiam ter feito a revista, uma vez que não poderiam exercer legalmente as atribuições próprias e concernentes às polícias Civil e Militar.
Para a Secretaria de Cooperação nos Assuntos de Segurança Pública de Campinas, a decisão dos ministros é meramente exemplificativa e não taxativa e, consequentemente, a GM pode ser considerada uma força de segurança com todas as prerrogativas da polícia.
Ainda conforme a Pasta, a decisão do STJ não interfere no trabalho da corporação no município, tratando-se de um caso isolado, que não ganhou qualquer repercussão.
“A GM continua no exercício de suas funções, como sempre fez. Nesta semana, por exemplo, os agentes da corporação apreenderam cerca de 40 quilos de entorpecentes”, frisou a Secretaria de Segurança Pública de Campinas, por meio de nota.
Embora seja um caso específico, o relator da ação, ministro Rogério Schietti Cruz, destacou em seu discurso que seria importante definir um entendimento da corte sobre o assunto, tendo em vista “o quadro atual de expansão e militarização dessas corporações”.
O colegiado entendeu que atuação da Guarda Municipal deve se limitar à proteção de bens, serviços e instalações do município, o que já está estabelecido na Constituição, e que somente lhe cabe realizar a abordagem de pessoas e revista quando a ação se mostrar diretamente relacionada à finalidade da corporação.
“É um absurdo a posição dos ministros. Eles nem mesmo mencionaram ou consultaram as duas leis vigentes que tratam da formação da guarda e a criação do Sistema Único de Segurança Pública (Susp), que foi instituído pela Lei Nº 13,675, no dia 11 de junho de 2018. Se tivessem conhecimento, saberiam que a Guarda Municipal nacional obedece todos os requisitos legais e estão preparadas para proteger os bens públicos. E o que são esses bens públicos mencionados? A rua, por exemplo, é um bem público. Está lá, no artigo 99 do Código Civil. Rua não quer dizer asfalto, mas sim as pessoas que circulam por ela. Ou seja, os cidadãos são bens públicos. Os guardas também devem zelar e protegê-los”, afirmou o presidente do Conselho Nacional das Guardas Municipais, Carlos Alexandre Braga.
“Essa decisão não diminui o poder das corporações municipais. Entretanto, as defesas daquelas pessoas envolvidas em crimes podem usar a decisão - de que não podem ser revistadas por guardas - para recorrer das condenações. A guarda vai continuar sim atuando como sempre atuou!”, garante Braga.
As leis citadas por Braga integram o Estatuto Geral das Guardas (1322/14), que menciona, entre outros, sobre o uso de armas, exame psicológico, treinamento obrigatório e o dever de prender em flagrante, além do patrulhamento preventivo, segundo o presidente das guardas. Também a Susp 13675/18, a qual cita que a GM faz parte das Forças de Segurança Pública.
O Conselho Nacional das Guardas Municipais emitiu uma nota, na qual explica a função da corporação e, ainda, entrou com um mandado de segurança, com pedido de liminar, junto ao STJ, contra a Sexta Turma.
A iniciativa jurídica visa a evitar que o GM e Poder Público sejam punidos, enquato o traficante fica em liberdade.
“Se prende, é ilegal. Alguém tem que dar um basta nisso. O Brasil tem 120 mil GMs que contribuem com a segurança pública. Somente em São Paulo, são 35 mil deles, que representam cerca de 30% da polícia preventiva”, destacou Braga.
Polícia Municipal
Artur Nogueira foi uma das primeiras cidades da Região Metropolitana de Campinas (RMC) a usar no nome da corporação o termo ‘Polícia Municipal’. “A decisão refere-se a um caso concreto e não a todas as situações semelhantes, o que, se for o caso, serão submetidas a julgamento uma a uma, oportunamente”, disse o secretário de Segurança, Trânsito e Defesa Civil, da cidade, Roberto José Daher.
Apesar da defesa das Pastas municipais de segurança e do Conselho Nacional das Guardas Municipais de que as GMs têm poder de “polícia ostensiva”, a psicóloga forense, Maria de Fátima Franco dos Santos, apoia a decisão da Sexta Turma e justifica que a Guarda Municipal foi criada com o propósito de preservar o patrimônio público e isso acaba não acontecendo, tendo em vista que a corporação cumpre uma função que é da Polícia Militar (PM). “Os governos estaduais deixaram faltar recursos humanos e os municípios, diante da população à mercê dos crimes, começaram a dar poder de polícia à GM, a fim de suprir a deficiência. Isso é desvio de função, porque o Estado se omite frente às suas obrigações. O patrimônio público, que inclui o fato de um cidadão jogar lixo em vias públicas e não ser punido, é ignorado por causa desse desvio”, conclui.