Suspeita é a de que marido tenha se matado após assassinar a esposa de mais de duas décadas
Familiares da vítima se abraçam em frente à residência onde marido e mulher foram encontrados mortos (Alessandro Torres)
Duas pessoas foram encontradas mortas no início da tarde de segunda-feira (22), no Jardim Santo Antônio em Campinas em um caso registrado como feminicídio seguido de morte suspeita, com hipótese de suicídio. É o quinto feminicídio em Campinas em 2023. Os corpos de uma mulher de 43 anos, F.A.G., e de um homem de 48 anos, E.M., foram encontrados sem vida e com ferimentos de arma branca. A suspeita é a de que E.M. tenha se matado após assassinar a companheira de mais de duas décadas. Um martelo, uma faca e aparelhos celulares foram apreendidos na residência. A ocorrência foi registrada no 9º Distrito Policial de Campinas. Pessoas da família da vítima confirmaram ao Correio Popular que ela sofria agressões constantes e, por isso, entrou com uma medida protetiva há pouco tempo, tendo passado um período fora da cidade. Entretanto, ela estaria considerando os apelos para que o relacionamento fosse retomado. A família contou que um dia antes do crime, no domingo, o homem teria tentado o suicídio. Relatos de quem conhecia o casal apontam que, além das agressões, o homem já havia ameaçado fazer o que concretizou na manhã de segunda-feira, porém as pessoas próximas não acreditavam que ele seria capaz de assassinar a mulher.
A doutoranda em Saúde Coletiva na área de Epidemiologia de Mortes Violentas pela Faculdade de Ciências Médicas da Unicamp, Thamiris Gomes Smania, pesquisa desde 2019 os casos de feminicídio. Em seu dia a dia, ela conversa com pessoas das famílias das mulheres vítimas para tentar entender todo o contexto de violência anterior ao crime. Ela contou que é frequente ouvir que as pessoas próximas à vítima ou ao autor não acreditavam que a violência se agravaria a ponto de ocorrer um feminicídio. Este mesmo pensamento ocorreu em várias das mulheres que foram vitimadas.
"Essas mulheres sofrem com a violência e às vezes não percebem que ela pode se agravar para o feminicídio. Elas duvidam das ameaças que o agressor faz, às vezes porque tem um filho, porque acha que ele não será capaz de fazer isso por conta dele. Acreditam que vai ficar apenas na ameaça."
Mesmo com o avanço das políticas voltadas à proteção das mulheres, e uma maior, embora ainda insuficiente, conscientização sobre o tema na sociedade, a média neste ano em Campinas é de um feminicídio por mês, cinco em 2023. Foram sete em 2022, cinco em 2021 e sete em 2020.
Thamiris pontuou que a sociedade ainda é extremamente machista e que a violência se intensifica a partir do momento em que uma mulher tenta romper com uma situação de violência ou mesmo com estereótipos de gênero, com a forma esperada de comportamento.
"Às vezes falamos do feminicídio apenas quando ele acontece, mas é importante falar das outras formas de violência que são sinais de alerta para uma violência letal. A gente também viu que houve um aumento nos atendimentos do Centro Especializado de Atendimento à Mulher de Campinas (Ceamo) aqui em Campinas, então, para mim, é um alerta. Podemos pensar tanto que a violência em Campinas está aumentando e as mulheres procurando mais os serviços como que o serviço está ficando mais conhecido. Temos que ter mais divulgação para que essas mulheres consigam acessá-lo - e não apenas nos bairros ricos de Campinas, mas em todo o território."
A Lei Maria da Penha enumera cinco tipos de violência doméstica: física, psicológica, sexual, moral e patrimonial. O Ceamo registrou 749 casos de violência doméstica somente entre os meses de janeiro a abril deste ano, ou seja, uma média de 187 atendimentos por mês. A explosão de casos de violência de gênero é evidente, já que nos primeiros quatro meses de 2019 foram 152 registros, com 38 acolhimentos por mês, um aumento de incríveis 392,76% nos últimos cinco anos. O Ceamo está localizado na Avenida Francisco Glicério, 1269, 6º andar, Centro. O horário de Atendimento é das 8h às 19h (de segunda a sexta-feira). Para entrar em contato por telefone os números são: (19) 3236-3619 / 0800 777 1050. O e-mail, ceamo@campinas.sp.gov.br.
A doutoranda explicou que, além de a vítima de violência registrar boletim de ocorrência e buscar medidas protetivas, é importante que o poder público ofereça assistência psicológica e financeira, uma vez que realizar a denúncia faz com que ela esteja mais exposta. Para as pessoas que estão presas em um ciclo de violência, ou que conhecem alguém que esteja nesta situação, o ideal é romper com esse contínuo de violência, pois o que começa com pequenas agressões pode se agravar para o crime de feminicídio.