CONQUISTANDO ESPAÇOS

A luta diária das mulheres por respeito na carreira policial

Delegadas e investigadoras ocupam cargos de chefia unindo competência, autoridade e feminilidade

Alenita Ramirez/ [email protected]
08/03/2024 às 09:23.
Atualizado em 08/03/2024 às 09:23
Graduada em Direito pela PUC-Campinas, Estela Beraquet ingressou na PF em 2009 (Rodrigo Zanotto)

Graduada em Direito pela PUC-Campinas, Estela Beraquet ingressou na PF em 2009 (Rodrigo Zanotto)

As mulheres policiais estão continuamente superando desafios em sua jornada rumo à igualdade de gênero. Mesmo em um ambiente tradicionalmente dominado por homens, elas têm demonstrado resiliência e determinação ao quebrar barreiras culturais. Hoje, não apenas ocupam cargos administrativos, mas também assumem posições de delegadas, líderes de equipe e gestoras. É importante ressaltar que sua feminilidade não é suprimida pelo uniforme; ao contrário, muitas mantêm-se cuidadas, maquiadas e elegantemente vestidas, sem que isso comprometa sua autoridade.

Com suas habilidades de comunicação, técnicas persuasivas e a empatia maternal, as mulheres conquistaram um espaço significativo no segmento policial. Em média, aproximadamente 20% do corpo funcional das diferentes corporações, como a Polícia Federal, Militar, Civil e Guarda Municipal, é composto por mulheres.

Por exemplo, na Polícia Federal (PF), dos 13 mil profissionais em todo o Brasil, incluindo delegados, agentes, escrivãs, peritos e papiloscopistas, 1.824 são mulheres, das quais 302 ocupam o cargo de delegadas, em um total de 1.967 delegados.

Dos 18 delegados que compõem a equipe da Polícia Federal em Campinas, a doutora Estela Beraquet é a única mulher. Ela lidera um grupo de nove agentes federais, incluindo uma escrivã, todos os demais sendo homens.

Graduada em Direito pela PUC-Campinas, Estela ingressou na PF em 2009, inicialmente lotada na unidade de Belém, no estado do Pará, onde permaneceu por três anos antes de ser transferida para Campinas. "Nos meus 15 anos na PF, tenho testemunhado um aumento significativo na representação feminina", destaca Estela, que iniciou sua carreira na área de crimes cibernéticos e há 13 anos lidera uma equipe em Campinas dedicada ao combate ao abuso sexual infantil. "É preciso coragem para assumir o papel de policial, pois muitas vezes é erroneamente associado apenas ao uso da força, o que não é verdade. Em muitas situações, a presença de uma mulher pode ser apaziguadora", defende.

Para a delegada, cujo amor pela profissão foi inspirado pelo irmão mais velho, também delegado da PF, e que aceitou o desafio de enfrentar um crime que muitos homens repudiam, o início de sua carreira foi marcado por obstáculos. Um deles foi quando um preso se recusou a ser interrogado por ela. "Como policial, já enfrentei alguns episódios de preconceito, mesmo fora da corporação. Quando trabalhava como delegada no Norte, houve um caso em que um preso se recusou a falar comigo simplesmente por eu ser mulher, e precisei chamar um colega para conduzir o interrogatório", relata.

As delegadas Ana Carolina Bacchi e Isabella Sguerra Vita (à esquerda) preparam materiais informativos sobre a Lei Maria da Penha (Rodrigo Zanotto)

As delegadas Ana Carolina Bacchi e Isabella Sguerra Vita (à esquerda) preparam materiais informativos sobre a Lei Maria da Penha (Rodrigo Zanotto)

DDM

Duas outras mulheres que estão à frente de unidades especializadas da polícia são as delegadas Ana Carolina Bacchi e Isabella Sguerra Vita, respectivamente da 1ª e 2ª Delegacia de Defesa da Mulher (DDM). Elas fazem parte de um quadro de 119 mulheres da Polícia Civil em Campinas.

Ana Carolina entrou para a corporação em 2004 e em 2011 começou a trabalhar na unidade especializada. Há três anos ela é titular da 1ª DDM, onde comanda uma equipe de 13 policiais, que são responsáveis pela movimentação de cerca de 2.500 procedimentos em andamento e outros 150 novos inquéritos policiais instaurados por mês. 

Assim como Estela, Ana Carolina também enfrentou preconceito no começo da carreira por ser mulher. "Sempre é um desafio ser mulher policial porque, na verdade, a gente trabalha numa instituição que é predominantemente masculina. Quando comecei a carreira no Decap (Departamento de Polícia Judiciária da Capital) as pessoas achavam que eu era estagiária. Além de ser nova e mulher, eu não era vista como uma pessoa que tinha um cargo de chefia. A mulher tem sempre que mostrar sua competência, ao contrário dos delegados, por exemplo", defende.

Para a delegada Isabela, que escolheu a carreira admirando o pai, que foi delegado em Araraquara, Carlos Alberto Vita, e está há 26 anos na Polícia Civil, defende que a vida profissional de um delegado de polícia, apesar de ser muito sacrificante, é fascinante. Para ela é difícil separar e também conciliar a vida pessoal com as atribuições inerentes ao cargo de delegado, ainda mais quando se trabalha no interior, onde o profissional atua mais próximo da sociedade, trabalhando em público. "Quando se trata de uma mulher, se torna ainda mais frenético, pois além do trabalho, tem casa para zelar, jornada tripla. Ainda no mundo de hoje, lamentavelmente, a mulher passa por 'provas de fogo' para se nivelar a um homem da sua mesma profissão", defende. 

Isabella comandava o 3° Distrito Policial de Campinas, onde atuou por três anos e recentemente retornou ao trabalho em prol da defesa das mulheres vitimadas no comando da 2ª DDM, que abriga o Plantão 24 horas da DDM. 

Ela chefia uma equipe que produz uma média de 200 inquéritos policiais eletrônicos, 300 boletins de ocorrência e 350 solicitações de medidas protetivas por mês. "O delegado de polícia possuí a chave que abre o portal da repressão criminal do investigado no sistema de Justiça criminal. A equipe é pequena se comparada ao desafio que nos é imposto, mas que se sobressai pela experiência profissional e dedicação na defesa das mulheres vitimadas", frisou.

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