TECNOLOGIA REVOLUCIONÁRIA

Unicamp e USP lançam apps para detectar doenças graves

Ferramentas aceleram diagnóstico de enfermidades como o infarto e depressão

Edimarcio A. Monteiro/[email protected]
24/09/2024 às 10:05.
Atualizado em 24/09/2024 às 10:45
O químico da Unicamp, Lucas Felipe de Lima, desenvolveu um conjunto de sensores portáteis para detectar diversas doenças a partir de biossensores - como anticorpos, enzimas e materiais genéticos - presentes na saliva ou suor, sem a necessidade de exames laboratoriais (Antonio Scarpinetti/Unicamp)

O químico da Unicamp, Lucas Felipe de Lima, desenvolveu um conjunto de sensores portáteis para detectar diversas doenças a partir de biossensores - como anticorpos, enzimas e materiais genéticos - presentes na saliva ou suor, sem a necessidade de exames laboratoriais (Antonio Scarpinetti/Unicamp)

Novos aplicativos para celulares e tablets ajudam a detectar doenças graves que afetam a população brasileira, como depressão e infarto. Eles foram desenvolvidos separadamente por pesquisadores das universidades de São Paulo (USP) e Estadual de Campinas (Unicamp) e buscam facilitar e tornar mais rápido os diagnósticos dos pacientes, salvando vidas.

O primeiro deles, batizado de Controle Emocional (Conemo), foi lançado e já está em uso em duas Unidades Básicas de Saúde (UBSs) de Indaiatuba, no Parque Campo Lindo e Jardim João Pioli. A proposta é disponibilizá-lo futuramente para outras unidades de saúde da cidade. A ferramenta visa ampliar o acesso da população ao tratamento de doenças como depressão, ansiedade e insônia, sendo desenvolvida por pesquisadores do Centro Nacional de Ciência e Inovação em Saúde Mental (Cism), da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (FM-USP).

Apenas a depressão atinge 15,5% da população brasileira ao longo da vida, isoladamente ou associada a um transtorno físico, segundo estudo epidemiológico de prevalência do Ministério da Saúde. A taxa no país é superior à média mundial, que é de 10,4%, de acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS).

O objetivo do Conemo é "ampliar o acesso de pessoas com doenças crônicas e sintomas de depressão a algum tipo de cuidado que possa melhorar suas vidas sem precisar recorrer diretamente a especialistas, psicólogos ou psiquiatras", explicou o responsável pelo projeto, o professor de Medicina Preventiva da FM-USP, Paulo Rossi Menezes. O aplicativo sugere atividades para melhorar a qualidade de vida e saúde, como manter contato social com familiares e amigos e praticar hobbies para aliviar o estresse. A ferramenta entrega uma intervenção de psicoterapia cognitivo-comportamental, com jornadas de sessões e vídeos voltados ao tratamento de cada um desses sintomas, e sugere atividades, dicas e estratégias que visam melhorar a saúde dos usuários.

RESULTADO

Durante a fase de testes, a ferramenta inédita reduziu em 50% os sintomas de depressão leve em pessoas com hipertensão e diabetes. A pesquisa foi desenvolvida com 420 pessoas da cidade de São Paulo e de Lima, no Peru. "A ideia é que, na medida em que o indivíduo faça algo mais simples e perceba que consegue fazer, ele fique mais animado e passe a ter mais motivação e energia para continuar no processo", disse o pesquisador.

Segundo ele, a tecnologia atinge de 70% a 80% das pessoas acometidas por essas doenças que não chegam aos serviços de saúde para cuidar da saúde mental. O Conemo está disponível para os interessados em usá-lo. Eles devem procurar uma das UBSs para escanear o QR Code do aplicativo. Em seguida, deverão preencher um formulário on-line e questionários para verificar se a pessoa está dentro dos parâmetros exigidos. Em caso positivo, imediatamente será disponibilizado um botão para baixar o aplicativo. Pacientes das unidades básicas de saúde também poderão ser indicados pelos profissionais para o uso da ferramenta. São pré-requisitos para o acesso: ter 18 anos ou mais; sintomas significativos de ansiedade, insônia ou depressão; não apresentar risco de suicídio moderadamente alto ou alto; e estar apto a ler as instruções do aplicativo por um smartphone ou tablet.

O aplicativo se baseia na ativação comportamental para pessoas acometidas por ansiedade, depressão e insônia, a fim de auxiliálas a diminuir esses sintomas. O Conemo faz parte de um projeto conduzido por psicólogos, médicos, enfermeiros e pesquisadores com experiência em estudos semelhantes. Há fatores de risco para a depressão, como histórico familiar, transtornos psiquiátricos correlatos, ansiedade crônica, traumas psicológicos, conflitos conjugais, mudança brusca de condição financeira, desemprego e dependência de álcool e drogas ilícitas.

SEM EXAME LABORATORIAL

Já o químico Lucas Felipe de Lima desenvolveu, durante seu doutorado na Unicamp, um conjunto de sensores portáteis para detectar diversas doenças a partir de biossensores - como anticorpos, enzimas e materiais genéticos - presentes na saliva ou suor, sem a necessidade de exames laboratoriais, entre eles infarto agudo do miocárdio, covid-19, mpox e herpes. O kit é formado por um app para celular, tablet ou computador, um potenciostato (equipamento eletrônico do tamanho de um pen drive) e uma fita de teste de 1 centímetro por 1,5 centímetro.

O fluido biológico é colocado sobre a fita e gera uma resposta eletroquímica mensurada pelo dispositivo, que mede o sinal elétrico, acoplado ao smartphone. No caso do infarto, o exame é feito por meio da detecção da enzima creatina quinase, cuja concentração aumenta no organismo humano durante esses episódios. Segundo o Ministério da Saúde, o ataque cardíaco é a maior causa de mortes no país. Estima-se que, no Brasil, ocorram de 300 mil a 400 mil casos anuais de infarto e que, a cada 5 a 7 casos, ocorra um óbito. Para diminuir o risco de morte, o atendimento de urgência e emergência, nos primeiros minutos, é fundamental para salvar uma vida.

"No pré-infarto há uma série de sinais como formigamento no braço esquerdo, falta de ar e dor no peito que podem ser indicativos para a realização do exame. A ideia é usar essa tecnologia para diagnosticar a condição tanto em seus estágios iniciais quanto em pacientes que já estão passando pelo infarto propriamente dito", esclarece o pesquisador. A nova tecnologia dá o resultado em 5 minutos e pretende agilizar a tomada de decisão por parte de médicos, tornando mais efetivo o manejo de condições relevantes para a saúde pública. 

De acordo com Lucas Lima, o teste tem uma precisão no resultado de 96%, taxa próxima dos 99% dos exames laboratoriais mais sofisticados, complexos e completos usados atualmente. Além disso, o exame no ponto de atendimento (PoC, na sigla em inglês) tem um custo mais baixo, dá o resultado mais rápido e é mais prático de ser utilizado. "No caso de uma área remota, por exemplo, como uma tribo indígena na selva, o profissional faz o teste na hora, com o celular que tem no bolso ou com um tablet, sem a necessidade de ter que colher o material e enviar de avião para um laboratório, onde o resultado pode levar dias para ficar pronto", explicou o pesquisador.

CHEGAR AO MERCADO

O teste de covid-19, acrescentou, foi desenvolvido em 2021, em plena pandemia, quando fez parte do doutorado na Faculdade de Medicina da Universidade da Pensilvânia (EUA), onde o exame começou a ser comercializado rapidamente. Além disso, foi usado em outros países, como Nicarágua e Dubai. De volta ao Brasil, desenvolveu a tecnologia e obteve a patente para diagnóstico de outras doenças, mas não há previsão de quando chegará ao mercado. Sem a pressão de uma pandemia que saturou os serviços de saúde, é preciso avançar com as pesquisas para dar mais estabilidade ao exame e reduzir os custos.

A proposta é que o teste com o uso do kit para smartphone não se torne um exame doméstico, mas seja disponibilizado para médicos, farmacêuticos e laboratórios. O químico Lucas Lima trabalha como pós-doutorando no Instituto de Química da Unicamp, onde continua a desenvolver biossensores eletroquímicos, agora para doenças como leucemia, H1N1, dengue, zika e chikungunya, com o apoio de outros alunos do laboratório. Seu objetivo é obter parâmetros para tornar esses testes cada vez mais robustos, possibilitando sua inserção futura no Sistema Único de Saúde (SUS).

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