SAÚDE

Projeto inédito prevê UBS em modelo de ‘escola padrão’

Parceria é da Prefeitura de Campinas com a Faculdade de Ciências Médicas da Unicamp

Israel Moreira/ [email protected]
04/06/2023 às 10:25.
Atualizado em 04/06/2023 às 10:25
Faculdade de Ciências Médicas (FCM) da Unicamp conta com programa de residência médica no Hospital das Clínicas, no Centro de Atenção à Saúde da Mulher (Caism), no Hemocentro e no Hospital Estadual de Sumaré (Alessandro Torres)

Faculdade de Ciências Médicas (FCM) da Unicamp conta com programa de residência médica no Hospital das Clínicas, no Centro de Atenção à Saúde da Mulher (Caism), no Hemocentro e no Hospital Estadual de Sumaré (Alessandro Torres)

Precursora nos debates iniciais do surgimento do Sistema Único de Saúde no Brasil (SUS), a Faculdade de Ciências Médicas da Unicamp (FCM), que comemorou 60 anos em maio, anunciou a criação de um projeto inédito em parceria com a Prefeitura de Campinas referente a construção de uma Unidade Básica de Saúde (UBS) no Jardim Flamboyant, que terá o modelo de “escola padrão”, no qual professores, pesquisadores e alunos do curso de graduação da FCM atuarão de forma integrada.

O diretor da FCM, professor Claudio Coy, reafirma a responsabilidade da instituição de atuar em benefício da saúde pública de Campinas e região, a partir das características e investimentos atuais relacionados às áreas de graduação, pós-graduação e pesquisa. “A graduação possui hoje 800 alunos e 1400 matriculados nos cursos de especialização. Contamos com programa de residência médica no Hospital das Clínicas, no Centro de Atenção à Saúde da Mulher (Caism), no Hemocentro e no Hospital Estadual de Sumaré. Ou seja, a prioridade na formação da faculdade é retribuir o investimento feito no ensino e na pesquisa para a população”, assegura Coy.

A despeito dos bons resultados obtidos pela FCM ao longo das últimas seis décadas, o médico afirma que ainda há muito que se fazer e desafios a superar. “Institucionalmente, nosso desafio para o futuro é manter a qualidade do ensino e continuar a valorizar o corpo docente. Temos aqui os cursos de Medicina e de Fonoaudiologia, com professores da mais alta qualidade, mesmo enfrentando uma reestruturação que provocou a diminuição do quadro recentemente. Há projetos futuros, como a criação de uma UBS em parceria com a Prefeitura, que funcionará no modelo “escola padrão”, algo inédito até aqui”, revela Coy.

SUS

Para Gastão Wagner de Sousa Campos, professor titular de Saúde Coletiva da FCM, a faculdade teve um papel importante nas discussões iniciais do SUS. Ele destaca a participação dos professores Sergio Arouca e Nelson Rodrigues dos Santos, que também foi secretário de Saúde em Campinas. “A extensa folha de serviços prestados a Campinas e ao Brasil pela FCM justifica os investimentos públicos em pesquisa e na ciência, pois eles retornam na forma de benefícios para a população”, destaca Campos, que também foi secretário municipal de saúde nos anos de 1991-1992 e 2001-2002.

“A atuação do professor Nelson, na atenção à saúde primária, foi muito importante. As ações envolveram a criação dos centros de saúde, a implantação do serviço de medicina comunitária e, principalmente, a interação das propostas que envolveram a própria Unicamp, por meio da FCM; o Ministério da Saúde, através do Instituto Nacional de Assistência Médica da Previdência (Inamps); e Pontifícia Universidade Católica de Campinas”, enumera.

O jornalista e escritor José Pedro Soares Martins, autor de vários livros publicados na área da saúde, destaca o pioneirismo de Campinas nas discussões antecessoras ao surgimento do SUS. “A Faculdade de Ciências Médicas da Unicamp tem um papel central no processo de construção do SUS. Um nome fundamental é o de Sérgio Arouca, originário da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto, que foi convidado a integrar o quadro docente da FCM logo em seus primeiros anos. Arouca se tornou coordenador do Laboratório de Ensino de Medicina Comunitária (LEMC), que impulsionou a participação de alunos da FCM em projetos nos bairros Parque Brasília, Vila Costa e Silva e Vila Rica”, relembra Martins.

“O trabalho de saúde comunitária prosseguiu, e parte do grupo de professores e alunos ligados ao LEMC acabou se integrando ao governo do prefeito Francisco Amaral, eleito em 1976 pelo MDB, de oposição ao regime militar. O então secretário municipal de Saúde, Sebastião de Moraes, se tornou um entusiasta da saúde comunitária e os projetos com alunos, novos médicos formados e professores da Unicamp se transformaram nos primeiros centros de saúde no município. Essa experiência de Campinas, e outras cidades como Niterói e Londrina na mesma época, são consideradas precursoras do que preconiza o SUS, em termos de garantia de saúde para todos”, explica.

Diretor da FCM em 1971-72 e 1976-80, José Aristodemo Pinotti é outro nome de destaque na trajetória de construção do SUS. Como secretário estadual de Saúde, entre 1987 e 1991, foi pioneiro na institucionalização do Sistema Unificado e Descentralizado de Saúde (SUDS), antecessor do SUS. Pinotti apoiou os movimentos então realizados na Assembleia Nacional Constituinte, de 1987-88, que levaram finalmente à inclusão do SUS na Constituição.

FUNDAÇÃO

Mesmo antes do surgimento da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), a Faculdade de Ciências Médicas já iniciava os seus trabalhos na cidade. Fundada em 20 de maio de 1963, a escola médica carrega em sua história a virtude de ter a participação da formação de destacados nomes na área da saúde pública e privada no Brasil.

Um debate iniciado duas décadas antes contou com a mobilização de políticos, intelectuais, imprensa e a sociedade campineira. O movimento culminou com a promulgação, em 24 de setembro de 1948, da lei estadual 161, que tratava da criação de instituições de ensino superior em locais no interior do Estado de São Paulo. Nesse cenário, Campinas conseguiu a instalação de uma Faculdade de Medicina, através de outra lei, de número 2.154, de 1953 (posteriormente recriada através da Lei 4.996 de 1958).

Mesmo após todas essas conquistas, ainda assim o processo de instalação precisou passar por uma enorme mobilização de entidades da cidade, entre elas a Sociedade de Medicina e Cirurgia, o Instituto Penido Burnier, a Arquidiocese de Campinas, entre outras instituições. Esse movimento conseguiu, em 1962, a promulgação de mais uma lei, a 7.655, que garantia a criação da Faculdade de Medicina, incorporada pela Unicamp.

Pouco depois da aula inaugural, em 1963, a FCM passou a funcionar no antigo prédio da Maternidade de Campinas, onde ficou por um ano. Em 1965, a FCM transferiu-se para o prédio da Irmandade de Misericórdia de Campinas. Após essa mudança de endereço, a Unicamp assinou um contrato oficializando a participação com a Santa Casa de Misericórdia no custeio do atendimento médico-hospitalar dos pacientes que procuravam a Santa Casa para tratamento de suas doenças.

Formado na oitava turma do curso em 1975, o ex-secretário estadual e municipal de Saúde, o médico hematologista Carmino Antonio de Souza, que é docente da FCM desde 1979, relembra com muito carinho toda a sua trajetória vinculada à faculdade. “Como estudante, comecei em 1970. Entre a formatura, residência e me tornar professor, foram nove anos. A partir de 1979, minha trajetória como docente inicia-se paralelamente com a construção do Hospital das Clínicas da Unicamp. Na década de 1980, tivemos um trabalho importantíssimo com a criação do Centro de Hematologia e Hemoterapia, o Hemocentro, culminando com a explosão no Brasil dos casos de transmissão do vírus HIV (Aids)”, relata.

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