CAMPINAS

Retirada de água por indústrias é 62% maior do que para abastecimento

Entretanto, legislação atual determina que o abastecimento humano deve ter prioridade sobre outras atividades, como empresas e agricultura

Cecília Polycarpo
11/05/2015 às 05:00.
Atualizado em 23/04/2022 às 14:07
Junção entre o Rio Atibaia e o Ribeirão Anhumas, de onde a Rhodia capta água, utilizada principalmente para resfriar torres de refrigeração (Elcio Alves)

Junção entre o Rio Atibaia e o Ribeirão Anhumas, de onde a Rhodia capta água, utilizada principalmente para resfriar torres de refrigeração (Elcio Alves)

O governo do Estado procura formas de aperfeiçoar as regras para obtenção de licenças para captação de água nos rios que abastecem o Sistema Cantareira, para equilibrar o fornecimento entre residências, indústrias e agricultura. Grandes companhias estão entres as maiores captadoras de água dos mananciais e da bacia dos rios Piracicaba, Jundiaí e Capivari (PCJ). A soma das outorgas para captar água de oito empresas do Interior é 62% maior que a captação de Campinas, que tem 1,1 milhão de habitantes.Levantamento feito pelo Departamento de Águas e Energia Elétrica (Daee) mostrou que a Rhodia, a União São Paulo, a Replan, a Suzano Papel e Celulose, a Usina Santa Cruz, a Raízen, a Usina Ester a Ajinomoto tem autorização para retirar, juntas, 8,3 metros cúbicos por segundo. Já Campinas, tem outorgas para captar 5,1m3/s. Duas das indústrias citadas, Usina Santa Cruz e União São Paulo, estão fechadas, mas as outorgas continuam valendo.O Daee alega que as outorgas não interferem no abastecimento de Campinas e que muitas empresas devolvem parte da água retirada. No entanto, o período de estiagem preocupa o governo estadual e municípios. A legislação atual determina que o abastecimento humano deve ter prioridade sobre outras atividades, como a indústria e agricultura. E desde o início da crise hídrica, no ano passado, o departamento adotou medidas restritivas a outorgas.A primeira delas, foi a suspensão de novas emissões de outorgas para a perfuração de poços rasos na região da Bacia do PCJ e Alto Tietê, enquanto os reservatórios e mananciais não atingirem níveis seguros de água. Mas a mais importante foi a diminuição de captação em caso da redução da vazão dos rios Camanducaia, Jaguari, Atibaia, Cachoeira, Atibainha e afluentes, em caso de diminuição de vazão. Na última semana, o Alto Atibaia e o Camanducaia estavam em estado de alerta, que não impede o uso da água, mas chama a atenção dos usuários para a proximidade de uma restrição. Já o estado de restrição determina que para abastecimento público e para matar a sede de animais, a redução é de 20% do volume diário outorgado. Para uso industrial e irrigação, a diminuição é de 30%.O coordenador de projetos do Consórcio PCJ, José Cezar Saad, afirmou que na bacia onde Campinas está inserida, a indústria é o setor que tem maior peso na captação. Segundo Saad, o Daee tem reavaliado periodicamente métodos e critérios para concessões de outorga. “O Consórcio defende que a primeira finalidade da água deve ser o abastecimento humano. Mas incentivamos, principalmente projetos de reservação de água tratada nas cidades para aumenta da disponibilidade.”Cezar explicou que as outorgas concedidas pelo Daee consideram as circunstâncias futuras, isto é, o volume é calculado para atender o final do período de consumo de uma empresa. No passado, a vazão da concessão era constante durante todo o período, mas hoje o Daee dá prioridade a outorgas progressivas. “São medidas para tentar segurar um pouco o volume concedido. Além disso, a mentalidade de empresas vem mudando. Para elas, não é mais interessante ter uma outorga maior do que elas vão utilizar, pois elas pagam por essa vazão”, concluiu o coordenador.Empresas negamA maior parte das empresas listadas pelo Daee como as grandes captadoras do Cantareira alegaram que não usam integralmente a outorga e que devolvem parte da água tratada aos rios. A empresa de combustível Raízen, por exemplo, conseguiu sua outorga em 2006, em um cenário diferente da crise hídrica atual. “Praticamos dentro da Raízen uma política de uso responsável dos recursos naturais e a captação da unidade em questão é hoje inferior à metade autorizada”, disse a nota oficial da empresa. A companhia informou ainda que investe no aperfeiçoamento de seus processos de produção, o que permite operar com volume reduzido de água.Já a Replan (foto), refinaria da Petrobras de Paulínia, informou que adota ações contínuas para otimizar a captação do Rio Jaguari. O recurso é utilizado para a geração de vapor no resfriamento dos derivados de petróleo e no sistema de combate a incêndio. O efluente, segundo a estatal, é tratado e 25% é reutilizado. Além disso, a empresa começou a implementar o sistema de resfriamento dos produtos de refino com ar.A Ajinomoto, que produz condimento e alimentos em Limeira, informou que a captação no Jaguari sofre variações, mas nunca ultrapassa os limites das outorgas. “Em todas as nossas fábricas realizamos ações para otimizar o consumo de água, de modo que a nossa captação não ultrapasse 50% do permitido”, diz a nota oficial da empresa.Entre as empresas no ranking do Daee, a Rhodia foi a que mais sofreu com a estiagem. A companhia de químicos chegou a interromper suas atividades em fevereiro e outubro do ano passado na unidade de Paulínia, por causa da baixa vazão do Rio Atibaia. A empresa utiliza a água principalmente para uso no resfriamento de torres de refrigeração. Do volume captado, 92% é devolvido ao rio após utilização no processo industrial. A indústria informou que “nos últimos anos, investiu cinco milhões de euros em seus sistemas relacionados ao uso do recurso.” A assessoria de imprensa da Suzano Papel e Celulose, em Limeira, afirmou que a empresa trabalha com planos para redução contínua da água, justamente para se preparar para uma eventual redução de sua outorga. O Correio não conseguiu o contato das antigas administrações das usinas União São Paulo e Santa Cruz. 

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