Secretaria Nacional de Direitos Humanos estuda lançar campanha nacional de combate ao consumo de etanol combustível entre a população de rua
Todos os postos de Campinas passaram a receber os informativos da campanha "Combustível não é bebida" (Dominique Torquato /AAN)
A Secretaria Nacional de Direitos Humanos, da Presidência da República, pediu informações para as autoridades policiais e Prefeitura de Campinas sobre as recentes mortes de moradores em situação de rua, registradas desde abril na cidade, e estuda lançar campanha nacional de combate ao consumo de etanol combustível entre a população de rua. A prática adotada por alguns moradores nessas condições, que estão ingerindo o coquetel de etanol com suco em pó, acendeu o sinal de alerta da secretaria nacional, que aguarda os laudos das mortes.Na terça-feira (23), o Sindicato do Comércio Varejista de Derivados de Petróleo de Campinas e Região (Recap) e a Prefeitura iniciaram a campanha "Combustível não é bebida" em todos os postos da cidade, orientando através de panfletos e cartazes frentistas e proprietários sobre o perigo da ingestão do etanol dentre outros procedimentos que devem ser adotados em caso de um morador em situação de rua esteja alcoolizado ou sob o efeito de outra substância e precisar de ajuda. Com relação à secretaria nacional, a ouvidora nacional Irina Bacci disse ontem que a área de coordenação do comitê nacional de direitos humanos está buscando mais informações sobre as mortes registradas nos últimos 60 dias em Campinas, para repassar os dados ao Movimento Nacional da População em Situação de Rua. "Com os dados sobre a causa da morte desses moradores, e se comprovado que foram a óbito por causa da ingestão de etanol, repassaremos ao movimento nacional que consequentemente dialogará com movimentos e coletivos de entidades de todo o Brasil para sabermos se trata de um fenômeno nacional e iniciarmos uma campanha", disse a ouvidora Irina.De acordo com ela, a secretaria nacional informou que das nove mortes recebeu denúncia de violação dos direitos humanos somente no caso do morador em situação de rua José Tertuliano Silva, travesti conhecido como "Ana Paula" , de aproximadamente 35 anos, que foi encontrado morto na Rua Coronel Quirino, no dia 24 de abril e que compõe as nove mortes desde então. Naquele caso, a ouvidora nacional disse que a principal e mais provável causa da morte tenha sido violência. "Aguardamos o feedback do movimento nacional para dialogarmos inclusive com a secretaria de segurança, assistência social e assim traçarmos ações para proteger essa população" , informou.A secretaria informou que já fez contato com a Prefeitura para obter mais detalhes das condições em que essas pessoas foram encontradas mortas. "Este ano, foram registradas sete denúncias de violação de direitos humanos contra a população em situação de rua em Campinas, mas nenhuma se refere ao ocorrido" , informou, em nota.Além da morte do travesti José Tertuliano, o assassinato dos moradores em situação de rua, Marcus Eugênio Martins Corrêa, de 28 anos, (no sábado), e de Ednaldo Alves dos Santos, de 38 anos (dia 18), ambos na região do Botafogo, estão sendo investigadas separadamente dos investigada de maneira separada pelo Setor de Homicídio e Proteção a Pessoa (SHPP). Porém, desde sexta-feira está internado no Hospital Municipal Dr. Mário Gatti em estado grave um morador de rua encontrado caído na rua Prefeito Passos, na Vila Itapura. Ele passou por cirurgia e desde então respira com ajuda de aparelhos. Com aproximadamente 55 anos, o morador ainda não teve a identidade descoberta. A Polícia Civil informou que ainda aguarda os laudos dos exames necroscópicos e toxicológicos para apurar as causas das mortes dos moradores.Câmara A sequência de mortes de moradores em situação de rua neste ano também despertou a preocupação da Comissão de Defesa dos Direitos Humanos e Cidadania da Câmara Municipal, que prepara para essa quinta-feira, a partir das 10h, um debate para "socializar as informações", segundo o presidente da comissão, vereador Carlão do PT, e propor ações que estejam ao alcance do Legislativo. "Ainda não temos nada formatado, pois primeiramente queremos conversar com as entidades que trabalham com os moradores em situação de rua, como a Toca de Assis, Conselho Municipal de Direitos Humanos, e a partir daí pensar em iniciativas", disse Carlão.Sem apresentar dados, o presidente informou que houve um crescimento no número de mortes esse ano em relação aos dois últimos anos.Dentre as ações imediatas que a comissão pretende realizar será uma visita ao abrigo municipal onde são acolhidos os moradores. "Vamos ver as condições estão adequadas e como podemos contribuir" , disse. O presidente também aguarda a presença de representantes da polícia civil para obter mais explicações sobre as mortes.CampanhaTodos os postos de Campinas passaram a receber os informativos da campanha "Combustível não é bebida", realizado pela Secretaria Municipal de Cidadania, Assistência e Inclusão Social, Sindicato dos Empregados em Postos de Serviços e Combustíveis de Campinas (Sinpospetro) e Sindicato do Comércio Varejista de Derivados de Petróleo de Campinas e Região (Recap). Ao todo serão 10 mil panfletos distribuídos a frentistas e donos de postos.O presidente do Recap, Flávio Martini de Souza Campos, o trabalho de conscientização será feito de posto em posto. "Não há lugar melhor para informar a não vender etanol do que junto aos frentistas nos postos. É um serviço de utilidade pública, que depende de cada um para coibir essa venda", disse Campos.No material, elaborado pela Prefeitura e impresso pelo Recap, há informações sobre o perigo da ingestão de álcool combustível, um passo-a-passo de como fazer um atendimento à população em situação de rua e como proceder ao encontrar pessoas em situação de rua alcoolizada e sob o uso de outras substâncias.Nos folhetos foram reforçadas as regras impostas pela ANP (Agência Nacional do Petróleo), através da resolução n° 41/13, em vigor desde novembro de 2013. De acordo com a norma, o combustível automotivo deve ser comercializado em vasilhames que tenham sido fabricados para este fim e devidamente certificados pelo Instituto Nacional de Metrologia, Qualidade e Tecnologia (Inmetro).EsfaqueadoUm morador em situação de rua foi esfaqueado durante uma discussão com outro morador na mesma condição, na madrugada de terça-feira (23), na Rua Dr. Costa Aguiar, região central. Evaldo Prado Cardoso, de 27 anos, foi atingido com diversos golpes e foi socorrido até a Unidade de Pronto Atendimento (UPA), do Centro. Na manhã de terça, a Secretaria Municipal de Saúde informou que o rapaz sofreu apenas ferimentos leves e que após ser medicado foi liberado. Tanto a vítima como o agressor estavam embriagados no momento da briga, disseram policiais que atenderam a ocorrência. O agressor ainda não foi identificado pela polícia. O calçadão da Costa Aguiar é um dos principais pontos de "dormitório" dos moradores. No último domingo, o Correio mostrou que as marquises da loja Renner e do banco Itaú dorme aproximadamente 30 moradores, todas as noites.