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Polêmica Cotas

FOTOS: Arquivo pessoal Inaê Miranda DA AGÊNCIA ANHANGUERA [email protected] A postagem do professor Paulo Palma, da Faculdade de Ciências Médicas (FCM) da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), na página do Facebook do reitor Marcelo Knobel, causou polêmica sobre a adoção de cotas na instituição

Inae Miranda
01/06/2017 às 19:29.
Atualizado em 22/04/2022 às 19:12

FOTOS: Arquivo pessoal Inaê Miranda DA AGÊNCIA ANHANGUERA [email protected] A postagem do professor Paulo Palma, da Faculdade de Ciências Médicas (FCM) da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), na página do Facebook do reitor Marcelo Knobel, causou polêmica sobre a adoção de cotas na instituição. O médico escreveu: “Caro Prof Marcelo Knobel, com a resolução publicada hoje, e com tantos cotistas ingressando na UNICAMP, sugiro mudança de nome dessa universidade para Escola Estadual de Terceiro Grau Zeferino Vaz. Próximo passo será cotas para ingressar na carreira docente? Lets make UNICAMP great again!”. O docente defende a meritocracia e afirma que a adoção de cotas diminui a qualidade da universidade. A reação à publicação foi imediata. O professor foi acusado de racismo e o Núcleo de Consciência Negra cobrou um posicionamento da reitoria, que repudiou o comentário do docente. A publicação foi feita anteontem e só na página do Núcleo de Consciência Negra” teve mais de 330 compartilhamentos e dezenas de comentários com críticas ao professor. “Todo apoio a implementação das cotas e o respeito dado pela reitoria a uma decisão democrática dos órgãos responsáveis. As pesquisas feitas sobre o tema são enfáticas ao apontar que os alunos que ingressam nas universidades através do sistema de cota tem desempenho igual ou superior, portanto esse comentário infeliz a respeito da mudança de nome demonstra ignorância a respeito do tema ou medo da inclusão de alunos desfavorecidos e um reparo da herança de nossa história de escravidão. Sou ex-aluno da Unicamp e fico orgulhoso com a notícia. Atualmente sou aluno de doutorado e pretendo seguir carreira acadêmica. Não me sentiria de maneira alguma prejudicado caso perdesse um concurso público por motivo de cotas e seria ótimo de fato se houvesse um esforço maior para aumentar a representatividade do corpo docente da Unicamp”, afirma um internauta. Teófilo Reis, aluno de doutorado em sociologia e integrante do Núcleo afirma que em todas as universidades onde houve implementação de cotas sempre surgiram as expressões de racismo e preconceito sem fundamento e que, de certa forma, reações como a de Palma já eram esperadas. “É uma reação atrasada e que já vimos em outros momentos do histórico da educação brasileira, quando houve a implementação de cotas”, afirma. “Embora o urologista não faça menção explícita à questão racial, como as cotas aprovadas são cotas étnico-raciais, o que está dito na mensagem dele é que negros são incompetentes e vão fazer cair o nível da universidade”, acrescenta. O Núcleo de Consciência Negra cobrou um posicionamento da reitoria e disse que pretende levar o caso a instâncias como Ministério Público, Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República e Anistia Internacional. Segundo ele, silenciando, a reitoria demonstra que concorda com a posição do reitor. Esperamos uma posição oficial da reitoria, afinal ele mandou a mensagem diretamente para o reitor. Aqui na Unicamp temos casos de militantes negros sendo processados e punidos por coisas estúpidas, que não tem qualquer fundamento. Chega o professor e manda uma mensagem como essa direto para Facebook do reitor. A Unicamp precisa se posicionar, a não ser que concorde”. Ele completa dizendo que a aprovação das cotas foi um avanço e que agora dois desafios estão postos: “reverter punições racistas em curso na universidade e trabalhar pela implementação das cotas”. O estudante Adriano Góis, que é aluno de ciências sociais e também é integrante do núcleo de consciência negra afirma que a aprovação das cotas foi unânime. “Mas muito pelo constrangimento, porque muitos professores não são a favor e não são abertos a discussão. A diferença é que ele (Palma) expôs o ódio, os outros não se expõem, mas pensam como ele”, disse. Em relação a publicação de Palma ele acrescentou. “Vamos conversar com o diretor da FCM e cobrar uma posição do reitor Marcelo Knobel”. Ele também ressaltou que a aprovação das cotas foi uma vitória e que a reação do professor só reforça a necessidade da Unicamp combater o racismo. “A gente defende a criação de uma comissão ou de uma secretaria de combate à discriminação racial, que uma demanda que levamos junto com a implementação das cotas”. A reitoria da Unicamp informou que medidas internas estão sendo avaliadas. Em nota, o reitor da Unicamp, Marcelo Knobel, disse que repudia o comentário do professor Paulo Palma publicado em rede social e considera que manifestações dessa natureza não contribuem para o debate qualificado sobre o tema. A Unicamp diz ainda que pauta suas ações com base no respeito à diversidade, à pluralidade e à inclusão social. A reitoria acrescentou que “a aprovação, pelo Consu, do princípio das cotas étnico-raciais constitui mais um passo para ampliar a representatividade da sociedade na Unicamp, com a garantia de preservação da excelência acadêmica conquistada ao longo de sua história, a exemplo de ações afirmativas e de inclusão social implantadas com sucesso anteriormente, como o Programa de Ação Afirmativa para Inclusão Social (Paais), criado em 2004, e o Programa de Formação interdisciplinar Superior (ProFIS), instituído em 2011”. A Faculdade de Ciências Médicas (FCM) também divulgou um comunicado dizendo que manifestações isoladas de seus servidores não refletem a opinião e a política da instituição. “Quanto à adoção de cotas étnico-raciais, a FCM da Unicamp também esclarece que – por deliberação de sua Congregação – votou de forma favorável a essa proposta, durante a sessão do Conselho Superior da Unicamp (Consu), na última terça-feira. Retranca: Urologista renomado no País, Paulo Palma respondeu à polêmica dizendo que é “politicamente incorreto mesmo”. Voltou a atacar as cotas e disse que é a favor do mérito. Segundo Palma, com as cotas, “tapa-se o sol com a peneira” e o nível de produtividade da universidade tende a cair. “Agora estão pondo cotas na Pós. Se é aluno de faculdade aprovada pelo MEC, para quê precisa de cota?”, questiona. O professor criticou o governo do PT, que deu início à implementação de cotas e programas que garantem o acesso de estudantes de escola pública às universidades. “O vagabundo do Lula pega a divisão de classe, pega a juventude perdida para buscar atalhos para vida real e acha que isso vai resolver problema do ensino no país. Estão dizendo Paulo Palma é assediador. Estou cantando e dançando para esses indivíduos que não tem currículo, tem discurso do blá, blá, blá, são laborfóbicos. Quando chegam às 9h à universidade estou lá desde 7h”. A universidade é para a elite cultural do Brasil, não para vagabundo. Comparou a aprovação de cotas com a escalação de um time. “Você escala uma seleção por cotas?”, questiona. Ele acrescentou que a competência está cedendo lugar para o politicamente correto. “Não sou a favor de reserva de vaga para ninguém, isso aqui é mérito. Para quem está preparado. Você acha que vai entrar na Harvard porque é preto ou porque chileno. Tem que ter competência”. Disse ainda que a universidade é para quem entra pela porta da frente e quem ingressa por cotas entra pela porta de trás. O professor argumenta que o problema está nas escolas públicas que não reprovam. “A aprovação das cotas é um retrocesso, porque, no ensino público, que é onde deveria estar centrada a atenção, os professores recebem a bonificação em função do número de aprovados, ou seja, se aprovarem todo mundo independente de terem aprendido ou não recebem bônus em dinheiro. Ou seja, o governo compra a aprovação de todos subornando professores que são mal pagos e precisam do dinheiro. Em vez de corrigir o problema, dão cotas para quem não tem condição de acompanhar. Não digo cursos como dança. Digo curso técnicos que exigem um pouco mais de QI”. Em vez de corrigir o problema nas escolas públicas, diz ele, criam mecanismo para que pessoas entrem pelas portas dos fundos, tirando lugar de quem se preparou. O docente acrescentou que quando permite as cotas, a universidade está trocando cérebro por nádegas já que o aluno cotista vai entrar na sala e não vai aproveitar nada. “Quando permite cota, ela está trocando cérebro por nádegas ou por cor de pele e outros valores”. Ele, porém, rebateu as acusações de racismo. “Não me referi a raça nenhuma, eu me referi apenas a mérito”, diz. Segundo ele, quem tem preconceito é quem defende cotas e acha que negros e índios são incapazes. “Eles tem condição de competir em condição de igualdade. Tivemos o mistros do Supremo, Joaquim Barbosa, que é poliglota, filho de pedreiro e chegou por mérito onde chegou. Eu não tenho esse preconceito de achar que eles não são capazes”, disse. “Não estou agredindo ninguém pelo fato de não estar de acordo. Estou mantendo direito de expressar minha opinião”, completou.

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