Variedade de produtos, eventos se multiplicando e até um reality show comprovam a popularidade dos food trucks, que pregam a interação e o fim das firulas
Gastronomia ( Cedoc/ RAC)
Os food trucks surgidos na Europa e nos Estados Unidos conquistaram os brasileiros, haja vista o número de eventos que se multiplicam em metrópoles como Rio de Janeiro, São Paulo e Campinas. Já foi a algum? Não? Então, programe-se, pois neste mês e no próximo pelo menos três eventos estão confirmados por aqui, um deles beneficente. A popularidade do modelo tem inspirado empreendedores, mas, basta colocar a cozinha sobre rodas para funcionar para que se perceba que a lida pode ser até mais arriscada e puxada do que numa convencional. Quer saber como são os bastidores da empreitada, ainda que num ambiente controlado? Foto: Cedoc/ RAC O canal pago GNT apostou na produção de um reality show que revela nuances desse universo particular da comida de rua. Food Truck – A Batalha estreia amanhã, às 19h30. Em cada um dos 30 episódios diários (de segunda a sexta), duas equipes coordenadas por experts brasucas disputam a liderança das vendas de seus menus. Adolpho Schaeffer, do Holy Pasta, e Marcio Silva, do Buzina, apresentadores do programa e mentores dos times, têm experiência internacional no segmento, com destaque às vivências na Big Apple. Boa-nova é que Campinas está representada no programa: Luciano Antonello, do Buffet Antonello, compôs uma das batalhas. O registro está previsto para ir ao ar no dia 18 de março. Por questão contratual, Antonello entrega o que pode. “Quem iria comigo para a disputa, como parceiro, seria o Carlos Américo Louredo, do Joe & Leo’s. Ele não pode. Aí me uni ao Artur Sauerbronn de Almeida, de Vinhedo, e ao Ídolo Giusti Neto, de São Paulo. O Aimar de Paula, também de São Paulo, ficou na equipe adversária. Foi legal porque todos nós, que já temos bastante conhecimento de mercado, tiramos o desafio de letra. Mas não é fácil”, situa ele, que planeja ativar seu negócio sobre rodas este mês. “O planejamento, a adaptação do veículo e a logística de produção precisam ser muito bem pensados. Pretendo levar meu truck a eventos para os quais sou contratado e participar de encontros de comida de rua”, diz. Antonello também está à frente da primeira edição do Adacamp Food Park – Gastronomia Solidária, que reunirá cozinheiros e trucks na sede da entidade no dia 29 deste mês (leia mais nesta reportagem). Foto: Giancarlo Giannelli/Especial para AAN As gravações foram realizadas no último trimestre do ano passado, em Sampa. O público foi comunicado de que haveria trucks em vários endereços da cidade e de que se tratava da gravação de um programa de TV. Em estúdio, os participantes preparavam um prato e quem se saísse melhor poderia eleger seu mentor. “Escolhemos o Márcio. Tínhamos que definir, então, o que seria vendido na rua e sair às compras, com orçamento e tempo de pré-preparo estabelecidos. No veículo, como acontece normalmente, faríamos a finalização e a venda”, explica Antonello. Estratégias de promoção e negociação aplicadas, aproveitamento máximo de ingredientes e produção mínima de resíduos fizeram a diferença, bem como os toques dados pelos mentores. De volta ao estúdio, era declarada vencedora a equipe que mais vendeu – ela ficava com o montante arrecadado mais a grana do time perdedor.Na práticaA atração ganha ao se propor a desmistificar o segmento, que ainda não tem regras bem estabelecidas e soa gourmetizador ou “truqueiro” para uma leva de desavisados. Da prosa com os food truckers surgem algumas considerações. E a primeira resvala, justamente, no conceito gourmet. “Como banalizaram esse adjetivo. Chega a ser ridículo esse papo de gourmet dentro dessa cena. Que papo furado! É comida de rua. E a rua não tem nada de gourmet e, sim, muito do oposto disso”, avalia Adolpho Schaeffer. O apresentador de A Batalha é empresário e dono do Holy Pasta Foodtruck, que funciona numa Kombi reformada. No truck são finalizados e vendidos pratos cujos ingredientes exigem armazenagem e refrigeração corretos. O pré-preparo, portanto, depende de uma cozinha de apoio bem equipada. Foto: Divulgação São os cozinheiros e restaurateurs, habituados a alimentar levas de comensais, os que mais apostam nesse filão. Alguns creem ser uma alternativa mais viável frente aos custos elevados de manutenção de um restaurante. E, em muitos casos, o truck vira o braço de negócio que possibilita ao empresário-cozinheiro reaproximar-se do público – funções administrativas, afinal, consomem os chefs; pilotar os fogões torna-se raro. Carlos Américo Louredo se mostra antenado. Por estar à frente da diretoria de gastronomia do Campinas e Região Convention & Visitors Bureau (CRCVB), do restaurante Joe e Leo’s e, há mais de dois anos, atuar no projeto de seu Speedy Joe (hambúrgueres artesanais), ele hoje presta consultoria a quem quer levar um truck a sério. “A adaptação de um veículo pode custar caro, e o investimento vai depender da intenção do dono do negócio. Investi cerca de R$ 250 mil na reforma de um minicaminhão com autonomia para rodar por aí e funcionar em eventos fechados, uma autorização que obtive da Prefeitura e que abriu portas para outras pessoas. A estrutura interna é de uma cozinha, com todos as questões de higiene e segurança alimentar previstas”, assegura. Louredo já vendeu seus sandubas até no Aeroporto Internacional de Viracopos, a convite da American Airlines. Foto: Leandro Ferreira/ AAN Dedetização, impermeabilização, previsão de pontos de água e de esgoto, coleta de resíduos, pias e freezer foram itens checados um a um. Deu certo? Super. Durante o Carnaval, o truck movimentou a Riviera de São Lourenço, no Litoral paulista. “Se mantenho o caminhãozinho aqui, tenho que lembrar que ele concorre, inclusive, com meu restaurante. É preciso planejar a médio e longo prazos, pois há inúmeras possibilidades de negócio surgindo”, assenta.Preço justo, por favorOutro ponto crítico? “Tem muita gente se aproveitando do momento e cobrando preços que não pagaria por um produto. Isso é ruim para o movimento como um todo. Porém, quem vai sentir as consequências lá na frente são as mesmas pessoas. Uma frase que o Márcio (Silva) costuma dizer e com a qual concordo é que ‘comida cara você não mede pelo preço, mas pelo produto’. Se o hot dog é caro, espero um produto à altura do preço cobrado. Se for barato, a mesma coisa, pois a expectativa é outra”, avalia Schaeffer. Não foi à toa que a chef Roberta Sudbrack, que começou a carreira vendendo cachorro-quente numa carrocinha em Brasília, resolveu apostar na comida de rua – seu Sud Dog é sucesso no verão carioca. E olha que seu restô RS, sediado no Rio de Janeiro, vai muito bem. “Até ela, que é uma chef tarimbada, sofreu no início. Você só sabe se o serviço vai deslanchar ou não na rua. Você tem de estar preparado. Garanto, dá medo, o mesmo medo que tivemos quando fizemos o primeiro Chefs na Praça Carlos Gomes. Na segunda edição, mais de 20 mil pessoas compareceram”, pontua Louredo. Foto: Cedoc/ RAC Ele calcula que existam, hoje, ao menos 30 food trucks em Campinas. Um dos pioneiros foi o Spiro Giro, kebaberia móvel que tem como ponto de maior frequência o distrito de Barão Geraldo. O que vem por aí Em novembro do ano passado, Campinas acolheu o primeiro festival gastronômico de food trucks, no estacionamento do Parque D. Pedro Shopping. Em dois dias, cerca de 20 mil pessoas experimentaram comidinhas, sobremesas e bebidas elencadas pelos mais de 30 participantes, oriundos da região e de São Paulo. Em abril, o shopping realiza a segunda edição do evento, em data a ser definida. A curadoria é de Raphael Corrêa, sócio do truck Massa na Caveira. No dia 29 de março, a partir das 11h, a Associação para o Desenvolvimento dos Autistas em Campinas (Adacamp) acolhe o Adacamp Food Park – Gastronomia Solidária, projeto de viés beneficente comandado pelo chef Luciano Antonello. É, na verdade, um desdobramento do bem-sucedido Chefs pela Solidariedade. Além de trucks como o Speedy Joe, haverá tendas de comida e atividades coordenadas por cozinheiros, com parte da renda revertida à entidade. “Até agora, temos confirmados 23 tendas e seis trucks. Estamos acertando detalhes com os parceiros e a entidade. Será algo grande, bonito e, o melhor, solidário”, avisa Antonello. Foto: Cedoc/ RAC Viviane Moraes (Estação Marupiara), Manuela Delatorre (Cayena Bistrô), Artur Sauerbronn de Almeida, Ídolo Giusti Neto e Aimar de Paula (participantes de Food Truck – A Batalha), Maurício Assis (Nosso Bar) e Helton Pereira (do truck Yakissoba do Chef) já confirmaram presença. Pereira, aliás, foi um dos nove participantes da primeira edição do Food Trucks e Etc, sediado na Casa de Fazer, no distrito de Sousas, no início de fevereiro. Ao menos quatro mil pessoas foram ao evento, que agora passa a ser realizado de forma periódica por lá. “Na primeira quinzena de abril teremos a segunda edição que, além da variedade gastronômica, inclui atividades culturais. Do feedback que tivemos do público, bastante receptivo, vamos aprimorar o espaço, a começar pela otimização do layout”, pontua João Corbett, um dos organizadores. Ele salienta que o sucesso depende da união de forças. “Nossa prioridade é a qualidade. Há público para eventos de comida de rua em Campinas, mas é preciso apostar na diversidade para não ficar maçante”, sintetiza. Foto: Denise Maher/Divulgação Dez mandamentos dos food trucks Orientações para entusiastas de primeira viagem em eventos do tipo_Food truck não é fast-food_Comida de rua é comida na rua, esqueça as firulas_Piquenique 2.1 é uma comparação viável_Pode haver fila, tenha paciência_Interaja, a ideia é essa_Leve sua toalha, será útil_Recolha seu lixo_Leve cartão e dinheiro_Preço tem a ver com qualidade, exija_Gostou? Compartilhe. Não gostou? Sugira melhorias Mapa dos trucks Food trucks, food bikes e food carts que circulam em cidades como São Paulo, Rio de Janeiro e Belo Horizonte já estão mapeados. Quer saber mais? Acesse o guia Food Truck nas Ruas via aplicativo (há versão para Android e iOS) ou pelo site www.foodtrucknasruas.com.br. Atualmente, o serviço inclui informações de 85 trucks cadastrados pelo Brasil.Quer empreender na área?Há quem tenha assistido ao filme Chef (2014), dirigido e estrelado por Jon Favreau, e pensado que, na prática, a levada de um food trucker é hollywoodiana. Procede? Tanto quanto achar que na rua come-se de garfo e faca num ambiente cercado de regras de etiqueta e serviço impecável. Antes de apostar num truck, questione. O que será vendido? Por que? Como? Em que tipo de embalagem? Quantas porções por dia há condição de produzir? Como será feito o marketing? “Se fosse outra pessoa vendendo o mesmo produto, você compraria? É isso. Visual, logística, operação, custos. E nada disso adianta se a comida não valer a pena”, situa Adolpho Schaeffer. Em São Paulo e no Rio de Janeiro, graças à criação de leis para comida de rua, as regras para os truckers estão mais ajustadas. Em Campinas, os primeiros projetos começaram a surgir no ano passado. Foto: Divulgação Orientações Importantes _Defina seu produto e aposte na qualidade_Você vai precisar de uma cozinha de apoio; invista_Leve personalidade para o seu truck_Domine a arte de negociar_Faça pesquisas de mercado_Mantenha bons e fiéis fornecedores_Aprenda a lidar com o público_Food truck é negócio; não um hobby_E, como todo negócio, é exaustivo_Seja criativo e ousado, mas, acima de tudo, coerente