Em expansão constante, mercado permite atuação ampla, mas formação também é abrangente
Tainá faz cursinho e vai estudar biotecnologia: "Demorei 2 anos para me decidir e tinha que escolher o certo" (César Rodrigues/AAN)
Alimentos livres de pragas, combustíveis produzidos a partir de micro-organismos, órgãos e tecidos humanos construídos em impressoras 3D com o uso de células-tronco. Essas são apenas algumas das possibilidades de aplicações da biotecnologia, ciência tão antiga quanto a humanidade, mas que nas últimas duas décadas vem se expandindo e ganhando cada vez mais peso no País. Não à toa, a demanda por bacharéis e engenheiros formados na área, vinculada especialmente à pesquisa, é alta e as instituições apostam na abertura de novos cursos para atender o mercado. A biotecnologia nasceu junto com os primeiros processos de fermentação na produção alimentar, principalmente na produção de pão e vinho, como explica o coordenador do curso de Engenharia Biotecnológica da Universidade Estadual Paulista, Dario Abel Palmieri. “Hoje, ela é o conjunto de informações de elementos biológicos, que podem ser manipulados de alguma maneira com aplicação que seja útil para alimentação ou para a indústria.” Os organismos vivos — daí vem o significado da palavra bio — podem ser manipulados com efeito benéfico, como na produção de alimentos funcionais, de medicamentos. Foto: César Rodrigues/AAN Andrea Balan Fernandes, do LNBio: pós-graduação, doutorado e pós-doutorado na área de biotecnologia Quem nunca ouviu falar nos transgênicos ou nos organismos geneticamente modificados? A biotecnologia é figura fundamental por trás dessas transformações na área da agroindústria. Hoje, em laboratório, os biotecnologistas conseguem controlar a patogenicidade da bactéria inutilizando ou silenciando o gene que causa esse problema. Os transgênicos recebem transferência ou sofrem alterações no DNA. O milho BT, por exemplo, recebe na fase adulta o gene que vem de um bacilo e começa a produzir proteína gerada pelo agente. A modificação é mortal para a lagarta que come a folha da planta. Mas as aplicações da biotecnologia vão além. “Tenho quatro alunos que estão construindo uma impressora 3D. Hoje, com impressora 3D você consegue construir tecidos e órgãos usando células-tronco. Tem pesquisadores recompondo tecidos como orelhas, por exemplo”, afirma Palmieri. A aplicação engenhosa associa computação e tecnologia da informação com a biotecnologia.Na indústria, o biotecnologista também consegue desenvolver desde vacinas, anticorpos e outras moléculas de interesse farmacêutico, até aumentar a produção de biocombustíveis criando micro-organismos capazes de degradar a sobra da cana-de-açúcar e que era inutilizada. Dados de um mapeamento feito em 2011 pela BRBiotec dão conta de que 40% das empresas de biotecnologia estão no Estado de São Paulo, e o mesmo percentual atua na área de saúde. Nuances A grade curricular e o nome do curso de biotecnologia mudam de acordo com as universidades. Nas três mais conceituadas do Estado, ele assume as formas de bacharelado em biotecnologia, na Universidade Federal de São Carlos (UFSCar); Engenharia Biotecnológica, na Universidade Estadual Paulista (Unesp), e quem deseja cursar na Universidade de São Paulo (USP) opta pelo bacharelado em ciências físicas e biomoleculares, química com atribuição em biotecnologia ou química com atribuição em química tecnológica. A procura pela área e a demanda do mercado é tão grande que a Unesp pretende abrir nos próximos dois anos dois novos cursos: engenharia de bioprocessos e de biotecnologia. O coordenador do curso de bacharelado em biotecnologia do campus de Araras da UFSCar, Reinaldo Bastos, explica que a biotecnologia sai como bacharelado e tem duração de quatro anos; na engenharia são cinco. “Apesar de todos esses cursos serem na área de biotecnologia, eles têm algumas diferenças. Exemplo: se é criado junto ao curso de engenharia química, vai ter esse perfil. Se a origem é biologia vai puxar mais para genética; a engenharia vai explorar mais as exatas.” A carga curricular de todos eles é rica em exatas, química, biologia e o gosto pela pesquisa é fundamental. “É um curso e uma profissão que envolvem muita pesquisa. Nossos egressos vão para grandes centros e trabalham muito com pesquisa agrícola, industrial, animal, vegetal”, ressalta Bastos. A opção da estudante de cursinho Tainá Yumi Patriani, 17 anos, está clara. Ela conta que decidiu cursar biotecnologia por gostar de biologia e química. A parte de cálculo ela diz que é suportável. Mas a escolha da estudante também foi pautada por se tratar de uma área em plena expansão. Ela vai prestar vestibular na Unesp e na UFSCar. Na USP ela vai prestar biologia e pretende se especializar na área de genética, e na Unicamp vai prestar engenharia de alimentos. “Demorei dois anos para me decidir e tinha que escolher o certo”, afirma. Intercâmbio é boa opção para adquirir bagagem Movidos pelo interesse de se aprofundar no universo da biotecnologia, os estudantes Bruno Cazari, de 23 anos, e Renan Kimura, 22 anos, — ambos do 5 ano de Engenharia Biotecnológica da Unesp de Assis — foram para fora do País e trouxeram do intercâmbio uma bagagem extra para iniciarem a carreira. Cazari participou do programa Ciência sem Fronteiras na Espanha. “Cursei biotecnologia mesmo, porque não tinha a parte de engenharia. Percebi que o Brasil está avançando, mas ainda precisa de um pouco mais de investimento na área de pesquisa”, afirmou o estudante, que deseja atuar na área farmacêutica e de pesquisa com células tronco. Kimura fez intercâmbio no Instituto Nacional de Ciências Aplicadas da França. “Tive muito contato com as outras áreas da engenharia e a grade é um pouco diferente da nossa. Eles privilegiam muito gestão, administração e economia”, conta.