Banco Central ( Marcello Casal Jr/Agência Brasil)
A semana passada foi marcada, mais uma vez, por críticas do presidente Lula ao presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto. O presidente Lula, assim como grande parte de sua equipe econômica, considera o aperto monetário exagerado e nocivo ao crescimento da atividade produtiva, questiona a regra de autonomia do Banco Central e ainda propõe o estabelecimento de metas de inflação mais brandas.
Previsibilidade
Mesmo na hipótese de que o presidente Lula esteja certo em suas convicções, totalmente ou em parte delas, esse tipo de atrito é muito ruim para o Brasil. Ao manifestar sua insatisfação com as regras atuais que guiam as decisões de política monetária do Banco Central, o presidente cria um ambiente de maior incerteza que prejudica a previsibilidade e pode afastar os investidores.
FRASE
"Nada é possível sem as pessoas, mas nada dura sem as instituições"
Jean Monnet, político francês
Críticas
Isso não quer dizer que a condução da política monetária esteja acima de críticas e que não se deve debatê-la. Nada disso. Deve-se mesmo reconhecer que o Brasil está com uma das maiores taxas de juros reais do mundo e que ainda assim a inflação permanece acima do teto da meta, penalizando as classes menos favorecidas. No entanto, essa discussão deveria ser pautada por critérios técnicos que não possuem relação com a autonomia do BC.
Autonomia
Na prática, a autonomia do BC faz apenas com que os mandatos dos diretores e do presidente do Banco Central não sejam coincidentes entre si ou com o mandato do presidente da República. O atual presidente do BC assumiu o cargo em fevereiro de 2019, tendo sido indicado pelo ex-presidente Bolsonaro, e seu mandato se encerra em 31 de dezembro de 2024. O presidente Lula poderá reconduzi-lo (o que não acontecerá) ou indicar um novo nome para a posição.
Autonomia 2
A autonomia do Banco Central, tão criticada no atual governo, é um instrumento que procura tornar as decisões de política monetária do banco desvinculadas do ciclo político-eleitoral. Como a diretoria do Banco Central permanece no cargo, qualquer que seja o resultado das eleições, pode tomar as decisões que julgar mais adequadas para manter a inflação sob controle, mesmo que isso implique em medidas mais duras no curto prazo, que são sempre impopulares.
Selic
A alta dos juros começou em março de 2021, quando a taxa Selic estava ao nível de 2% ao ano. Os preços estavam em elevação e naquele mesmo mês o IPCA acumulado de 12 meses romperia o teto da meta. A taxa de juros foi sendo elevada em todas as reuniões do Copom até agosto do ano passado, quando a Selic chegou aos atuais 13,75% ao ano. Todo esse aumento foi realizado antes das eleições, independentemente do ciclo político.
Personificação
É importante ainda lembrar que o presidente do BC não toma as decisões de política monetária sozinho. As decisões são tomadas pelo Copom, formado por oito diretores do Banco Central, além de seu presidente, e devem ser justificadas publicamente através de comunicados e divulgação das atas de reunião. E isso tem que ser assim. Quanto menos personificadas são as decisões, melhor para o país.
Solidez
Os indivíduos possuem interesses pessoais e são movidos por esses interesses, sempre muito focados no curto prazo. Mas os indivíduos passam e as instituições e o país ficam. Quanto mais fortes e sólidas forem as instituições, menor é a chance de que essas sejam cooptadas por interesses pessoais de curto prazo. No governo passado, duas instituições que foram muito enfraquecidas são o Ibama e a Funai. O resultado estamos vendo agora, com a tragédia Yanomami.
Solidez 2
O nível de desenvolvimento de um país tem relação estreita com a força e solidez de suas instituições. O Brasil tem enormes desafios para superar. Não podemos ficar reféns do ciclo eleitoral, mudando de rotas e reformulando tudo a cada quatro anos. Precisamos de instituições sólidas que garantam estabilidade ao país, caso contrário será impossível superar os desafios de longo prazo.