EDITORIAL

A verdade por trás do bom ladrão

A mensagem do "Sermão do Bom Ladrão" ecoa através dos séculos, encontrando ressonância nas lutas contemporâneas

Da redação
19/05/2024 às 09:55.
Atualizado em 19/05/2024 às 09:55

(Marcello Casal Jr/Agência Brasil/Arquivo)

No longínquo ano de 1655, o Padre António Vieira proferiu o "Sermão do Bom Ladrão", uma obra que transcende o mero discurso religioso, imortalizando-se como uma alegoria da luta contra as sombras da corrupção e da injustiça social. Ao desenhar o perfil do bom ladrão, Vieira não apenas conta a história de Dimas, o penitente ao lado de Cristo, mas também tece uma crítica velada àqueles que, nas esferas do poder, encobrem seus atos com a fachada da legalidade. Vieira inicia sua reflexão com um paradoxo: o ladrão que, ao confessar seus pecados, ganha a promessa do Paraíso, contraposto aos "grandes ladrões" que, sob o manto da autoridade, perpetuam a miséria e a exploração.

Com uma retórica envolvente e meticulosa, Vieira constrói sua crítica, não de forma direta, mas através de imagens e metáforas. Ele compara os "ladrões menores", que agem por necessidade, aos "grandes ladrões" que, com suas ações, saqueiam o bem público e perpetuam a opressão. Esta crítica, embora indireta, é um golpe certeiro na elite colonial e na corrupção institucionalizada. 

Vieira expõe a degradação moral de uma sociedade onde os ricos acumulam riquezas às custas dos pobres, e onde a verdadeira justiça é uma miragem distante. Ele evoca a figura do bom ladrão para destacar a dissonância entre a justiça divina e a justiça terrena, sugerindo que aqueles em posições de poder devem olhar para dentro e questionar a legitimidade de suas ações. Nas entrelinhas de seu sermão, Vieira tece um apelo à compaixão e à caridade, atributos que ele considera fundamentais para a construção de uma sociedade justa.

A mensagem do "Sermão do Bom Ladrão" ecoa através dos séculos, encontrando ressonância nas lutas contemporâneas contra a corrupção e a injustiça social. Vieira, com sua crítica sutil e sua visão ética, permanece um guia cujas palavras continuam a inspirar uma busca pela integridade e pela equidade. Sua obra não é apenas um relicário de pensamento, mas um contínuo chamado à reflexão e à ação moral.

A coragem de Vieira, ao desvelar as falácias dos poderosos e defender os oprimidos, transforma seu sermão em um manifesto atemporal. É um convite à introspecção e à mudança, um lembrete de que a verdadeira justiça emerge do arrependimento sincero e da ação compassiva. Assim, o "Sermão do Bom Ladrão" perdura, não como um simples documento histórico, mas como uma voz insistente e relevante, desafiando-nos a construir um mundo mais justo e humano. Bom domingo!

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