JOSÉ ERNESTO

O problema é muito antigo

20/07/2013 às 00:00.
Atualizado em 25/04/2022 às 08:12

Alexandre Herculano de Carvalho e Araújo (1810 -1877) escritor português possui contribuições importantes para a poesia, teatro, romance (O Pároco de Aldeia), historia (História da Origem e Estabelecimento da Inquisição em Portugal). Foi também jornalista. Em exposição sobre a obra de Herculano no Mosteiro dos Jerônimos, em Lisboa li um de seus artigos escrito no jornal “O País” em 1851 que me deixou intrigado. Ele escreve: ”As escolas primarias, a instrução do povo, a mais essencial de todas para o bem da nação essa, abandonada, esquecida, perseguida pelos tartufos (homem hipócrita, senhores de má fé) políticos, e não tendo força para lutar com eles, sucumbiu, e hoje, podemos dizer, e com o coração opresso o dizemos muitos alferes, muitos tenentes, muitos generais, capacetes com penachos brancos nas cavalarias, muitos soldados municipais agaloados, dourados, enfeitados; mas preceptores que encimem a ler os filhos do povo, e lhes deem as primeiras noções morais, padres virtuosos que propaguem os princípios suaves e eminentemente liberais da verdadeira religião, isso não temos nós; nem os nossos senhores tratam de preparar as coisas para que o hajam um dia”.

Se analisarmos esse comentário feito em 1851 e substituirmos os cargos descritos no texto pelos equivalentes no sistema político no século XXI temos que concluir que Herculano continua indiscutivelmente atual.

Vejamos por exemplo os resultados de ENEM e do IBED. Em análise recente dos resultados do ENEM, o cientista social Simon Schartzman observa que somente 27,9% dos que fizeram a prova obtiveram mais que 450 pontos (o máximo é 900 pontos). Menos que um terço dos alunos seria aprovado em caso de um exame. O mais grave é que a escolaridade da família tem efeito decisivo no desempenho do aluno. Quando os pais não têm nenhuma instrução formal, somente 12,1% alcançam os 50% de pontos. Esse valor passa para 49,6% quando os pais têm nível superior e 66,7% quando os pais têm doutoramento. Segundo Schartzman, a prova para a maioria dos alunos é uma “ilusão cruel”, pois o resultado está predeterminado por suas condições socioeconômicas e pela má educação que tiveram.

Se pensarmos que o não saber é a escravidão do mundo moderno e a tortura da sociedade que com ela convive, creio ser urgente reeditar a Lei do Ventre Livre, em versão para o século XXI. Se observarmos os resultados de Índice Brasileiro de Educação Básica (IBED) as conclusões não são diferentes. Nossa cidade, por exemplo, com diversas Universidades e chamada de a “Califórnia Brasileira” mantém com resultados pífios, não conseguindo atingir as metas propostas. Infelizmente para não encarar o problema com medidas mais ousadas, e a análise das melhores escolas e de países mais desenvolvidos nos oferece estratégias para isso, nossos governantes e seus secretários apelam para soluções demagógicas, como cotas raciais, serviços obrigatórios e outras soluções pirotécnicas. “A solução é vender o sofá” poderia completar Alexandre Herculano, ou outro pensador moderno mais irônico.

Nossos homens de “capacetes de penachos brancos” vivem em salas com ar condicionado, servidos com agua mineral e cafés. Têm também jatos à porta para ir a festas de casamentos ou assitir jogos da seleção de futebol. As salas das CPIs ficam sempre ocupadas, mas nestas, a verdade tem menos importancia que a versão. O marqueting substituiu a realidade.

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