A ESPN produziu um espetacular documentário sobre uma das maiores tragédias do futebol mundial. Hillsborough conta a história da semifinal da Copa da Inglaterra de 1989, na qual 96 torcedores do Liverpool morreram esmagados ou pisoteados em virtude da superlotação do estádio do Sheffield.O documentário tem assuntos que poderiam render várias colunas, mas vou escrever sobre ele apenas neste sábado e domingo, com ênfase na imagem que mais chamou a minha atenção. A que mais me comoveu.Hillsborough é triste de se ver. Repleto de depoimentos de pessoas que perderam pais, filhos e amigos naquela tarde de 15 de abril, o documentário é pesado. Exibe imagens do incidente, mostra corpos caídos no gramado, outros espremidos junto ao alambrado, já sem vida. Mas o que me levou a escrever sobre o filme foi uma outra cena, que ocorreu vinte anos depois. No Brasil, mortes absurdas no futebol, infelizmente, não são raras. Famílias chorando a perda estúpida de entes queridos também não. Sempre são imagens dolorosas, mas, como bem sabemos, sempre se repetem.O que nunca vi foi um político ouvir o clamor popular, se emocionar e, principalmente, reagir a ele. E é isso que mostra uma cena memorável de Hillsborough.Resumindo a história, os torcedores morreram por uma série de erros da polícia de Sheffield, que tinha no comando daquela operação um oficial sem nenhuma experiência em jogos de futebol (esse é outro tema que valeria uma coluna).Depois do incidente, as autoridades fizeram de tudo para responsabilizar os torcedores pela tragédia. De tudo mesmo, inclusive falsificar o relatório de todos os policiais que estavam no campo e relataram inúmeros e graves erros do comando da operação.O futebol inglês vivia o auge do hooliganismo e foi muito fácil vender para a imprensa que torcedores bêbados e violentos tentaram entrar no estádio sem ingresso. Começava ali uma longa, cruel e frustrante batalha dos familiares para provar que os 96 mortos eram vítimas e não réus.Durante meses, senhoras viajaram todos os dias de Liverpool a Sheffield para acompanhar o inquérito sobre a morte dos filhos. No final do processo, ouviram uma autoridade ler o nome de cada vítima, seguida pela palavra que designava a causa da morte: “acidente”. Ninguém foi indiciado.Apesar da enorme frustração, as famílias não desistiram. Continuaram lutando sem sucesso durante 20 anos, até que, finalmente, um político escutou o seu choro e entendeu a sua dor.Como Andy Burnham mudou essa história será o tema da coluna de domingo.