A morte do jornalismo impresso ainda não foi confirmada. Há suspeitas de que seu gradual desaparecimento, ainda que regido por maestros do apocalipse, vá demorar a se concretizar. Para o repórter, operário por excelência da labuta ameaçada, muita coisa já tem gosto e cheiro do passado. O sintoma mais visível é também o mais representativo da crise: poucos, raríssimos profissionais de hoje podem se gabar de receber nas redações ao menos meia dúzia de e-mails de seus leitores. Mas nem isso pode servir de parâmetro para dar sobrevida ou enterrar de vez a profissão. Porque a internet, chamada de vilã para os saudosistas e salvadora para os modernos, inverteu a lógica do feedback. Com a facilidade de emitir opinião sobre tudo e com o respaldo do anonimato, qualquer um fala o que quer sobre o que quiser. E o pior é que nem sempre o que escrevem tem a ver com o assunto da matéria e postar um comentário parece ser mero exibicionismo, um mecanismo fugaz e inútil para o debate em questão.
Usarei como exemplo a reportagem recém-publicada no Correio Popular com o título "Ponte Preta e Guarani vivem situações opostas". Com exceção de um ou outro comentário lúcido, a maior parte das opiniões omitidas por "anônimos torcedores" não passa de papo furado. Usam o espaço, na verdade, para desferir piadas (quase todas de mau gosto) sobre o time rival, seja lá qual for a informação divulgada pela notícia correspondente. Em suma, o leitor-internauta, no geral, faz da liberdade de expressão o mais grosseiro e covarde retrato da democracia. Oras, se o direito de se manifestar é legítimo, como impedir que fulano ou beltrano faça o que bem entender com a gramática, com a lógica, com a reflexão e com o distanciamento que nenhum fanático pode ter? Não fosse a falta de identidade, duvido que alguém teria coragem de fazer juras de morte, usar cor, religião ou opção sexual como argumento, dizer palavrões sem sentido, ofender a mãe do torcedor rival e, é bom que se diga, condenar o repórter à fogueira jornalística pelo simples prazer de...opinar.
Liberdade é isso. Se de um lado, permite sem restrições de classe ou formação intelectual que qualquer um tenha o mesmo direito e espaço para dizer o que pensa, de outro, mostra que ainda estamos muito longe de transformar seus benefícios em debates que nos tirem da trilha óbvia e cega daquela velha opinião formada sobre tudo.