JOSÉ ERNESTO

O galo virou galinha

José Ernesto dos Santos
faleconosco@rac.com.br
20/04/2013 às 07:00.
Atualizado em 25/04/2022 às 19:29

Nos idos de 1956 o Botafogo lutava bravamente para atingir a então chamada primeira divisão. Chegava perto, muito perto, mas perdia a partida final. Seu apelido, pelos sobe-desce, era yo-yo (para os mais jovens, que hoje usam vídeo game e computador, o yo-yo era um brinquedo muito popular que consistia numa pequena roda que correndo num barbante preso ao dedo a fazíamos subir e descer. Emocionante. Mais emocionante somente o bilboquê).

Esse sobe e desce havia sido repetido em ano anterior, numa final contra o Radium de Mococa, que teve até um pênalti defendido pelo seu goleiro, Brasão. Lembro-me que vi esse jogo na arquibancada de madeira atrás do gol da Bartolomeu de Gusmão. Era muito pequeno, mas tenho em minha memória a imagem desse goleiro como do Capitão América.

Pouco antes de 1956 o Comercial era refundado, pois hibernara por mais de década. Mas é o Botafogo que vai às finais do campeonato da segunda divisão contra o Paulista de Jundiaí. O Galo de Jundiaí contra a Pantera da Mogiana. O título foi decidido depois de três jogos. No primeiro, em Luiz Pereira, o Botafogo venceu por 1 a 0. A segunda partida foi realizada em Jundiaí, o Paulista saiu vitorioso: 3 a 1.

Foi necessário então marcar mais um jogo em campo neutro. O escolhido foi o Parque Antarctica, na Capital. A via Anhanguera em grande parte era de terra e não existiam tantos ônibus ou aviões na rota como hoje. Formou-se uma grande torcida que deixou Ribeirão Preto de trem pela saudosa Companhia Mogiana de Estrada de Ferro (não se esqueçam, transportou por décadas o ouro negro de Ribeirão para o Porto de Santos).

Nove horas de trem, com uma baldeação em Campinas. Entre os “hooligans” tricolores o seu Milton Perez (do Paraíso das Sedas) era dos mais animados. Jogo difícil, decidido em um gol, no primeiro tempo. O juiz apita o final do jogo: Botafogo campeão! Comemoração nas arquibancadas em São Paulo. Foguetes e passeata em Ribeirão Preto.

Eis que surge uma grande surpresa: o seu Milton pula o alambrado, e corre à frente à turba do Paulista com o cartaz: “Coitado do galo, virou galinha”. Não teve muito tempo de mostrar o cartaz. Quase virou canja. A cena foi fotografada e estampada nos jornais de São Paulo, em especial pela Gazeta Esportiva.

Passados mais de 50 anos fui dar uma aula em Jundiaí e no jantar que se seguiu a aula, sentei-me com amigos entre eles um cardiologista local, tão encanecido quanto eu. Prosa vai prosa vêm e esgotadas as discussões sobre colesterol e fatores de risco para doenças do coração, vem um assunto mais cardíaco: as preferencias clubistas.

Ele me diz: “Temos um acerto antigo com vocês do Botafogo”.

Respondo: “Os acertos são agora desnecessários, pois estamos todos na divisão especial!”.

E ele completa: “Não é com um senhor que terminado o jogo no Parque Antártica exibiu um cartaz com os dizeres: O Galo virou galinha”.

Digo: “Ele é meu amigo”.

Ele completa: “Se ele vier em Jundiaí ainda o pegamos”.

Rimos bastante. Rimos mais ainda, quando contei ao seu Milton, que eu visitava em alguns sábados no seu comercio na Rua General Osório e era sempre convidado para um café.

Lembrando esse fato, penso que tanto esforço se faz em marketing para tornar uma mensagem lembrada e às vezes esse esforço é sobrepujado por uma mensagem simples, mas que associada à emoção do momento, pode torná-la lembrada por décadas. Seu autor de mesma maneira permanece em minha memória pela sua alegria e seu esforço para que nas festas em sua casa o nosso copo de cerveja nunca ficasse vazio.

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