ig-zeza-amaral (AAN)
O Brasil, o meu país, o nosso país, raro leitor, está acima dos interesses de um grupo de legisladores, juízes e executivos de todas esferas republicanas. São eles todos funcionários do Estado e o Estado somos nós, seus patrões. E são eles que agem como se fossem os patrões do povo, desse ente amorfo, segundo eles, que dedica cinco meses ao ano de impostos, o mesmo que lhes garante fartos salários que, bem sabemos, segundo as leis que eles mesmos regem, garantem também impunidades constitucionais e tantas outras mordomias que, ao tempo que são legais, ao fundo das nossas necessidades republicanas, são imorais.Não quero falar dessas coisas imundas da política, pois nem mesmo as entendo como políticas, visto que do lodo só nasce o lodo, do mal só advém o mal, e o bem está em cada lar dos brasileiros que levantam cedo para enfrentar mais um dia de sobrevivência. Quem nos cuida politicamente é o mesmo que nos maltratam, os políticos, sempre eles, a cuidar de seus interesses pessoais, sem se importar com a falta de ética que fará seus filhos e netos corarem de vergonha pelos seus abjetos atos.Não adianta nada escrever o que o raro leitor já sabe de cor e salteado. Mas insisto. Escrevo aqui e o raro leitor lê acolá, e os políticos seguem a sua ladainha demagógica, populista, e, de algum modo, gozando de nossas angústias, dos nossos reclamos, pois, a bem saber, eles estão sãos e salvos pelos escaninhos da legislação, sempre ela, oferecendo brechas para que prossigam nessa procissão sem velas, santos e turíbulo, ao caminho das falsas luzes que a soberba acende pelos seus caminhos. Escrevo por força do ofício de honrar a Constituição do meu país. E também o faço em nome de todos os trabalhadores deste país, não apenas para justificar a pena ou o teclado do computador (a que ponto chegamos, hein, Johannes Gutenberg?), mas, por todas as dores e vergonhas que tais políticos nos provocam, pelo muito que ganham e pelo pouco que produzem para nos dar um alento de melhores dias, nem tanto ao momento, mas, sim, de uma futura esperança para nossos filhos e netos, ao futuro das histórias de nossas famílias, de nossas vidas enfim.Gostaria de escrever sobre as velhas paineiras da Orosimbo Maia que ainda resistem por lá. E lembro que há trinta anos o saudoso Jota Toledo brandiu a sua pesada bengala Escalibur para protegê-las contra a motosserra da CPFL. Até então ninguém sabia que as paineiras da citada avenida compunham o maior acervo do planeta. Quase metade pereceram; e as poucas sobreviventes seguem florindo e oferecendo suas macias painas à cidade; e cada uma floresce, agradecida, ao velho Jota Toledo.Gostaria de falar mais do Bruninho, um dos melhores zagueiros que já vi jogar; das mulheres que o Bernardo Caro pintou com elegância e sensualidade; da santa ingenuidade da Gilda, moça de outrora beleza e mansa loucura; do velho Mané Fala Ó, sempre querendo prosa e carinho; dos bons italianos que dirigiam os bondes da cidade, patriarcas da família Scandiffio; dos italianos da Adega Florence; e do meu perenal amigo Walter de Almeida, dono do grande Circo e Teatro Irmãos Almeida que me ensinou a viver entre o tempo real e o sonho.Meus filhos me cobram para escrever sobre o que tive na vida, meus prazeres e dores, das ilusões, das minhas memórias nem tanto assim tão velhas; e alguns velhos companheiros acham que devo continuar escrevendo sobre as maldades da política.Estou enjoado dessas coisas de política. Acho que nos últimos quarenta anos já escrevi o suficiente para atestar que a velha república e o lullo-petismo acabaram por fadiga de material. Lulla já era. E aguardo que os meus raros amigos petistas aceitem a realidade tal como ela é. O PT já era, repito; e eles terão de repensar suas vidas, achar novos horizontes, voto distrital, essas coisas. Questão de tempo e paciência; mas, jamais!, de omissão e do passar de mão em ingenuidades políticas.Gostaria de escrever sobre o meu velho passarinho que, após quatro meses de troca de pena, voltou a cantar na varanda do apartamento. E uma nova família de rolinhas também nasceu nos buracos das calhas do estacionamento do prédio vizinho. E a trepadeira de sapatinho de judia floriu na varanda da vizinha. E segue a vida assim. E o resto não tem importância. É isso. E amanhã é sexta-feira, depois vem o sábado, o domingo e um belo frango atropelado. É isso.Bom dia.