Um zumbido ecoa forte nos ouvidos de governantes dos mais diferentes recantos do planeta, fruto de manifestações que tomam conta de praças e ruas de tradicionais centros urbanos. Em Istambul, na Turquia, a multidão derruba barricadas, enfrenta a polícia e ocupa o mais importante espaço de concentração popular, a praça Taksim, em revolta contra o governo, que pretende construir, na maior área verde da capital o parque Gezi, um shopping center.São Paulo e Rio de Janeiro são palco de movimentos que arrastam grupos dos mais variados setores da sociedade em passeatas que culminam em vandalismo. O foco das ações mais retumbantes nas duas principais capitais do País é o protesto contra o aumento das passagens de ônibus. Mas palavras de ordem, ecos e ruídos de grupamentos diversos também se fazem ouvir pelo território, a expressar uma locução em defesa de interesses de classes, etnias, gêneros e religião, entre outras frentes.A par das intenções explícitas de cada movimento, que lição se pode tirar da efervescência social que se expande pelos continentes e que se acentua em nossos trópicos?O pano de fundo sobre o qual se projeta o cenário de movimentos populares, protestos e ondas de insatisfação deixa ver duas crises: a econômico-financeira e a política. A primeira, deflagrada em 2008, implicou estagnação do crescimento das nações, elevadas taxas de desemprego etc. Na esteira da crise financeira, emergiu em 2011 o movimento Occupy Wall Street, em Nova York, cujo escopo traduzia a inconformidade com as desigualdades, a corrupção etc., bandeiras que passaram a ser desfraldadas noutras praças mundiais.A segunda crise, a da política, tem a ver com a metáfora da panela de pressão: a válvula entupida não deixa escapar o vapor, gerando, assim, o “estouro da boiada”. Mais precisamente, a ausência de respiro democrático jogou o povo nas ruas para exigir a abertura de canais de participação política e o fim de sistemas opressores.Os mecanismos clássicos da política saíram dos eixos: os espectros ideológicos perderam as cores originais; partidos transformaram-se em entes pasteurizados; os parlamentos, sem força, tornaram-se reféns dos poderes executivos; as bases partidárias arrefeceram os ânimos. Formou-se imenso vácuo entre a política e a sociedade.Ganha corpo a hipótese de que essa gama de manifestações, aqui e alhures, é o primeiro desenho de democracia participativa na contemporaneidade. O florescimento dessa modalidade é uma resposta ao desencanto com os costumes da velha política e suas promessas não cumpridas e, ainda, uma crítica aos precários serviços públicos.Sabe-se que, ao lado de questões objetivas, como redução do preço de passagens de ônibus, refrãos de um discurso mais abrangente são entoados, alguns proclamando “o aborto livre”, outros exigindo o fim das discriminações.O clamor das turbas ganha volume em todo o País, a denotar insatisfação com o establishment. Os tempos são outros, mas Castro Alves continua lembrado: “A praça é do povo como o céu é do condor”. Mas a praça não pode e não deve ser espaço para a violência.