ig - Rodrigo Moraes (CEDOC)
Nomes... Meu avô nos matava de rir com a história de um sujeito chamado Crepúsculo Matutino — Crepúsculo Matutino Glória e Honra Ao Brasil de Oliveira Garcez. O pai, inspirado pelo alvorecer de um Sete de Setembro de antanhos, achou uma justa homenagem à Nação batizar o filho, nascido nesse dia, com um antropônimo tão retumbante. O genitor, a propósito, deu a outros dois filhos nomes deveras imaginativos: Muntei Rodei Tornei a Muntá — porque havia caído do cavalo quando foi buscar a parteira para o nascimento do menino — e Dumberque — era para ser “Dunquerque”, talvez em homenagem ao célebre episódio da 2ª Guerra Mundial, mas pai e escrivão se atrapalharam na hora do registro. Nomes estranhos têm algo de almanaque, de curiosidade de pé de página. Não acho que tornem o seu portador ridículo — antes, o ridículo exposto é o de quem, por ingenuidade, extravagância ou mesmo maldade (vide Maria Bastarda Dequem, que não soa como algo surgido de boas intenções), engendrou o nome. Mas isso não impede que sejam um fardo pesado demais: em O 'Anedotário da Rua da Praia', de Renato de Sá Maciel Jr., há a história de uma rapaz que teria tentado suicídio porque chamava-se algo como Plupudingonton, sabe-se lá por que delírios de quem lhe registrou. Há uma lista interminável deles, alguns talvez já perdidos no tempo, em meio à poeira e traças. No Anedotário..., Sá Jr. cita o poético e boêmio Luzindo Luar da Silva — que talvez fosse, na verdade, sujeito abstêmio e severo. O escritor lista também o Cunegundo Fuggido, o Mário Sete Paus, a Maria da Glória Zoltand Fumassa... E basta uma pesquisa no Google para eles surgirem aos borbotões: João Da Mesma Data, Juliopardo Beterraba Antuhérpes, Lírio Dengoso Gaylor, Antônio Manso Pacífico de Oliveira Sossegado, Manganês Manganésfero Nacional. Dizem que nomes próprios são a projeção do que os pais desejam para os filhos — para o bem ou para o mal, haja visto a pobre Falidora Da Fortuna Dopai, cujo nascimento o autorreferido genitor não deve ter visto como algo muito auspicioso, pelo menos financeiramente falando. Em artigo no site da Fundação Joaquim Nabuco, Maria do Carmo Andrade afirma que o nome próprio “é uma espécie de etiqueta, carimbo ou marca de fundamental importância na vida de uma pessoa, pois além de ser a principal forma de individualização na sociedade, indica também sua ascendência familiar.” Mas há aqueles que subestimam ou supervalorizam essa importância, e se saem com aberrações. Como diz a autora: “Alguns pais, na ânsia de demonstrar seu carinho, sua felicidade de homenagear algum ente querido, de mostrar sua erudição, religiosidade ou mesmo dar ao filho um nome único, especial ou importante, se empenham (ou não) tanto na escolha que acabam registrando a prole com nomes bizarros ou ridículos”. A pessoa chamada Produto do Amor Conjugal De Marichá E Maribel que o diga. Meu nome completo é Rodrigo de Deus Vieira de Moraes, e houve uma época em que passei a sentir vergonha dele após ser alvo das chacotas dos colegas de escola. Na medida do possível, omitia a parte “carola” do meu sobrenome, mas bastava a professora pronunciá-lo durante uma chamada ou um funcionário anunciá-lo em sala de aula para entregar um comunicado qualquer: a classe vinha abaixo. O curioso é que herdei-o de meu avô materno, que, a propósito, chamava-se Deburgo (cuja origem é obscura). Deburgo era filiado ao PC do B e, por coerência partidária e ideológica, ateu. Isso não o impediu de batizar minha mãe como Maria da Glória de Deus Vieira — não sei se o “efeito beata” foi intencional, mas assim ficou. No mais, hoje sou alvo das admoestações do colega jornalista Kléber Tomaz, que sempre que me encontra, diz não se conformar com o fato de eu não assinar meus textos como “Rodrigo de Deus”. Concordo com ele, é muito mais sonoro.