indefinição de valores e atitudes estressa as pessoas, em geral. Maioria prefere algo pronto e resolvido
A indefinição de valores e atitudes estressa as pessoas, em geral. A maioria de nós prefere algo pronto e resolvido, que não promova muito a angústia da dúvida. Isso atinge maduros e jovens, mesmo com a decantada tendência juvenil de discordar de situações conservadoras. O universo das relações afetivo-sexuais, nesses tempos atuais, está muito diversificado, com tantos modos de interação que às vezes parece faltar um modelo mais assimilável por uma maioria. As pessoas mais tradicionais muitas vezes se sentem perdidas diante dessas escolhas e circunstâncias, pois se lembram como tudo parecia mais fácil... Há cerca de meio século, sabia-se, por exemplo, se a moça era moralmente forte, se “prestava” ou não, pela escola que cursava, pelo clube que frequentava, pela família que representava. É claro que, se essa perspectiva fosse pensada mais a fundo, mesmo no passado, em várias oportunidades as aparências poderiam confundir os envolvidos. Mas o que se via costumava prevalecer para a maioria, ainda mais que a intimidade permanecia ocultada. Um moço devia se casar com uma virgem, mulher que preservasse o hímen, mesmo que ela tivesse praticado alternativas sexuais (oral, anal). As que já tinham engravidado amassavam o abdome, reduzindo o volume do útero fecundado e do feto para caber em um vestido de noiva que disfarçasse a “sem-vergonhice”. Mario Vargas Llosa comenta em um dos seus mais conhecidos romances (Tia Julia e o escrevinhador), ambientado na Lima dos anos 50: “... garotas ... costumavam chegar virgens ao casamento e só deixavam tocar em seus seios e sexo quando o namorado ascendia ao posto formal de noivo”, e relata episódio em que, durante a festa de seu casamento, a noiva desfalece. Um médico a examina e observa que, ao tirar a cinta, o ventre dela “havia literalmente pulado para fora”, caracterizando uma gravidez de 3 a 4 meses... Até a Revolução Sexual dos anos 60 e o feminismo revigorado das últimas décadas, as mulheres eram classificadas em “namoráveis” (casáveis), feitas para o compromisso, o casamento, a família, e as “transáveis”, usadas para o deleite sexual. As polarizações morais de tais estereótipos trouxeram um drama para as mulheres, desvalorizando-as e reduzindo-as às decisões machistas. E um enorme problema para os homens, a síndrome “Madonna-Whore”, situação esdrúxula em que o sujeito restringe o seu erotismo: fica impotente diante da esposa (ela representa uma espécie de Virgem Maria) e somente se libera à excitação sexual com as que simbolizam uma prostituta. As transformações culturais abriram caminho nestas muralhas do moralismo falocentrado, iniciando as mudanças de valores femininos e da simbolização da mulher para os homens. O processo continua, já andou bastante, porém ainda tem muita resistência a enfrentar. E está em um momento dúbio, cuja instabilidade promove incertezas e temores. A época coetânea é muito melhor, mas ainda carecemos de evolução afetiva que só estará aprimorada quando, independentemente do gênero e da decência convencional, caracterizar qualquer pessoa com potencialidade de amar e ser amado. Um movimento iniciado há alguns anos por algumas mulheres do Canadá, tem reiterado os esforços contra o machismo. Depois que um policial canadense argumentou que as mulheres deveriam evitar se vestir como “vagabundas” para não se tornarem alvo de estupro, durante palestra sobre segurança em uma universidade, elas se revoltaram. Alguns dias depois, vestidas com roupas curtas e decotadas, mais de 2.000 mulheres foram às ruas em Toronto protestando com cartazes: “não diga como devemos nos vestir, diga aos homens para não estuprar”, ou “é meu corpo e faço o que quero com ele”. A mesma marcha se multiplicou e ganhou destaque em países como França e Estados Unidos. Chegou também ao Brasil. Na época, São Paulo promoveu a versão brasileira muito bem humorada da chamada "Slut Walk", ou “Marcha das Vagabundas”... As ruas podem efetivamente compor cenários para essas manifestações, mas muitas vezes o agito se resume a uma grande e até divertida movimentação que não se sustenta na sequência. No comportamento extremo e criminoso do estupro ou na classificação social que pretende preconceituosamente polarizar as mulheres entre parceiras para sexo ou companheiras para a vida, o moralismo de fachada segue impregnando as pessoas e afastando nocivamente o sexo do amor. Precisamos verdadeiramente liberar os pares amorosos. O namoro, o sexo casual, as perspectivas de um casamento devem se desprender do protocolo das mulheres adequadas para relação com compromisso ou restritas ao prazer descomprometido. A melhor tendência para os atraídos e enamorados é a de seguirem suas inspirações sentimentais. Só o amor mais espontâneo e natural é capaz de nortear a construção de um vínculo sincero e intenso, erótico e afetivo, seja em uma única noite no motel ou na convivência até a morte.