bebida

Na boca do povo

Cerveja artesanal vira a queridinha dos amantes da bebida tanto em casa como em bares que saíram em busca de uma receita própria

Kátia Camargo
26/08/2019 às 14:32.
Atualizado em 30/03/2022 às 17:14

Não é de hoje que a cerveja artesanal anda invadindo os copos, canecas, bares, as casas e o coração de muita gente. Quem diria que a mistura de água, malte, lúpulo e levedura poderia ganhar ainda um quinto elemento que ‘promove’ a cerveja artesanal para ‘cerveja com alma’. Pois saiba que isso tem se tornado cada dia mais comum e tem muita gente querendo uma cerveja para chamar de sua. A composição dessas bebidas artesanais conta com características marcantes e únicas com diferentes cores, sabores, aromas e texturas. Uma das recentes ‘cervejas com alma’, desenvolvida pela Toca da Mangava, foi feita para o casal Elizabete e Junior Pattaro, proprietários do Empório do Nono. Eles queriam marcar de forma especial os 20 anos da casa e buscavam algo que fosse significativo tanto para eles (que sempre viveram em Barão Geraldo) quanto para os amigos e clientes que colecionaram nesses 20 anos de estrada. “Tivemos a ideia de incluir a pimenta biquinho e toques de limão siciliano e o resultado ficou surpreendente”, conta Junior. A ‘poção mágica’ ficou a cargo do engenheiro de alimentos e cervejeiro da Toca da Mangava Alfeu Júlio. Para isso, ele fez diversas pesquisas e testes até conseguir chegar ao produto final. “Foram pelo menos dois meses de experiências, experimentos, degustações. Ainda não tinha feito nenhuma cerveja que levasse a pimenta biquinho no preparo. E, para ser bem sincero, não conheço ninguém que ofereça essa combinação. Vale lembrar que as bebidas artesanais agregam muito da cultura local e acabam ganhando uma personalidade exclusiva”, conta. Tanto que a cerveja do Empório do Nono conta até com uma ilustração no rótulo feita pelo chargista e cartunista Dalcio Machado. A pimenta entrou na história da cerveja de Elizabete e Junior pois combina com a chamada comida de boteco, mas não é todo mundo que gosta. “Se optássemos por uma malagueta ou uma habanero, por exemplo, o resultado poderia não agradar. Ao criar uma cerveja, os ingredientes são adicionados com parcimônia, sejam eles pimenta, limão, camomila, cereja ou outros. A ideia é que os sabores sejam sutis. Não é para ser um chá de camomila. É uma cerveja. No caso do produto desenvolvido para o Empório do Nono, fizemos um pequeno ajuste na quantidade da pimenta no segundo lote da bebida”, completa o mestre cervejeiro. Alfeu explica que a cerveja Empório do Nono é uma versão Session da categoria IPA (IndiaPale Ale), portanto com o mesmo perfil de aromas e sabores de seu estilo base, porém, com menor teor alcoólico (5,1%). “A pessoa bebe no fim do dia e, no dia seguinte, está bem para trabalhar. A IPA é a porta de entrada para o universo das cervejas artesanais”, diz. A edição da bebida feita especialmente para os festejos do bar é chamada de chope, já que a bebida não é pasteurizada. Ao todo, serão dois mil litros produzidos na primeira etapa, parte em barril e parte em garrafa de 500ml, que estará disponível no restaurante até outubro deste ano. Alfeu Júnior conta que cada dia mais bares, empresas e pessoas físicas têm procurado a Toca da Mangava para desenvolver produtos que as representem. “Cada pessoa ou empresa chega com um demanda diferente. E buscamos colocar dentro da garrafa parte dos gostos e personalidade dela”, conta. Segundo Júnior, o crescimento do nicho das artesanais segue a mesma ascensão do vinho. “O paladar das pessoas para cerveja está mais apurado. Como ocorreu há anos com o vinho, havia poucas opções. Com a globalização e o acesso à informação, as pessoas conheceram outras opções e ficaram mais exigentes, conhecedoras”, completa. A facilidade de produzir em pequena escala é um diferencial das nanocervejarias artesanais, como a Toca da Mangava. Por definição, uma cerveja artesanal não deve ser filtrada e nem pasteurizada, processos que prolongam o prazo de validade da bebida. “Quanto mais fresca a cerveja, melhor. O ideal é que ela seja mantida gelada. Quanto mais tempo ela permanecer gelada, mais próximo do sabor original da bebida. O recomendado é consumi-la em três ou quatro meses”, esclarece Júlio.       Amor além das cervejas artesanais O biólogo André Freitas, 48 anos, e a digital influencer Graziela Chagas, 39 anos, começaram a desbravar juntos o mundo das cervejas artesanais em 2013 e nunca mais pararam. “Foi o André que me apresentou esse universo das cervejas artesanais e eu gostei tanto que virei freguesa. Apreciamos muito o sabor e a qualidade desses produtos”, conta. Ela conta que um belo final de tarde, em Barão Geraldo, é sempre uma boa desculpa para o casal sair de casa e saborear mais uma que não provaram. “Vamos conhecendo e virando fãs de novos e diferentes sabores”, destaca. Mercado em alta De acordo com a Associação Brasileira de Cerveja Artesanal (Abracerva), em dez anos o Brasil foi de 70 para 700 cervejarias. Só no último ano o crescimento foi de 35%. Se por aqui as cervejas artesanais ganham força a cada dia, na Europa, países como Alemanha, Bélgica e Inglaterra esse costume já dura pelo menos mil anos. O presidente do Polo Cervejeiro da Região Metropolitana de Campinas, Alexandre Montagnana Vivente Leme, conta que nos últimos três anos surgiram 10 novas cervejarias, totalizando 24 na região. Diversidade de estilos Segundo Marcos Roberto dos Santos, docente do Senac Campinas e sommelier de cervejas, especialista em harmonização e experiências em tour cervejeiros por Europa, Estados Unidos e Brasil, o motivo do aumento do interesse pela cerveja artesanal está diretamente ligado a maior expressividade das cervejas artesanais na região de Campinas e, claro, em todo o Brasil. “O leque de opções de aromas e paladares que a cerveja artesanal propõe faz uma diferença muito grande. Considero que o lado bom das artesanais é exatamente a diversidade de estilos disponíveis, de forma que sempre haverá um estilo que agrada diversos gostos. Inclusive, a preferência por sabores e texturas é independente de sexo, pois aquele entendimento de que cervejas fracas são para meninas e as mais fortes para os meninos é, muitas vezes, algo fora da realidade para os apreciadores da cerveja artesanal”, explica Santos. Não é de hoje que o interesse pelas loiras artesanais existe, porém, a demanda era baixa. “Anos atrás, a procura existia, mas, infelizmente, a busca era de poucos e as opções também eram mais restritas. O aumento do conhecimento e existência de mais opções de pontos de venda, nos últimos dois anos, cresceu bastante, desta forma, por consequência, a procura também aumentou e os lugares que proporcionam essa oportunidade de conhecer a cerveja artesanal também”, explica o sommelier. E nada de separar cerveja pelo sexo. “Não existem tipos que podemos apontar diretamente a homens ou mulheres. Hoje, temos consumidores, tanto mulheres quanto homens, que apreciam cervejas mais leves como Pilsen como há também as pessoas que adoram tomar uma IPA (que é um estilo que traz um pouco mais de amargor)”, diz o expert. Para saboreá-las de forma correta, as cervejas artesanais devem ser consumidas em temperaturas diferentes e adequadas de acordo com o estilo, mas o ponto, claro, é que nunca deverão ser servidas estupidamente geladas como as cervejas tradicionais (massivas). “Podemos em casa manter a bebida em temperatura normal de geladeira, que geralmente está entre 5ºC e 7ºC dependendo da prateleira. Se por acaso, for uma cerveja que deva ser servida em temperaturas mais altas, como, por exemplo, uns 10ºC, basta retirar uns minutos antes e deixar a cerveja atingir uma temperatura mais adequada”, diz Santos. Uma boa orientação é que as cervejas sejam sempre mantidas na posição vertical, diferente do conceito horizontal do vinho. E outra dica importante é que devem estar armazenadas com cuidado e não expostas a fontes diretas de calor e ambiente seco. Chope ou cerveja? No mundo todo, independente de como é acondicionada, o nome adotado é cerveja. No Brasil, quando é armazenada em barris, sob pressão, é conhecida como chope (ou chopp), derivada da palavra alemã schoppe, que significa “copo de meio litro”. Acredita-se que essa era uma medida utilizada para pedir a cerveja armazenada no barril nos balcões dos bares e, com o tempo, a expressão passou a ser utilizada pelos brasileiros. Tanto a cerveja como o chope possuem os mesmos ingredientes e seguem, basicamente, os mesmos processos de produção. A única diferença é que a primeira ao final da fabricação é pasteurizada e a segunda, não. No entanto, há algumas cervejarias que pasteurizam o chope para ampliar o seu prazo de validade. Já as cervejas artesanais não são pasteurizadas e, por esse motivo, muitas vezes são denominadas chopes. Nos últimos três anos, surgiram 10 novas cervejarias na região de Campinas. Atualmente fazem parte do Polo Cervejeiro 14 cervejarias. Na região, estima-se um total de 24 cervejarias. “É um mercado que estimamos movimentar 10 milhões de reais por ano em nossa região”, diz o presidente do Polo Cervejeiro da Região Metropolitana de Campinas (RMC), Alexandre Montagnana Vicente Leme.

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