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Tunísia debate grandes reformas sociais, inéditas no mundo árabe

Uma comissão tunisiana propôs nesta quarta-feira (20) uma série de amplas reformas sociais, em alguns casos sem precedentes no mundo árabe, sobre a descriminalização da homossexualidade ou a igualdade na herança, abrindo assim o caminho para debates profundos em um contexto político tenso

AFP
20/06/2018 às 10:40.
Atualizado em 28/04/2022 às 13:25

Uma comissão tunisiana propôs nesta quarta-feira (20) uma série de amplas reformas sociais, em alguns casos sem precedentes no mundo árabe, sobre a descriminalização da homossexualidade ou a igualdade na herança, abrindo assim o caminho para debates profundos em um contexto político tenso.A "Comissão para Liberdades Individuais e Igualdade" (Colibe) foi criada em agosto de 2017 pelo presidente Béji Caïd Essebsi. Em seguida, um painel de especialistas foi convocado para propor reformas para adaptar o arsenal jurídico à Constituição de 2014 sobre essas questões.Depois de várias consultas, a Colibe entregou ao presidente, em 8 de junho, 230 páginas de propostas que modificam alguns princípios inspirados no Alcorão.Essas propostas foram elogiadas por defensores dos direitos humanos, mas chamadas de "terrorismo intelectual" por uma federação de associações religiosas.- Bem-estar individual -Essas reformas querem trazer "bem-estar para cada indivíduo", considerando que "a liberdade é tão importante quanto o pão", explicou nesta quarta-feira o presidente da Colibe, Bochra Belhaj Hmida, ativista de direitos humanos.Mas a advogada ressaltou que o relatório permite que os tunisianos "discutam as questões substantivas".Os autores previram várias alternativas para as reformas mais delicadas, como a igualdade na herança - controvertida em muitos países muçulmanos - entre irmãos e irmãs, filhos e filhas, pai e mãe.A atual legislação tunisiana, baseada no Alcorão, estipula que as mulheres herdam metade do que corresponde aos homens com o mesmo grau de parentesco, embora permita derrogações.Outra questão delicada, nunca debatida na esfera pública, é a abolição do prazo de viuvez, imposto a mulheres divorciadas ou viúvas antes de se casar novamente.A comissão também propõe a "abolição total" da pena de morte, ou limitá-la aos crimes que levaram a uma morte.- Fins eleitorais -Também defende a descriminalização da homossexualidade, abolindo o artigo 230 que pune as práticas homossexuais, e proibir o teste anal, muitas vezes imposto quando supostos homossexuais são detidos ao abrigo desta legislação.Embora a Tunísia seja tradicionalmente vista como pioneira no mundo árabe sobre os direitos das mulheres, Colibe é vista como um produto da vontade do presidente Essebsi de deixar uma marca na história.Inspira-se, portanto, em Habib Bourguiba, primeiro presidente da Tunísia independente, que modernizou o estatuto das mulheres.Trinta ONGs de defesa dos direitos humanos ou democráticos, exortaram o presidente a "transformar em lei as esperanças suscitadas" pela Comissão, "aceitando suas recomendações".Mas uma federação de associações religiosas expressou seu protesto, chamando as propostas de "terrorismo intelectual que quer erradicar a identidade da Tunísia, para deixar o nosso povo sem religião e sem qualquer referência", criticou Sabri Abdelghani, imã e membro da federação."Essas reformas são para fins eleitorais e querem seduzir a União Europeia", disse ele à AFP. "Há versos do Ccorão, tais como os relativas à herança e ao período de viuvez, que não podem ser submetidos a uma interpretação", explicou Abdelghani.Por outro lado, a lentidão do processo legislativo e a proximidade de importantes datas eleitorais poderiam dificultar as reformas."Estas propostas, mesmo que sejam boas e progressivas, podem ser manipuladas pelos conservadores para mobilizar seus seguidores" na campanha das eleições presidenciais e legislativas de 2019, de acordo com o cientista político Hamza Meddeb. "Desta firma, vamos testemunhar uma reação do campo anti-islâmico e progressista", acrescenta.kl/cnp/feb/gk/me/mb/mr

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