INTERNACIONAL

Antropólogo resgata participação de indígenas americanos no Dia D

Cerca de 500 dos 132.700 homens que desembarcaram nas praias da Normandia em 6 de junho de 1944 eram ameríndios, segundo um universitário americano, mas seu papel demorou décadas para sair das sombras

AFP
03/06/2019 às 07:30.
Atualizado em 30/03/2022 às 21:06

Cerca de 500 dos 132.700 homens que desembarcaram nas praias da Normandia em 6 de junho de 1944 eram ameríndios, segundo um universitário americano, mas seu papel demorou décadas para sair das sombras. "Durante a guerra, não havia nenhum jovem na reserva, todos estavam no serviço militar se fossem fisicamente aptos", diz Charles Norman Shay, que vai completar 95 anos, provavelmente o último veterano indígena americano do Dia D ainda vivo. Segundo Harald Prins, professor emérito da Universidade do Kansas, coautor de uma biografia desse ex-enfermeiro militar da tribo Penobscot, publicada em 8 de maio em inglês, 24 ameríndios morreram em 6 e 7 de junho de 1944 na Normandia."A maioria dos ameríndios da Segunda Guerra Mundial foram recrutados, apesar dos protestos de certos índios tradicionalistas. Mas por volta de um terço deles se alistou voluntariamente", diz o antropólogo em entrevista à AFP."Uma porcentagem muito elevada de jovens índios, vítimas da crise econômica, entraram no exército para ajudar financeiramente suas famílias", explica Prins, que lembra que até hoje o nível pobreza é muito alto em algumas reservas.Mas o "patriotismo" explica também o gesto de muitos deles, diz o universitário, acrescentando que os ameríndios participaram da Primeira Guerra Mundial.Entre 30.000 e 50.000 participaram da Segunda Guerra Mundial, 5.000 deles do Canadá e 44.000 dos Estados Unidos, mas não necessariamente na linha de frente, diz Prins. Milhares deles viveram fora das reservas em tempos de paz, diz. "Algumas gerações antes, [os índios] defendiam suas terras contra a expansão agressiva dos Estados Unidos", lembra.A Constituição dos Estados Unidos transformou os ameríndios em cidadãos americanos desde 1924, mas deixou que cada Estado decidisse sua aplicação. Na prática, eles tiveram que esperar até 1962 para que todos pudessem votar nos Estados Unidos, segundo o professor.Além das "discriminações" persistentes durante muito tempo, "é preciso lembrar que alguns índios americanos tradicionalistas rechaçavam esses direitos, por razões de soberania", especifica Prins.- "Pobreza" e "patriotismo" -Sessenta e cinco anos depois da operação Netuno, "as pessoas nos Estados Unidos e na Europa não são conscientes em geral do papel desempenhado pelos ameríndios na guerra contra a tirania nazista", constata.Mas seu reconhecimento está a caminho. Plumas, cores vivas, fumaça e espiritualidade começaram a aparecer discretamente nesses últimos anos em junho nas praias da Normandia.Para o 75º aniversário, está prevista uma cerimônia indígena apoiada pelo Estado francês, mas sem participação dos membros do governo, em Saint-Laurent-sur-mer, em Omaha Beach, onde se espera a presença de 80 indígenas americanos de cerca de 20 tribos.Em 6 de junho de 1944, 175 "nativos americanos" desembarcaram nesse lugar, segundo Prins, onde em 2017 Charles Shay inaugurou uma estátua em memória dos veteranos índios: uma tartaruga de granito, animal símbolo de longevidade e sabedoria.Três anos antes, a primeira cerimônia indígena oficial na Normandia aconteceu em Utah Beach, no Canal da Mancha, em homenagem aos 14 comanches que desembarcaram no Dia D como "code talkers".Esses agentes de transmissão utilizaram o idioma de sua tribo, incompreensível para os japoneses e os alemães. O diretor de cinema John Woo deu destaque a essa inestimável contribuição em 2002 em seu filme "Códigos de Guerra" (Códigos de guerra), com Nicolas Cage.Nos Estados Unidos, o Museu Nacional dos Indígenas Americanos em Washington "prepara ativamente" a inauguração em 11 de novembro de 2020 do primeiro monumento nacional em homenagem ao papel dos ameríndios nas guerras, segundo Prins.Mais um passo após as medalhas de ouro do Congresso entregues em 2013 a 250 índios de 33 tribos, a maioria póstuma. Em 2000, 400 soldados navajos receberam a maior recompensa civil americana. Já a França se orgulha de ter concedido o título de Cavaleiros da Ordem Nacional do Mérito aos "code talkers" em 1989, em uma cerimônia celebrada em Oklahoma.

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