COMPORTAMENTO

Jovens avós: mais tempo para criar memórias

A relação de afeto formada pela convivência entre diferentes gerações enriquece a experiência de vida, combate a depressão e cria adultos mais saudáveis

Cibele Vieira
25/07/2023 às 16:58.
Atualizado em 25/07/2023 às 17:01
Ângela com os netos Helena (4 anos), Dominic (6 meses) e Mauricio (14 anos) (Arquivo pessoal)

Ângela com os netos Helena (4 anos), Dominic (6 meses) e Mauricio (14 anos) (Arquivo pessoal)

Os avós já não são os mesmos. Aquela figura dos velhinhos de bengala tem ficado cada vez mais distante, pois a maternidade precoce e o aumento da expectativa de vida têm antecipado uma geração de avós jovens e bem-dispostos. A idade, entretanto, não muda em nada a afetividade e a permissividade tão presentes nas relações entre avós e netos. O paulistano Paulo Lima, especialista em Psicologia Clínica Infantil, mora e trabalha em Campinas há 24 anos. Com base em sua experiência clínica, onde observa questões de conduta e comportamento, ele é enfático em afirmar que “os avós fazem muito bem aos netos”. Paulo recebeu a notícia que ia ser avô um dia após a realização desta entrevista, e comemorou bastante.

Hoje a educação de muitos netos é quase terceirizada aos avós, que compõem uma rede de apoio importante para os filhos que precisam trabalhar e têm horários muito engessados. Nestes casos, a disponibilidade dos avós ajuda muito na dinâmica da família, pondera o psicólogo. “O zelo dos avós é sempre cercado de muito dengo e carinho, há uma boa troca. É como uma oportunidade para reviver a própria infância, a infância do filho e, no neto, ter a possibilidade de corrigir algo”, comenta. Para ele, essas vivências trazem uma clareza de vida e percepção para as crianças que é de grande valia.

Entretanto, em muitos casos, a presença constante dos avós pode ir além da colaboração. É quando os avós começam a desautorizar os pais, os netos podem apresentar problemas de conduta e comportamento. “É preciso lembrar sempre que a responsabilidade pela educação é dos pais, e favorece muito quando os avós respaldam e apoiam isso, principalmente no que diz respeito a atribuição de limites. Mas se há interferência no sentido de desautorizar ou criar divergências com os pais, além de inadequado não é saudável para a criança”, diz o especialista. 

O acolhimento dos avós cria um envolvimento afetivo maior no sentido da atenção, por estarem mais presentes. Paulo Lima observa que “mesmo reclamando do celular e dos jogos, a afetividade da relação e a disponibilidade fazem com que as crianças desenvolvam uma grande segurança na presença dos avós”. Ele ressalta que os pais têm como função acolher, orientar para o que é saudável e protetor da vida. E lembra: “se cultivar valores em casa, não terei problemas de comportamento”.

De repente, avó!

Ângela Maria Paschoal tinha apenas 39 anos quando o filho Thiago, de 18, contou que ela seria avó. “Não era esperada ou planejada, mas aquela gravidez foi uma das minhas maiores alegrias”, relata. Ela foi a primeira a saber. “Naquele momento percebi que precisava apoiá-los, pois eram muito jovens e estavam aflitos”, conta. Em 2009, se emocionou com a chegada deste primeiro neto, Maurício. Depois, em 2018, ela celebrou o nascimento de Helena, a segunda neta, em gravidez planejada pela filha Camila. No segundo casamento, o marido ganhou o neto Dominic, que tem seis meses e de quem ela se considera avó (e age como se fosse). E agora, depois de 14 nos, o filho lhe dará uma nova neta, programada para nascer em novembro.

“Ser avó é a melhor coisa que existe, é um sentimento que até dói de tão bom”, comenta, lembrando que enquanto mãe há a responsabilidade na criação, o que fica mais leve na relação com os netos. “Quando estou com eles me entrego total, amo estar junto, agora tenho mais tempo com eles do que tinha com meus filhos, e podemos fazer programas como ir juntos ao cinema, viajar juntos, temos diálogo”, conta Ângela, de 53 anos, que trabalha como agente técnica. “O amor é troca, eu posso passar minha experiência e vivência, e eles me devolvem juventude, despertam a criança dentro de mim”, completa.

A bisa Eliete (65 anos), a avó Crislaine (45) e a jovem mãe Isabela (20) (Arquivo pessoal)

A bisa Eliete (65 anos), a avó Crislaine (45) e a jovem mãe Isabela (20) (Arquivo pessoal)

Sem planejar, mas feliz!

Crislaine Gava tem 45 anos, é jornalista, e está curtindo a primeira neta que nasceu há menos de um mês. “Nada foi planejado, mas já não consigo mais pensar na minha vida sem a presença da neta Aurora”, conta. A filha Isabela mora na casa dos fundos e, embora com apenas 20 anos e adiando o sonho da faculdade de veterinária, “está surpreendendo como mãe, super dedicada”, comenta a nova avó. Crislaine brinca que “a neta é uma filha que já vem com açúcar” e a inspiração, diz, “vem passando pelas gerações: eu me inspirei na minha mãe, que sempre foi muito dedicada, e minha filha tem dito que se inspira em mim”.

Embora com estilos diferentes – a mãe expansiva e a filha mais reservada – elas entendem e respeitam o papel de cada uma. “Eu sei que a mãe é ela e respeito isso, aguardo sua autorização até para publicar uma foto, e ofereço apoio incondicional, mas sempre respeitando o que e quando ela quer. Sei meu limite no papel de avó e me considero uma rede de apoio, estarei sempre próxima para quando precisar e quiser”, ressalta Crislaine. 

Crislaine e Isabela um pouco antes do parto ()

Crislaine e Isabela um pouco antes do parto ()

O papel dos avós 

Além de um importante apoio familiar, a relação com os avós tem vários benefícios para os netos:

✓ Transmissão de conhecimento, cultura e histórias da família

✓ Percepção dos diferentes hábitos e costumes entre gerações

✓ Construção afetiva da identidade e noção de pertencimento

✓ Desenvolvimento de empatia e respeito para com os idosos

O que diz a ciência

Experimento conduzido pelo Boston College (EUA) observou durante 19 anos 374 avós e 356 netos. O objetivo era entender a influência dessa convivência, tanto na vida das crianças, como na dos idosos. Os resultados revelam que os dois lados se beneficiam desse relacionamento. Para os avós, a conexão permite uma abertura a novas ideias. Para os netos, os idosos oferecem um conhecimento de vida que acaba sendo incorporado quando eles se tornam adultos. Além disso, os pesquisadores relatam que a relação avós-netos pode diminuir sintomas depressivos para ambas as partes.

Outro estudo, coordenado pela Berlin Aging Study, mostrou que avós que cuidam de netos têm 37% menos risco de morte do que pessoas na mesma faixa etária que não cuidam das crianças. A proximidade emocional entre netos e avós é protetora da depressão e de outros transtornos mentais, além de favorecer habilidades socioemocionais. Já para a criança, sentir-se aceito e amado pelas avós contribui para a autoestima.

Dia Internacional dos Avós

O dia 26 de julho é a data para celebrar os avós em todo o mundo. Foi instituída em Portugal, em 2003, como homenagem a Santa Ana e São Joaquim (pais de Maria e avós de Jesus Cristo), considerados os padroeiros dos avós. O comércio se movimenta com a comemoração desta data, incentivando presentes como forma de agradecimento por sua existência.

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