Valter Sant’Anna descobriu o câncer de próstata há 11 anos em um exame preventivo,, se tratou e faz acompanhamento, levando vida normal (Rodrigo Zanotto)
Na primeira semana de novembro, os fãs do rock tiveram uma péssima notícia: Andy Taylor, ex-guitarrista da banda Duran Duran, revelou que foi diagnosticado com câncer de próstata no estágio 4 (o mais grave). A informação abala, mas também alerta para um dado importante: quando diagnosticado precocemente, a chance de cura ultrapassa os 90%, segundo o Instituto Nacional do Câncer (Inca). O câncer de próstata tem a segunda maior incidência de cânceres em homens (o primeiro é pulmão). A estimativa do INCA é de 65.840 novos casos para este ano, segundo o estudo feito para o triênio 2020-2022.
A importância da prevenção e do rastreamento precoce da doença por meio de exames são lembrados neste mês na campanha ‘Novembro Azul’. Pesquisa realizada pelo Instituto Lado a Lado Pela Vida mostrou que 62% dos homens brasileiros visitam o médico apenas quando os sintomas de qualquer doença se tornam insuportáveis. Outro levantamento, do Centro de Referência em Saúde do Homem de São Paulo, mostra que 70% deles procuram um consultório médico sob a influência da mulher ou de filhos e mais da metade desses pacientes adiaram a ida ao médico e chegaram com doenças em estágio avançado.
Escolha viver
Cada vez mais pesquisas comprovam que a saúde, mais do que genética, é consequência de escolhas e hábitos de vida. “Hábitos saudáveis e acompanhamento de saúde preventivo fazem o caminho para o envelhecimento com qualidade de vida”, alerta Leonardo Oliveira Reis, especialista em Oncologia Urológica e Doenças da Bexiga e Próstata e coordenador da disciplina de Urologia da Faculdade de Ciências Médicas da Unicamp. Ele alerta que os exames preventivos – toque retal e exame laboratorial – são simples, rápidos, eficientes e evitam muitos problemas e até exames mais invasivos.
A apalpação da glândula prostática, segundo ele, revela muitas informações e com o diagnóstico precoce a incidência de cura pode chegar a 98% dos casos. “Mas esse percentual vai caindo à medida que a doença avança e ela é silenciosa”, diz. O protocolo é fazer os exames iniciais de avaliação a partir dos 40 anos, se não houver antecedentes (pai, irmãos ou tios) e neste caso a recomendação é antecipar. Entretanto, a faixa etária de maior risco de incidência da doença é entre 55 e 67 anos de idade. “Quando fazemos o rastreamento do exame físico e o exame de sangue para avaliar o PSA (do inglês Antígeno Prostático Específico), descartamos a maioria dos pacientes sem risco (cerca de 80%), orientando para reavaliação em 12 meses. E a minoria que tem alguma alteração, avança nos exames (laboratoriais e de imagem) para investigar”, diz o médico.
Tratamentos
O urologista Leonardo Reis esclarece que o PSA é considerado normal quando o resultado do exame laboratorial fica abaixo de 4, mas alerta que outros problemas - que não o câncer – podem alterar esse índice. Entre eles o aumento benigno da próstata e alguma agressão, como a inflamação da prostatite (a mais comum). Quando há confirmação do diagnóstico, a biópsia oferece informações sobre as características complementares do tumor, incluindo seu nível de agressividade.
É a partir desse exame mais detalhado que o médico estabelece o tipo de tratamento, inclusive orientando um mapeamento (por meio dos exames de cintilografia ou PetScan), para verificar a extensão do problema. “Chamamos de tumor primário onde ele inicia – no caso na próstata - e se não tratado pode disseminar para os ossos, por exemplo, por meio de metástases (sementes que podem se espalhar). Quando ele dissemina, deixa de ser curável, mas pode ser controlado”, explica.
Os tratamentos variam a cada caso, mas o clássico prevê cirurgia ou radioterapia. Quando a doença extrapola os limites da glândula e sua periferia, pode ser feito o bloqueio do hormônio da testosterona, com complementações e outras abordagens como a quimioterapia. Leonardo comenta que no campo da pesquisa existem protocolos alternativos, mas muitos ainda sem aplicação prática comprovada. Ele alerta que “muitas vezes o paciente busca alternativas mágicas e perde oportunidade de um tratamento eficaz iniciado no momento correto”.
Vigilância
Nos casos detectados no início, com lesões focais em tamanho mínimo e de baixa agressividade, o paciente pode ser monitorado para ser tratado apenas quando aumenta o volume ou padrão de agressividade. Este é o caso de Alexandre Azeredo, um taxista de 71 anos. Ele procurou o urologista há cerca de seis anos, logo que observou mudanças no hábito urinário. Descobriu, após exames, que tinha câncer de próstata. Mas como foi descoberto precocemente e era uma lesão mínima e de baixa agressividade, a opção foi o Segmento Vigilante, ou seja, permanece monitorado para ser tratado apenas se evoluir. “Como tenho plano de saúde, os exames e o diagnóstico foram rápidos e tomei uma medicação manipulada para desinchar a próstata. Hoje, sei que tenho o problema, mas levo a vida normal, com exames periódicos de acompanhamento”, afirma. Alexandre ressalta a importância dos exames preventivos e lembra que já teve amigos que foram relapsos com a saúde e tiveram problemas mais sérios. “Temos que parar com esse medo de ir ao médico”, diz. E garante que passa para os três filhos e os cinco netos a importância de adotar a prevenção.
Susto e alerta
“Meu mundo caiu!” Este foi o sentimento de Valter José Sant’Anna, hoje com 64 anos e aposentado, quando recebeu o diagnóstico de câncer de próstata, em novembro de 2011. “Meu pensamento era de morte, do tempo que me restava, tinha muitas dúvidas”, conta. Passados 11 anos desse primeiro impacto e sete anos depois de constatar metástase na coluna, ele continua usando um bloqueador hormonal, mas mantém uma vida tranquila, curtindo a família que sempre o apoiou e principalmente a neta com pouco mais de um ano. “Devo aos exames preventivos esses anos de vida que tenho, pois descobri cedo e pude fazer o controle, por isso alerto outros homens a levarem a prevenção a sério”, afirma. Ele costuma dizer que tem “ uma história de sucesso”. Aos 50 anos iniciou os exames de prevenção anual e a primeira alteração foi detectada três anos depois. Como foi detectado logo no início, não precisou de cirurgia, mas passou por sessões de radioterapia e braquiterapia (radiação diretamente no tumor) passando depois a controles trimestrais. Foi assim que descobriu, em 2015, a metástase na vértebra 5 da coluna. Desde então faz tratamento com bloqueador hormonal e controle.
Novidade
O diagnóstico sempre determina a gravidade de cada tumor e seu tratamento. Nos casos de baixa gravidade, o paciente pode conviver com o tumor realizando acompanhamento periódico. Os casos intermediários podem ser resolvidos com cirurgia ou radioterapia. E nos mais avançados, são necessários recursos extras que a ciência disponibiliza, como quimioterapia e hormonioterapia. Uma das novidades, segundo o oncologista André Sasse, é a teranóstica (técnica que une as palavras terapia e diagnóstica). Ele explica que o mais utilizado é o marcador molecular (PSMA), que associado ao PET-CT avalia a presença e a extensão da doença. O PET-CT é uma tecnologia que avalia o corpo inteiro e o marcador é específico para detectar células do câncer de próstata e suas metástases. Simultaneamente, o agente radioativo PSMA-Lutecio é guiado para as lesões identificadas. “O segredo é esse PSMA, uma proteína de membrana encontrada no câncer de próstata, que vira alvo dos agentes para diagnóstico e terapia”, relata. Entretanto, essa medicação ainda é cara, de acesso restrito e sem cobertura obrigatória pelos planos de saúde” complementa.
APROFUNDANDO CONHECIMENTO
O Instituto Nacional do Câncer tem uma cartilha de orientação sobre o câncer de próstata, que pode ser visualizada gratuitamente. Acesse neste link.