ESTRADAS

Mesmo proibido, radares ficam escondidos

Prática de camuflar equipamentos nas rodovias contraria resolução do Contran; vandalismo é a justificativa

Sarah Brito
29/06/2015 às 05:00.
Atualizado em 28/04/2022 às 16:00
A maioria dos 641 pontos de fiscalização de velocidade estará em operação, dos quais 364 radares fixos, 68 radares estáticos e 109 lombadas eletrônicas ( César Rodrigues/ AAN)

A maioria dos 641 pontos de fiscalização de velocidade estará em operação, dos quais 364 radares fixos, 68 radares estáticos e 109 lombadas eletrônicas ( César Rodrigues/ AAN)

Motoristas que trafegam pelas rodovias do Estado de São Paulo precisam ficar atentos para não serem multados por radares móveis estrategicamente instalados em locais pouco ou nada visíveis, em geral, atrás de defensas metálicas, muretas e pilares de concreto. Sob o pretexto de evitar ataques de vandalismo, o Departamento de Estradas de Rodagem (DER) mantém a prática de esconder os aparelhos, o que contraria a resolução 396 do Conselho Nacional de Trânsito (Contran). O parágrafo 2º do artigo 7º da resolução diz que “a operação do equipamento deverá estar visível aos condutores”. A reportagem do Correio Popular flagrou pelo menos quatro aparelhos escondidos em locais como muretas e defensas na Rodovia Anhanguera, entre Campinas e Ribeirão Preto, na última semana. Críticas Segundo especialistas, a instalação dos equipamentos em locais de pouca visibilidade tira o caráter educativo do radar e amplia o potencial arrecadatório com as multas por excesso de velocidade. A prática tinha sido suspensa, mas voltou a ser adotada no segundo semestre do ano passado, quando foi assinado um contrato com uma empresa para a prestação do serviço. Por um ano, os equipamentos ficaram fora das rodovias. “Os radares precisam ser colocados onde tem concentração de acidentes e todo motorista deve respeitar o Código de Trânsito. Mas, a punição tem que ser feita para que não existam dúvidas que o processo é feito de forma apenas arrecadatória”, disse o professor da Engenharia Civil da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) Creso de Franco Peixoto. Para ele, quando a população não entende que o radar não gera controle e que a função não está sendo cumprida, há margem para dúvida.  Outra dificuldade O professor disse também que a falta de informação sobre a obrigação de placas de velocidade no trecho também causa dificuldade para o condutor. “É importante lembrar que a administração pública tem que zelar pela segurança dos motoristas. A partir do instante em que é colocado em algum ponto, deve ter acompanhamento para ver se a função está sendo atingida”, disse. Para evitar esse tipo de questionamento, a Prefeitura de Campinas deixou de usar os radares móveis nas ruas da cidade em agosto de 2012. Hoje, há apenas fiscalização por radares em pontos fixos. Eram dez radares móveis no município antes. Outros pontos Outra via onde os radares escondidos estão operando é a Rodovia Santos Dumont, em Campinas, no trecho até o Aeroporto Internacional de Viracopos. A velocidade no local é de 80 km/h. “Levei duas multas em menos de um mês na Santos Dumont. Fui ao aeroporto duas vezes e não sabia que estavam colocando radares lá. Nas duas multas a velocidade era baixa, mas acima do limite: 89 e 92  km/h”, disse um motorista, que preferiu não se identificar. O DER é o órgão responsável por homologar e fiscalizar os pontos onde ficam os radares móveis e admite que eles são colocados em locais onde pode ser difícil identificá-los. “Em função dos constantes atos de vandalismo contra os radares estáticos, os equipamentos são operados em locais apropriados, próximos à muretas ou defensas metálicas, em pontos de atenção, onde o excesso de velocidade pode ocasionar acidentes e mortes”, informa nota enviada pela assessoria de comunicação do órgão. Geralmente, os radares escondidos ficam em trechos de descida, onde o motorista tem tendência de acelerar mais. Terceirizadas A fiscalização é feita por meio de empresas contratadas para operação dos radares. Além de não poder colocar o equipamento em local escondido, as normas do Contran determinam que eles fiquem em trechos onde existem placas indicando o limite de velocidade na via e que deixem claro que há fiscalização eletrônica na rodovia. Na região de Campinas, em quatro rodovias são pelo menos 19 equipamentos móveis atualmente em funcionamento. O DER é responsável pelos radares móveis nas rodovias das concessionárias AutoBAn e Colinas, que administram o sistema Anhanguera-Bandeirantes e Santos Dumont, respectivamente. São, no total, sete equipamentos. Nas outras rodovias – corredor Dom Pedro e Rodovia Jornalista Francisco Aguirre Proença (Campinas-Monte Mor) — são mais 13 radares móveis. Multado O taxista Julio Cesar Areias, de 37 anos, contou que já levou multas porque não viu o radar móvel instalado na rodovia. “Eles ficam escondidos. Passei a 70 km/h num trecho que era 60 km/h. Não dá para ver, e a gente também fica perdido em relação à velocidade, porque ela muda na via”, afirmou. O técnico de enfermagem Josimar Henrique dos Santos, de 27 anos, disse que a sinalização não adianta, pois os radares pegam de surpresa. “É perigoso porque, quando você vê, leva um susto. A reação é frear. E isso pode causar batidas traseiras. Acho ruim essa medida”, comentou. Cuidados O professor da Faculdade de Engenharia Mecânica (FEM) da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) Celso Arruda diz que, independentemente da forma como os radares são instalados, os motoristas devem prestar atenção nas rodovias por onde trafegam e nos limites de velocidade. “O motorista tem obrigação de estar na velocidade estipulada. O radar é um controle a mais”, disse. Além da questão da multa, o radar escondido ainda amplia o risco de acidentes nas rodovias, já que a reação natural do motorista ao perceber o equipamento é frear, mesmo estando dentro do limite de velocidade do local. Casos de vandalismo  Os casos de vandalismo emblemáticos contra radares em Campinas ocorreram em 2009 e 2010. Em 2009, o motorista de um Ford EcoSsport tentou arrancar um poste com radares amarrando-o com uma corda em seu veículo. Ele foi detido pela polícia antes de acelerar o carro e destruir os equipamentos. O suspeito tentou cometer o crime por volta das 4h30 na Avenida John Boyd Dunlop, mas foi visto por agentes de trânsito. Em 2010, um grupo de motoqueiros depredou e roubou um radar estático que estava em operação na Rua General Marcondes Salgado, no trecho antes da Rua Hilário Magro Júnior, no Bosque. Por volta das 15h30, o grupo passou pelo local e se incomodou com a presença do equipamento. Na sequência, ameaçou o funcionário da empresa Engebras, responsável pelo radar. Após ameaças de agressão, os motoqueiros danificaram parte do equipamento e roubaram o sensor-régua (responsável pela medição da velocidade dos veículos). O sensor foi localizado horas depois por um agente de mobilidade urbana da Empresa Municipal de Desenvolvimento de Campinas (Emdec), jogado na calçada da Rua Pedro Álvares Cabral, também no Bosque. Um boletim de ocorrência foi registrado no 1º Distrito Policial. De acordo com o funcionário da Engebras, o grupo de motoqueiros tinha cerca de 300 pessoas. No ano passado, foram registradas 17 ocorrências entre depredação, furto e roubo de radares em Campinas.

Assuntos Relacionados
Compartilhar
Correio Popular© Copyright 2024Todos os direitos reservados.
Distribuído por
Publicado no
Desenvolvido por