PIRACICABA

Menores da Fundação Casa veem oportunidade nos estudos

Menores internos veem nos estudos a oportunidade para reescrever suas histórias

Juliana Franco
26/08/2013 às 10:12.
Atualizado em 25/04/2022 às 04:17
Jovens da Fundação Casa reconhecem a oportunidade para mudar de vida e já traçam planos para o futuro (Antonio Trivelin/Gazeta de Piracicaba)

Jovens da Fundação Casa reconhecem a oportunidade para mudar de vida e já traçam planos para o futuro (Antonio Trivelin/Gazeta de Piracicaba)

Uma nova chance à vida. Esse é o objetivo dos internos da Fundação Casa de Piracicaba. Assim como o educador Paulo Freire, eles entendem que a educação tem um papel importante nesse processo, por ter uma perspectiva libertadora. Foi dentro da sala de aula que eles encontraram uma forma de reescrever suas histórias.A aposta e a confiança nesses meninos partiram do diretor da instituição, Flagas Rodrigues Lopes. A poucos dias de voltarem à liberdade e a duas semanas da conclusão dos estudos, os seis alunos, que ocupam vagas em cursos técnicos do Senai, fazem planos, traçam metas e demonstram que é sim, possível, sonhar com um recomeço.Eles ingressaram nas aulas por meio do projeto Pronatec, desenvolvido pelo Governo Federal em parceira com a administração municipal. Seguir a profissão do pai, que é mecânico, foi a opção de João (nome fictício), de 18 anos. Por isso, ele escolheu pelo curso de mecânico de suspensão, direção e freios. “Queria mudar de vida e vi nos estudos uma oportunidade. Quando sair daqui, em um mês, quero voltar à escola, estou no 8º ano, e arrumar um emprego registrado”, conta o interno que tem três passagens pela Fundação – a primeira foi aos 15 anos – e é o único de quatro irmãos que se envolveu neste mundo. “Ver o sofrimento da minha mãe aos domingos, quando vem me ver, me fez repensar em tudo. Quero ficar com a minha família”, acrescenta.Pai de um menino de 2 anos, Márcio (nome fictício), 17 anos, está na Fundação Casa por um delito cometido em 2009 – a pena veio agora. “Quando me apresentei ao Ministério Público já não estava mais nesta vida, mas não trabalhava. Quem pagava a pensão do meu filho era o meu pai e a minha mãe sempre pegou no meu pé para eu arrumar um emprego. Fui pego por assalto, tráfico, porte de armas e receptação. Na época, o juiz disse que eu só vim para a Fundação porque estava desempregado”, conta.Ele que já foi empacotador, cursa aulas de carpinteiro e, entre os seus projetos futuros, está cuidar do filho, estudar e trabalhar. “Meu filho vem me ver todos os domingos com a minha mãe. Não quero mais isto para mim. Quero uma nova vida e esta é uma chance que estou tendo. Quero agarrá-la”.Alex (nome fictício), 17 anos, é um dos mais ansiosos do grupo. Ele deixa a Fundação amanhã. Também aluno do curso mecânico de suspensão, direção e freios, está na 7ª série e já tem um emprego a sua espera. “Meu pai é funileiro e eu já trabalhei com ele. Agora, quando eu sair daqui, o patrão dele disse que vai me dar um emprego com carteira assinada. Quero mudar, pensar em mim e ajudar o próximo. Não é todo mundo que tem a oportunidade que estou tendo”, afirma. RespeitoO modo como foram recebidos na Fundação Casa de Piracicaba assustou, principalmente aos que já tinham passagem por outras instituições. O respeito e a atenção também foram fatores decisivos na busca por um novo futuro.Os meninos frequentam as aulas diariamente, das 12h30 às 17h30, vestidos como todos os outros alunos e, por incrível que parece, sem o acompanhamento de nenhum membro da Fundação. “Eles ficam sozinhos. Este é um trabalho de conscientização, é uma metodologia socioeducativo. Não é fácil chegar a esta confiança, mas trabalhamos para isto. Eles são merecedores”, conta o diretor Flagas Lopes.“Eu não sonhava em ser tratado com respeito aqui. Passei pela Fundação em São Paulo e não era assim. A atenção, o respeito que eles têm aqui com a gente ajuda a mudar. Além disso, nos ajudamos. Quando um tem pensamentos que não deve, pensa em algo ruim, conversamos, mostramos que as oportunidades existem, só precisam ser agarradas”, revela Felipe (nome ficticio), 17 anos, que cursa aulas de auxiliar administrativo.Para Alex, ser tratado mal só piora a situação, só faz com que os jovens guardem ainda mais mágoas. “Por isso que muitos internos saem pior, não há compreensão, respeito”. SociedadeDiferente do que muitos pensam, os jovens não sofrem preconceito na escola. Os demais alunos sabem que eles são internos da Fundação Casa e os tratam como qualquer outro estudante. “Inclusive eles se propõem a nos ajudar quando temos dificuldades nas matérias, por exemplo”, revela Felipe.Para o diretor da instituição, Lopes, a inserção destes meninos na sociedade é fundamental. Além disso, a comunidade precisa participar dos problemas sociais que imperam. “Quando as pessoas entenderem que isto também é um problema delas, as coisas começam a mudar”. Inserção no mercado A Fundação Casa mantém contato com o Cat (Centro de Apoio ao Trabalhador) na atuação de inserção destes jovens no mercado de trabalho. “Há três anos, quando começamos este trabalho, era difícil. Hoje, a comunidade conhece nossas ações e estão receptivas. Inclusive, os empregadores sabem que são meninos internos ou ex-internos e dão a oportunidade de emprego. Além disso, quando vão a uma entrevista de emprego, eles escolhem uma roupa do nosso armário de doações. Não deixam a instituição com o uniforme”, explica Flagas Lopes.

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