DA BAHIA

Mãe biológica devolve filha à família adotiva de Indaiatuba

Justiça baiana autorizou a guarda provisória de uma menina de 5 anos que tinha sido adotada e depois devolvida à família biológica na cidade de Monte Santo, no Interior daquele Estado

Inaê Miranda
15/06/2015 às 11:17.
Atualizado em 23/04/2022 às 10:35
Em dezembro 2012, familiares e amigos dos pais adotivos das crianças de Monte Santo fizeram manifestação no Taquaral pela volta dos filhos (  Cedoc/RAC)

Em dezembro 2012, familiares e amigos dos pais adotivos das crianças de Monte Santo fizeram manifestação no Taquaral pela volta dos filhos ( Cedoc/RAC)

Após dois anos de batalha judicial, uma das cinco crianças de Monte Santo, que foram adotadas por famílias de Campinas e de Indaiatuba, e mais tarde retornaram à Bahia por ordem da Justiça, foi devolvida para a mãe adotiva no final de semana. O retorno foi possível graças à anulação da decisão do juiz Luis Roberto Cappio Pereira pelo Tribunal de Justiça da Bahia, e após a mãe biológica, Silvania Maria Mota Silva, demonstrar arrependimento em ter pedido a guarda, e vontade de que as crianças voltassem a conviver com as famílias paulistas. A médica Letícia Cristina Fernandes Silva, 37 anos, passou o último final de semana com a filha, de 4 anos, de quem estava afastada desde dezembro de 2012. Além da alegria de ter a filha ao seu lado, Letícia diz que o retorno também lavou a sua honra. Durante a batalha judicial, os pais adotivos foram acusados de tráfico de crianças. Letícia foi à Bahia na última quinta-feira, alguns dias após Silvania ir a público dizer que queria devolver a criança. Ficou acordado que a entrega seria feita no Ministério Público, em Salvador. A entrega ocorreu por meio de um acordo de devolução consensual, entre os pais biológicos da garota — Silvania e José Mário Silva —, a mãe adotiva (Letícia), juntamente com a promotoria de Monte Santo. “Chegamos e foi um encontro muito bonito e muito emocionante, porque sofremos minha filha e eu nesse tempo todo. Fomos vítimas do sistema. Ela (Silvania) fez tudo o que fez porque prometeram casa e benefícios para ela. Ela aceitou e depois a abandonaram com os seis filhos. Por causa da dependência química, ela não conseguiu dar conta de tudo”, relata a médica. Ainda na Bahia, a atual advogada de Letícia, Marilena Matiuzzi, fez o pedido de guarda provisória para que a médica pudesse deixar o Estado com a criança e foi concedido por um juiz de Salvador. O reencontro com a filha, ainda na Bahia, foi emocionante, como relata a médica. “Na hora que cheguei, ela falou ‘mamãe’. A Silvania disse que a minha filha nunca esqueceu de mim. Foi muito bonito, porque depois de dois anos e seis meses ela, tão pequena como ainda é, me reconheceu”, disse. Já em sua casa, em Indaiatuba, a felicidade da médica ficou completa com a família reunida. Letícia tem outro filho adotivo, da mesma idade da menina, e que sempre foi grudado com a irmã. “O meu filho também está superfeliz porque não esqueceu da irmã. Foi ao aeroporto pegá-la e levou a bonequinha para devolver para ela. A nossa família está em festa”, emociona-se. Esta semana, a representante de Letícia entrará com o pedido de guarda definitiva em Indaiatuba, onde a criança reside atualmente.ReviravoltaOs cinco irmãos vieram para a região em junho de 2011, quando o juiz Vitor Manoel Xavier Bizerra, com base em documentos apresentados pelo Conselho Tutelar de Monte Santo, e com o aval do MP, determinou a retirada das cinco crianças de Silvania. Em sua decisão, alegou que os menores sofriam maus-tratos e que as famílias teriam a guarda provisória. Em maio de 2012, Luis Roberto Cappio foi designado para a Comarca de Monte Santo, após denúncias de que cinco irmãos haviam sido traficados. O caso ganhou repercussão nacional em outubro do mesmo ano, após veiculação de reportagem no programa Fantástico, da Rede Globo, sobre o caso. Em novembro de 2012, Cappio determinou o retorno dos menores para a Bahia. O magistrado publicou a sentença final em fevereiro de 2013, em que dizia que os cinco filhos haviam sido retirados de casa à revelia, e condenou as famílias adotivas a pagarem indenização por danos morais para Silvania e Jerôncio Souza, pais das crianças.Letícia afirma que a devolução da filha também tirou o peso da acusação de tráfico de criança de suas costas. “Foi muito grave o que fizeram comigo, com a minha filha, e com as demais famílias envolvidas no processo. Eu perdi o meu emprego e mudei de casa. Era apontada como a médica que traficava crianças e falavam que eu era a chefe de quadrilha. Depois mudaram o discurso e falaram em adoção irregular. Foi horrível a sensação de injustiça. A volta da minha filha também tira um peso das minhas costas e limpa o meu nome. Agora, as pessoas podem ver que eu sempre falei a verdade. E sempre acreditei que o amor vence tudo. O amor dela por mim e o meu por ela venceu”, contou. A médica disse ainda que fechou a agenda por um tempo para ficar com os dois filhos. Esperança e impasse Os pais afetivos dos outros quatro irmãos que permanecem na Bahia continuam esperançosos em recuperar a guarda dos filhos o mais breve possível. A advogada Lenora Thais Steffen Todt Panzetti, que acompanhou os processos desde o início e que, atualmente, representa duas famílias, explica que elas não foram devolvidas por meio de acordo consensual porque estão na casa de Jerôncio Souza, ex-companheiro de Silvania. "A guarda legal é da Silvania, mas o Jerôncio está de fato com os meninos, impedindo o contato das crianças com a genitora" , afirmou a advogada. Ela explica ainda que o homem é pai biológico das duas crianças mais velhas, de 10 e de 8 anos. Porém registrou outros dois filhos de Silvania com José Mário, de 6 e de 5 anos, como pai biológico. "Os meninos só não estão retornando neste momento porque, para que isso acontecesse, precisaria haver consenso entre Silvania e Jerôncio - que constam como genitores no registro do nascimento dos quatro garotos, embora ele só seja pai biológico dos dois mais velho - ou através da determinação judicial do retorno" , afirmou. Lenora esclareceu ainda que só foi possível a devolução da filha de Letícia neste momento porque o pai dela é o José Mário, que consta em seu registro de nascimento e, assim como Silvania, ele também estava de acordo com a devolução consensual, e porque houve a anulação da sentença do Juiz Cappio pelo Tribunal de Justiça. "As mãe estão esperançosas de que os meninos irão voltar e querem que aconteça logo, mas compreendendo que os procedimentos têm que ser feitos com a maior transparência e legalidade possível. "A volta da filha de Letícia é uma demonstração de que a justiça começou a ser feita. Elas esperam e confiam que os meninos voltarão e que esse retorno será feito da forma mais tranquila possível" .

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