Victor Almeida Filho, padre, colunista (Cedoc/Rac)
A Campanha da Fraternidade é realizada anualmente pela Igreja Católica no Brasil, sempre no período da Quaresma. Seu objetivo é despertar a solidariedade dos seus fiéis e da sociedade em relação a um problema concreto que envolve a sociedade brasileira, buscando caminhos de solução. A cada ano é escolhido um tema, que define a realidade concreta a ser transformada. Este ano o convite é feito para olharmos nossa Sociedade. Essa é a temática da Campanha da Fraternidade deste 2015: Igreja e Sociedade. Logicamente que o modelo desse olhar é sempre Jesus de Nazaré que se encarnou de modo pleno na sociedade de sua época. Como tão bem descreveu o teólogo Teilhard de Chardin: “Não existe nada de profano para quem sabe comtemplar a realidade.” Mas para falarmos desse tema é preciso antes de tudo sermos humildes e reconhecer o ser humano que faz a atual Sociedade. Só assim poderemos exercer um diálogo maduro e fecundo, sendo como nos pede o Papa Francisco, uma Igreja do Encontro. Sem respostas prontas e pré-definidas, mas absorvendo este novo ser social, fruto de nossa época. Um novo ser humano surge em meio a sociedade atual. Um sujeito cansado que se esforça para cumprir seu papel. Mas que também é um sujeito excitado pelo meio que o envolve. Pelas mídias publicitárias e canais virtuais, pelas propagandas e multiplicidades de eventos que tomam o homem moderno. Esse sujeito foi muito bem definido por Barack Obama: “Yes, we can.” Geração net. Até agora a história da humanidade nunca se tinha visto uma geração saber mais que outra. A virtualidade é tão fantástica que podemos endeusar ou aniquilar pessoas num segundo. O corpo torna-se um acessório que posso fazer com ele o que quero. Esse sujeito é moldado por uma estética corporal ditado por essa mesma sociedade. Hoje parece proibido ser gordo. E quem transitar fora dos padrões estéticos de nossa sociedade deve ser desprezado ou visto com menos valor por não se enquadrar aos atuais modelos. Somos uma República laica, onde a Religião deve ser independente da política. Mas a moda é colocar políticos que estejam vinculados a esta ou aquela igreja. Se há uma legitima busca pelo Bem comum, ótimo. Mas se as eleições de determinados candidatos visam apenas o benefício de seu grupo isso é preocupante. Penso que nosso melhor papel hoje na sociedade civil seria deixarmos de ser massa e sermos cidadãos civis. Uma comunidade de cidadãos, com todos seus direitos e deveres. No horizonte deve se colocar a dignidade da pessoa humana, a solidariedade: todos somos responsáveis por todos, onde os bens da criação são destinados a todos. A temática da violência. A violência primeira é a violência estrutural. Como bem definiu o Papa Francisco em sua Exortação apostólica Evangelii Gaudium: “Hoje, em muitas partes, reclama-se maior segurança. Mas, enquanto não se eliminar a exclusão e a desigualdade dentro da sociedade e entre os vários povos será impossível desarraigar a violência. Acusam-se da violência os pobres e as populações mais pobres, mas, sem igualdade de oportunidades, as várias formas de agressão e de guerra encontrarão um terreno fértil que, mais cedo ou mais tarde, há de provocar a explosão”. Temos visto uma crescente violência cultural que brota de religiões e de posturas políticas diversas. É a violência da não aceitação da opinião alheia diferente â minha. O outro deve ser eliminado. Há uma violência no mundo do trabalho, no trânsito, contra os povos indígenas, da população carcerária - que só perde para a China e os Estados Unidos, passamos de 90.000 em 1990 pra 574.027 presos em 2013. Onze das trinta cidades mais violentas do mundo são brasileiras. Maceió é a 5ª e Fortaleza a 7ª. Quanto maior a desigualdade maior a violência. Violência contra os jovens, de modo particular os negros da periferia. 82 jovens morrem por dia no Brasil. 77% deles são negros, 8 em cada 10; conforme dados da FGV. É preciso reconhecer que a Violência não se vence com violência, que Justiça não é vingança. Família: primeira escola da cultura da paz, com perdão e reconciliação. A família humana que tem o mesmo pai, a paternidade de Deus como raiz da fraternidade (conf. Mt 23, 8-9); Como vemos a sociedade moderna nos questiona. São várias temáticas que nos afligem e teríamos muitas outras para ainda expormos. Precisamos estabelecer novas bases para as relações sociais, com a devida valorização do outro. É candente formar nos jovens uma cultura do encontro e talvez o lugar privilegiado para isso seja a família. Jesus, nosso irmão, é sempre o modelo. Sua Cruz é o lugar de fundação desta fraternidade. A violência injusta por ele sofrida não foi devolvida com mais violência, mas com a reconciliação. Em Jesus crucificado acontece a reconciliação da humanidade. Há uma não violência na Cruz. Concluo com a bela frase do Papa Francisco: “Prefiro uma Igreja acidentada, ferida e enlameada por ter saído pelas estradas, a uma Igreja enferma pelo fechamento e a comodidade de se agarrar às próprias seguranças. Despertem o Mundo!”