CONTENTE

Fúria arrecadatória 4

16/03/2015 às 05:00.
Atualizado em 23/04/2022 às 17:55

O espanto geralmente pode ser domado quando o evento que a ele conduz ocorre num meio em que as pessoas se acostumaram com certos absurdos. Foi o que pensei ao ler neste Correio Popular do último dia 2 matéria da esplêndida repórter Maria Teresa Costa contando que a Prefeitura de Campinas está a propor um Refis para quem com ela tem dívidas correndo na Justiça. Isto, naturalmente, não é motivo de espanto negativo. Sim positivo, conforme ressaltou corretíssimo editorial deste mesmo jornal no dia 06/03. Apenas suspirei ao tomar conhecimento das cifras dos penduras fiscais que a municipalidade espera recolher: mais de 2 bilhões de reais. Boa grana, mesmo para quem já não se espanta com mais nada após as revelações dos números do Petrolão.    Está claro que quando você se coloca diante do tema impostos, inúmeros caminhos se abrem às suas reflexões, quer para o bem quer para o mal.   O que me leva a lembrar o que disse Robert Musil (1880-1942), o notável autor do magnífico “O Homem Sem Qualidades”, talvez a pensar nos métodos que os governos usam para arrecadar: “Não há nenhum pensamento importante que a injustiça não saiba usar, ela é móvel para todos os lados e pode vestir todos os trajes da verdade”. Tenho, dentro do tema que os colegas d’antanho chamariam de espinhoso, escrito alguns textos, conforme está no número junto ao título acima. E acabo por voltar ao macabro enredo pelo seguinte: tanto a matéria da colega Maria Teresa como o editorial, dão conta de que a Prefeitura tenta equacionar as dívidas dos grandes, inclusive Infraero, empresa que administra os aeroportos do Brasil. Que deveria à municipalidade, segundo a repórter informa, nada menos de 1 bilhão de reais em ISS, anistiados por ser indevida a cobrança. Imposto Sobre Serviços, esse é um dos fulcros da grande malha arrecadatória que lançam às nossas costas, acutilando pessoas jurídicas e físicas. Então fico sabendo que, quanto a isso, o quarto andar do Paço se movimenta para negociar pagamentos que aliviariam não só os combalidos cofres públicos como os dos próprios devedores. Tudo dizendo respeito aos grandes.   Pois muito bem, é ou não é lícito perguntar: e os pequenos? E os bagrinhos? O que está sendo feito para amenizar a barra de muitos, centenas, que são cobrados sem nada dever, além de outros, também centenas, que sequer possuem a nunca assaz louvada Capacidade Contributiva? Da Infraero concluíram que o bilhão devido não o era; ótimo. E os coitadinhos?Contei neste espaço, e vale repetir “ad nauseam”, a saga do meu amigo Senhor Y, mais de 70 anos, que, aposentado, ganhando merreca do INSS, arranjou empreguinho a fim de melhorar as finanças. Cadastrou-se na Prefeitura para pagar o dito ISS. Depois de um ano, largou o emprego e mudou de Estado, tendo, porém, esquecido de dar baixa no tal cadastramento.   Ao regressar, estava com uma “dívida” imensa, impagável; para alguém como ele, afinal, muito maior, proporcionalmente, do que o bilhão que a Infraero não pagará. Mas ao Senhor Y a fúria arrecadatória da municipalidade não aliviou.   Ameaçaram penhorar seus “bens”, que se resumem à roupa que veste e ao céu que o cobre; e bloquearam sua mirrada conta bancária, onde só cai o dinheirinho micho que o governo paga. Viu-se, assim, o bom homem, impossibilitado de comprar remédios indispensáveis à sua sobrevivência. Foi salvo pelo juiz Mauro Fukumoto, que mandou suspender o absurdo bloqueio. Temos aí, amigos, caso típico de alguém que não possui como pagar, algo capitulado na Constituição Brasileira no Parágrafo Primeiro do Artigo 145, que coloca limites ao poder de tributar que é dado ao Estado. Lá está escrito que a Capacidade Contributiva das pessoas tem que ser respeitada; alguém como o Senhor Y, por exemplo, “não pode ser onerado de forma a atingir o mínimo para sua sobrevivência e de sua família”. Assim, venho sugerindo às autoridades competentes que seja promulgada uma Lei isentando aposentados, pessoas físicas, do pagamento do tal ISS. Já falei com um vereador, que falou com o secretário de Finanças, só não sei se falaram com o prefeito; espero que sim!   Ao secretário de Justiça, doutor Galves, lembro, para recordar os tempos em que S. Excia. era acólito nas missas celebradas em latim: “Dare nemo potest quod non habet, neque plus quam habet”... (Ninguém pode dar o que não possui, nem mais do que possui...). Bom dia.

Assuntos Relacionados
Compartilhar
Anuncie
(19) 3736-3085
comercial@rac.com.br
Fale Conosco
(19) 3772-8000
Central do Assinante
(19) 3736-3200
WhatsApp
(19) 9 9998-9902
Correio Popular© Copyright 2025Todos os direitos reservados.
Distribuído por
Publicado no
Desenvolvido por