JOAQUIM MOTTA

Fundo do Poço e Subida ao Trono

Joaquim Motta
igpaulista@rac.com.br
24/06/2015 às 05:00.
Atualizado em 28/04/2022 às 15:38

A nossa tradição cultural se serve da expressão ‘fundo do poço’ para caracterizar um momento tão depressivo e lamentável que corresponderia a esse lugar extremamente inferiorizado. E, na outra extremidade dessa referência, temos a superioridade indicada por expressões do tipo ‘galgar a um trono’. Olhando o título deste artigo, uma mulher de quase cinquenta anos disse que o entendia como trajetória de uma pessoa que passou da pobreza para a riqueza de modo instantâneo, que ficou rica com um prêmio de loteria. Uma moça de pouco mais de trinta anos entendeu que essa virada na vida de uma pessoa poderia não ser apenas dinheiro, mas simplesmente a oportunidade de viver um grande amor. Um moço de quase trinta anos também entendeu essa transposição existencial como resultado possível para quem se apaixonasse intensamente. Um homem que está chegando aos quarenta e cinco sugeriu jocosamente que do poço ao trono não mudaria muita coisa, seria como ir da fossa para o vaso sanitário... Na realidade, o ser humano oscila, ao longo de sua vida, entre períodos muito interessantes, alegres, prazerosos e episódios frustrantes, muito tristes. Seja no relacionamento amoroso, na carreira profissional, em alguma experiência pouco rotineira como uma viagem, umas férias na praia, as alternâncias são inevitáveis. Quinze dias no litoral em temporada de verão podem significar dez dias bem chuvosos, filas até para comprar água e falta desta para tomar banho... A chegada de um novo chefe que parece bem-intencionado e justo ativará as esperanças de uma promoção atrasada... Divorciado pela terceira vez, administrando três ex-esposas e quatro filhos, um homem de quase sessenta anos entrou em crise com a namorada. Ela viu no celular dele alguma coisa de uma rival e interrompeu o namoro. De início, ele ficou muito abalado, melancólico. Pensou que não ainda tivesse experiência ou não soubesse maneira satisfatória de manter uma relação com uma mulher. Afinal, tantos namoros, esses matrimônios... Telefonou às ex-esposas, pensando em reatar algum casamento. Chegou a perguntar a cada uma se estava namorando. Duas não estavam. Ele hesitou um pouco, deixou para fazer um convite mais à frente. Duas semanas depois, lendo um artigo na internet, pensou melhor e se assumiu sozinho, sem precipitar relações. Atualmente, segue morando sem companhia, tem algumas parceiras com quem faz sexo, viaja, diverte-se, sem compromisso com ninguém. E tem muito mais tempo e espaço para conviver com os filhos. Ele pensava que sem uma esposa iria para o mais fundo dos poços. Agora, acha que sentou em um trono majestático e feliz... E está alertado para o fato de que nada é definitivo e muita coisa pode mudar. Mulher de quarenta e quatro anos estava divorciada há três. Depois do fracasso conjugal, ficou muito arredia aos homens, fugia de paqueras, olhares, tudo o que representasse aproximação com o outro sexo. Especulou até se ‘casaria com uma lésbica’. Achava que o divórcio era a sua plena realização, uma verdadeira rainha solteira, que nunca mais voltaria a um ‘poço matrimonial’. Pois, certo dia, em um supermercado, escolhendo um vinho para o aniversário do irmão, conhece um homem que a encanta literalmente à primeira vista! Já o está namorando há onze meses e o casal programou uma linda comemoração para o mês seguinte, marcando um ano de convivência... Quem se acha no limite inferior do poço ou na glória acomodada de um trono pode transpor essa distância aparentemente tão longa e difícil, às vezes inadvertida e inesperadamente. Vemos frequentemente empresários que perdem enormes fortunas, construtoras acusadas de desabamentos, marido considerado exemplar flagrado em traição e tantas situações aparentemente contraditórias que se polarizam ou se invertem. Por outro lado, há pessoas e condições que se antagonizam nos valores e nas ideias. Um peregrino caminhando quilômetros para agradecer a um santo a graça que julgou receber se sente no Céu, ao passo que um motorista, dentro do seu adorado carro confortável, ao ver o caminhante pela estrada, considera-o um louco padecendo precocemente no Inferno! Cada um tem a faculdade da interpretação, pode entender o seu momento como glorioso ou muito desgostoso. Enquanto há vida, especialmente lucidez mental na pessoa, ela pode reverter qualquer tendência e deixar os polos antes que os limites sejam excedidos.  

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