Riqueza amazônica: bióloga de Campinas participa de pesquisa sobre a ucuuba, um projeto que visa dar uso estético à manteiga obtida do fruto e conscientizar os moradores sobre a importância de preservar a biodiversidade
"Como é reconhecida a necessidade de conservar a diversidade biológica existente, a política de uso de espécies vegetais que constam em listas vermelhas determina que, atrelado à utilização de uma espécie ameaçada de extinção, existirá um projeto de conservação" (Adriano Rosa/Especial para a Metrópole)
Foto: Adriano Rosa/Especial para a Metrópole "Como é reconhecida a necessidade de conservar a diversidade biológica existente, a política de uso de espécies vegetais que constam em listas vermelhas determina que, atrelado à utilização de uma espécie ameaçada de extinção, existirá um projeto de conservação" A parceria entre a Universidade Federal de São Carlos (UFSCar) e uma grande marca nacional de cosméticos resultou em uma ação que não só beneficia comunidades da Amazônia e do Pará que sobrevivem do extrativismo, como também ajuda a manter a floresta em pé. O trabalho, que contou com a participação da bióloga Carolina Domenico, de Campinas, ratificou as qualidades e os benefícios da ucuuba para uso estético. A pesquisa levou três anos para ser concluída. Durante 30 anos, a árvore que oferece o fruto foi constantemente derrubada para a exploração da madeira por uma mesma comunidade, o que levou à sua inclusão na lista de espécies em extinção. A pesquisa, no entanto, fez surgir uma oportunidade para reverter esse ciclo predatório ao ressignificar o valor do ativo e seu lugar na cadeia produtiva. A iniciativa contemplou a realização de um trabalho junto aos extrativistas, a fim de mostrar que a renda obtida com a coleta do fruto seria três vezes maior do que a alcançada com a madeira. E para alertá-los de que, caso o desmatamento continuasse, a comunidade perderia tudo, inclusive a floresta onde vive. Também foi montada uma cooperativa para os trabalhadores receberem instruções e treinamentos para a gestão sustentável da cadeia. A própria Carolina, que nos três anos de pesquisa visitou a Amazônia mensalmente, ensinou técnicas de manejo sustentável, da coleta à armazenagem, para melhor aproveitamento do recurso. A ucuuba é o fruto da ucuubeira, presente no Estado do Pará e em áreas alagadas da região amazônica. O nome vem do tupi e quer dizer árvore da manteiga, o que se justifica pelo fato de sua semente ser fonte de uma manteiga levíssima, com alto poder hidratante e reparador. Sobre a pesquisa e a necessidade de, cada vez mais, se preservar a biodiversidade brasileira, conversamos com Carolina, que é mestre em agricultura tropical e subtropical pelo Instituto Agronômico de Campinas (IAC) e, desde 2010, pesquisadora da Diretoria de Pesquisa Avançada, com ênfase no Programa de Bioagricultura, da Natura.Metrópole – Como a ucuuba foi descoberta? E em que momento percebeu-se que suas propriedades auxiliariam na adoção do manejo sustentável e no combate ao desmatamento? Carolina Domenico – A Natura conheceu a ucuuba por meio de um projeto de pesquisa interna que tinha como objetivo prospectar plantas oleaginosas da biodiversidade amazônica. Durante o trabalho para o desenvolvimento do ingrediente, os pesquisadores avaliaram que a manteiga proveniente das sementes do fruto apresentava um sensorial diferenciado para aplicação cosmética. Essa característica foi confirmada nos testes de eficácia.A exploração para utilização da ucuuba obedece ao ciclo natural da espécie. Como, então, atender aos interesses comerciais sem prejudicar a floresta? Para o uso da ucuuba e de outras matérias-primas vegetais, é realizado um diagnóstico do potencial produtivo das áreas fornecedoras. A partir desse conhecimento, acordam-se com as cooperativas volumes de fornecimento que respeitem a capacidade de suporte do local. A empresa também constrói, junto aos agricultores, técnicas com boas práticas de manejo sustentável para a espécie, considerando determinada realidade. Além disso, propõe benefícios justos e equitativos e desempenha o papel de incentivadora de uma gestão sustentável da cadeia. Esse modelo demanda que as organizações envolvidas integrem aspectos sociais e ambientais em suas decisões e atitudes.Além de contribuir à preservação de uma espécie ameaçada de extinção e estimular a geração de renda entre as comunidades locais, quais outros resultados positivos a pesquisa alcançou? Ao fazer o uso da semente, que é um produto florestal não madeireiro, estimula-se a conservação da árvore em pé. A empresa também desenvolve junto à UFSCar e algumas comunidades fornecedoras um projeto de conservação on farm da espécie.Falando em UFSCar, qual foi o papel da instituição? A UFSCar é parceira no desenvolvimento do projeto de conservação. Como é reconhecida a necessidade de conservar a diversidade biológica existente, a política de uso de espécies vegetais que constam em listas vermelhas determina que, atrelado à utilização de uma espécie ameaçada de extinção, existirá um projeto de conservação. Com base nisso e como emprega a manteiga de ucuuba em alguns de seus produtos, a Natura tomou a iniciativa de estudar a preservação do recurso genético em seu meio natural. Os objetivos são garantir a sustentabilidade da cadeia de fornecimento de ucuuba, fortalecer o alinhamento com a Convenção da Diversidade Biológica e com a estratégia de negócios bem-sucedidos no longo prazo, e valorizar a prática de conservação on farm.A senhora já fez parte de outras pesquisas que colaboraram com o meio ambiente? Acredito que todos os projetos desenvolvidos no Programa de Bioagricultura da empresa colaboram com o meio ambiente, pois as metas são promover a botânica econômica brasileira, desenvolver tecnologias de produção e inovação nas cadeias produtivas com foco na agroecologia e no manejo florestal não madeireiro. Ucuuba é o primeiro projeto de que faço parte que foi lançado, mas outros muito interessantes estão por vir.Como se sente em fazer parte de um trabalho que contribuiu para a valorização dos aspectos social e ambiental? Me sinto realizada e muito orgulhosa. É um privilégio trabalhar em uma empresa que investe e acredita no tripé da sustentabilidade.