ig-antonio-contente (AAN)
A surpresa pode ser irmã do espanto, para o bem e para o mal. No primeiro viés fui coadjuvante, em 1995, de uma história que, desde então, de vez em quando emerge em certos instantes da minha vida; para solidificar a sensação de bem-estar que sinto ao recordar. A surpresa que me conduziu ao espanto ocorreu quando, por força de acontecimento até singelo, fui levado a conhecer a Capela da Nossa Senhora da Boa Morte, na Santa Casa de Campinas, que começou a ser construída em 1871. Mas antes é preciso falar dos lances de um belo caso d’amor. Começou num coquetel ocorrido no Tênis Clube, no ano acima citado; foi lá que conheci EJN. Não era socialite, estava na festinha a trabalho, funcionária do bufê que servia no evento. Falamos rapidamente, mas se formou pequeno elo. Que se revelou real uma semana depois quando, ao entrar no Café Regina, no Centro, encontro a moça. Que me cumprimentou com o famoso “lembra de mim?". Respondi que sim, e até a convidei para um moka. Sentamos. Com certeza sem a menor intenção de evitar que eu fizesse algum galanteio, pois era linda, EJN me olhou nos óculos para dizer que estava noiva, ia casar. Acrescentando: “E queria lhe pedir um favor”. Diante do meu levantar de sobrancelhas, sorriu: “Para que eu possa realizar um sonho”. Detalhou, após, que, por frequentar o Tênis eu devia ser importante, e o que queria conseguir talvez precisasse de alguém com este perfil. Respondi que não era importante coisa nenhuma, só um simples jornalista, porém indaguei o que de tão difícil ela precisava. Respondeu: “É que gostaria de casar na Capela da Santa Casa de Misericórdia”. Indaguei se isso era difícil, e ouvi: “Talvez seja, para uma pessoa simples que nem eu”. Acentuei que poderia estar enganada, mas que, como tinha amizade com o provedor, à época, da esplêndida instituição, o médico João Plutarco Rodrigues Lima, falaria com ele. Troquei telefones com a moça; antes que EJN fosse embora, indaguei: “Afinal, por que você quer casar na Capela”? A resposta: “Porque sonhei que todas as pessoas que casam lá são felizes para sempre”... Achei a história tão interessante que a primeira coisa que me ocorreu, antes mesmo de procurar meu amigo provedor, foi conhecer a igrejinha. O que resultou em experiência francamente tocante, pois o pequeno templo, consagrado ao culto de Nossa Senhora da Boa Morte, é absolutamente encantador. Para conseguir dados sobre o lugar, e sabendo que o famoso médico Cirilo Muraro preparava livro sobre a história da Santa Casa, liguei pra ele. Fez, então, rápido retrato da capela, salientando que o altar mor é de mármore fino, ladeado por estátuas de santos que a todos chama a atenção pela beleza das esculturas. Salientou que o belíssimo painel a óleo da Imaculada Conceição é um trabalho do renomado pintor Torrini. Assim, afinal, acabei convencido que EJN tinha razão em querer casar lá. Cerimônia que aconteceu num dia qualquer de 1995, assistida por mim e pelo provedor João Plutarco Rodrigues Lima. Como nossa personagem e o marido foram morar na Austrália, só voltei a ter contato com EJN neste século, através da internet. Soube que o casal enriqueceu e, recentemente, tive a surpresa de saber que ela viria a Campinas, ver a mãe gravemente enferma. Marcamos encontro. Foi tudo muito legal, semana passada sentamos no mesmo Café Regina do primeiro contato. Finalmente, pude fazer a pergunta que estava há tempos na minha cabeça: “E então, o casamento na Capela te deu a felicidade para sempre”? Ela abriu sorriso ao responder que sim, acentuando que na volta à Austrália faria grande festa para comemorar as Bodas de Prata. “Mas espera aí — respondi — se vocês casaram em 1995 são só vinte anos, e não 25, correto”? “Errado — ela continuou — pois quando ocorreu a cerimônia já vivia com meu marido há cinco anos, com tudo indo muito mal. Foi quando tive o sonho que deveria casar na Capela da Santa Casa para minha vida virar um conto de fadas. E virou”. Daí me convidou para a comemoração, em Camberra. Acho que vou... PS – Estou sabendo que o provedor da Irmandade de Misericórdia de Campinas, médico Murilo Antonio Moraes de Almeida, está elaborando projeto para apresentar ao Ministério da Cultura pedindo apoio para, através da Lei Rouanet, fazer o restauro da Capela e do prédio da Santa Casa, ambos tombados pelo Condepac. Nossa cidade merece.